20 de março de 2020 8:04 por Marcos Berillo
Dois políticos que têm alguns pontos em comum em suas trajetórias de vida: são filhos de políticos profissionais ‒ o profissional nesse caso não tem o sentido pejorativo ‒, são brancos, estudaram em colégios caros em Brasília, os pais, antes de vê-los trabalhando nas profissões para as quais se formaram, os deslocaram para a atividade política.
Rui Palmeira (44 anos) é advogado, e Renan Filho (41 anos), economista e advogado; um é prefeito de Maceió e outro é governador de Alagoas. Esses são alguns pontos em comum.
Palmeira é o único herdeiro da tradição de uma família com marcante presença na política alagoana, desde meados do século XIX, com origem no mundo rural: os antepassados eram senhores de engenho. Esses dois legados, o rural e o político, são simbólicos em sua formação como filho e neto de senadores da República, entre outros cargos.
Renan Filho, cujo pai é o senador Renan Calheiros, tem sua origem na classe média rural. Este, desde muito jovem iniciou o curso de direito na UFAL, perfilou na luta contra a ditadura militar, foi candidato a deputado estadual e se elegeu tendo o movimento estudantil como uma de suas bases eleitoral, além do aprendizado na militância no Partido Comunista do Brasil (PCdoB). Sua longeva carreira político-parlamentar é do conhecimento de todos.
Os dois são de origem e classes sociais distintas. Mas, dada a possibilidade de serem atropelados por políticos com perfil semelhante e jovens, rapidamente recompuseram as suas relações políticas. Com um pragmatismo político invejável para os profissionais do meio, lançarão um candidato de comum acordo e conveniência. Estiveram em campos opostos nas últimas eleições, mas isso é fato superado. O que os afastou não foram divergências ideológicas, pois essas não existem; os dois pensam semelhantemente, sempre visando à sobrevivência eleitoral.
Os pais, na minha compreensão, são melhores políticos, e arrisco dizer: mais “modernos” do que os filhos. Mas como essa é outra questão, fica para depois.
Renan Filho, antes, havia encontrado um cavalo de Troia: foi buscar no Ministério Público Estadual (MPE) o procurador-geral Alfredo Gaspar de Mendonça para ser o seu secretario de Segurança Pública. Aplicou um xeque-mate no MPE ou, se fosse uma luta de boxe, teria vencido no primeiro round, por nocaute. O MPE passou a ser uma extensão do governo.
Rui Palmeira, ao seu modo e jeito, vem administrando Maceió sem programa, repetindo sem inovar em nada o modelo tradicional, aliado do então senador Benedito de Lira e ao deputado Arthur Lira, que conseguiram recursos federais para algumas obras na cidade. Não realizou sequer uma obra estruturante, como havia prometido durante as campanhas. Os indicadores sociais de Maceió continuam entre os piores do Brasil.
A união para manter-se no poder é a grande obra. Os Calheiros não conseguiram, ou melhor, não procuraram formar lideranças em seu círculo de relações mais íntimas e familiar. A opção mais barata e viável foi se unir para derrotar Fernando Collor, JHC e Rodrigo Cunha, os dois últimos, políticos com carreira em formação e com possibilidade de ascender.
Ronaldo Lessa é para ambos um nome que não se mostra de confiança, pelo fato de ser independente e saber o caminho do poder. Já foi prefeito de Maceió e governador duas vezes.
Os profissionais da política, os que têm o cálculo eleitoral como atividade central, afirmam que a eleição municipal é 50% para se vencer as eleições de 2022.
Derrotar Ronaldo Lessa e JHC agora é fundamental para o projeto de Rui Palmeira e Renan Filho. Eleger Alfredo Gaspar é uma possibilidade para tratorar Rodrigo Cunha e Fernando Collor em 2022.
É um projeto de poder, não é um projeto de governo no qual não cabem os movimentos sociais, nem mesmo os pequenos e médios empresários e agricultores, que são dezenas de milhares em Alagoas e não serão contemplados com políticas públicas.
A leitura feita por ambos visa atrair parcela do eleitorado conservador e de direita que votou em Bolsonaro em Maceió e tem simpatia por Alfredo Gaspar. Este tem única e exclusivamente um discurso beligerante e de corte neofascista, que teve como experimento prático a rápida passagem pela SSP. Deverá ser, insisto, o cavalo de Troia de Rui e Renan.
Aqui cabe uma explicação: o cavalo de Troia foi um grande cavalo de madeira construído pelos gregos durante a Guerra de Troia, entre 1.300 a 1.200 a.C., como um estratagema decisivo para a conquista da cidade fortificada de Troia. Tido pelos troianos como símbolo de sua vitória, no final da guerra o cavalo é levado para dentro das muralhas, sem que ninguém soubesse que em seu interior se ocultava o inimigo.
Essa estratégia montada interessa a Alfredo Gaspar, que trabalhou incessantemente no MPE como um pirotécnico e que aparelhou a instituição com o mesmo modus operandi dos lava-jatistas de Curitiba, a quem continua vinculado. O estilo cinematográfico nas operações do MPE, de quando era secretário de Segurança Pública, passou a ser a sua marca.
Rui Palmeira e Renan Filho nesse ponto conhecem a alma da elite e da burocracia estatal de onde se origina Alfredo Gaspar. Em Alagoas todos se conhecem, e quem não foi capturado pelo poder, se tiver o que oferecer e a alma pequena, será fatalmente capturado.
Os três, Renan Filho, Rui Palmeira e Alfredo Gaspar, têm objetivos em comum: o poder como carreia profissional e sem compromissos sociais, mas com vínculos inseparáveis com as elites.
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