3 de abril de 2020 5:17 por Marcos Berillo
Edberto Ticianeli*
Faleceu na madrugada desta sexta-feira (3 de abril de 2020), no município sertanejo de Pariconha, Josué Correia de Souza, um dos históricos militantes da resistência política contra a Ditadura Civil-Militar em Alagoas.
Filho de João Correia Sobrinho e Maria São Pedro Correia, nasceu no dia 28 de dezembro de 1942. Teve sete irmãos: José, Jaime, Geraldo, Geusa, Judite, João e Gilberto Correia.
Iniciou sua participação política na luta sindical, quando ele e seus irmãos tiveram contato com os militantes da Ação Popular, uma organização política oriunda da Ação Católica, braço de atuação social e política da igreja católica.
Antes de se vincular à AP, Josué foi coroinha e “rezava a missa em latim”, como lembrou mais tarde. Participou ainda da Congregação Mariana.
Presidiu, a partir de 1967, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Água Branca, criado por iniciativa de Ação Católica.
Nesta época, Pariconha ainda era um distrito de Água Branca e a principal liderança política da Ação Católica na região era José Novaes, que depois se vinculou ao Partido Comunista do Brasil.
O episódio que colocou Água Branca no mapa da repressão política ocorreu durante a campanha eleitoral para eleições municipais de 15 de novembro de 1968.
O governador Lamenha Filho discursava em Pariconha, quando foi interrompido por um camponês da plateia que o chamou de mentiroso. Lamenha tentou responder mais foi vaiado.
Outra pessoa passou então a denunciar a situação de miséria em que viviam os moradores daquela região. Tentaram prendê-lo. Era Juarez Johandues Etcheverria, contador do sindicato (na verdade era Gilberto Franco Teixeira, dirigente de AP).
Os camponeses impediram a ação da polícia, que a partir desse dia passou a vigiar os movimentos do grupo.
Com a adoção do Ato Institucional nº 5, em 13 de dezembro de 1968, a polícia passou a ter poderes ilimitados e como o episódio de Pariconha ainda estava sob investigação, o delegado mandou prender todos os envolvidos na manifestação contra o governador.
Entre os vários detidos, José Novaes, José Correia e Josué Correia foram transferidos para a DOPSE em Maceió. Depois também chegaram Aldo Arantes, Gilberto Franco, mas sem serem identificados por estes nomes. Aldo utilizava o falso nome de Roberto Ferreira.
Foram barbaramente torturados e ficaram detidos por meses sob a acusação de promoverem atos subversivos em Pariconha.
Aldo Arantes e Gilberto Franco fugiram da Delegacia de Ordem Política, Social e Econômica (DOPSE), na Rua Cincinato Pinto, uma noite de domingo, após um jogo de futebol entre CSA e CRB.
Histórico de luta
Josué Correia, após a sua prisão, se afastou de Água Branca. Meses depois retornou, mas foi novamente preso. O mesmo aconteceu quando tentou trabalhar na CHESF em Paulo Afonso. Detido em junho de 1970, ficou por 70 dias no Quartel do Exército daquele município.
Mudou-se para Petrolina, em Pernambuco, e clandestinamente foi trabalhar na Agro. Lá soube da prisão dos seus companheiros e fugiu para São Paulo.
Passou a trabalhar em São Roque, onde, em 1972, voltou a ser detido para interrogatório por cinco horas no Quartel do Exército, na Av. do Estado, no Cambuci. Neste período, não se integrou à organização por saber que estava sendo vigiado.
Resolveu então sair do país e com documentos falsos, chegou ao Paraguai, passando pelo Paraná e Mato Grosso, e por lá permaneceu por sete anos.
Somente voltou ao Brasil após a Anistia, em 1979. Foi trabalhar na Light em São Paulo. Chegou ser o secretário da Associação dos Nordestinos naquela capital.
Sua liderança junto aos trabalhadores da Light era tão expressiva que encabeçou uma chapa para disputar o poderoso Sindicato dos Eletricitários de São Paulo, dirigido então por Rogério Magri, que foi ministro de Collor. Perdeu, mas conseguiu expressivos 4.228 votos.
Anos depois, retornou a Pariconha onde abriu um pequeno negócio.
Sobre o as torturas sofridas em dezembro de 1968, Josué dizia que aquilo marcou muito a sua vida.
Em depoimento à Comissão da Verdade, revelou que o momento mais difícil foi quando levaram ele e o Zé Novaes para dentro de um canavial. Avaliou que seria morto e jogado em algum rio.
“Quando nós estávamos sendo torturados dentro do canavial, ouvimos um carro que saiu fritando pneu, e eles ficaram com receio e nos devolveram imediatamente para a cadeia”, lembrou.
Testemunhou ainda que Gilberto Teixeira foi até queimado: “a tortura era de faca, furando a gente, queimando, furando unha, essas coisas assim”.
Em 1970, casou-se “clandestinamente” com Madalena Vieira, irmã de Moacir Vieira, que foi prefeito do Pariconha. A família dela não via com bons olhos a sua relação com um revolucionário. Tiveram dois filhos: Márcia, que é enfermeira, e Diogo, engenheiro.
Divorciado de Madalena, Josué voltou a casar, já em São Paulo, com uma companheira de militância política, Neide Garcia. Tiveram um único filho, João Francisco.
Sua última companheira foi Ana Lúcia dos Santos, a Aninha para os mais próximos. Com ela teve Joana e Pedro Vitor.
Josué Correia, quando faleceu, era o presidente do diretório municipal do Partido Comunista do Brasil em Pariconha.
*Originalmente publicado no portal História de Alagoas.