23 de junho de 2021 11:37 por Adelmo Marques Luz
Recebi, consternado, a triste notícia do falecimento do meu amigo Joseval Pereira Fragoso, o Vavá, que há tempos vinha se debatendo com uma devastadora enfermidade. Causou-me, a trágica ocorrência, um sentimento de profundo pesar. A morte, essa indesejada das gentes, arrebatou, sem a menor satisfação nem ressentimento, um amigo de infância, cortês, possuidor de um excelente estado de humor e de uma forma de expressar-se povoada de ditos espirituosos que nos divertiam bastante. Lembro-me dele, ainda no limiar da adolescência, em casa do Tião e do Lelo, representando num palco improvisado cenas burlescas de teatro amador para uma plateia atenciosa, sentada em tamboretes enfileirados, seus amigos e espectadores da mesma faixa etária.
Em campo, na prática do futebol, foi um indiscutível craque. Quem de nós não foi vítima das suas peripécias futebolísticas? Apareça um que não tenha sido batido por seus dribles imprevisíveis e desconcertantes… Sobretudo aqueles que se atreviam a marcá-lo. Tarefa impossível sobrepor-se ao talento nato e de improviso. Grande Vavá!
Sua natureza humana era admirável. Lamento que tenha nos deixado tão cedo. Mas seria mesquinho e egoísta de minha parte desejá-lo semivivo e em condições cruéis de permanência, num imerecido desassossego, vegetando, sem consciência de si mesmo nem do ambiente circundante. Doeu-me vê-lo partir sem nos despedirmos, mas pretender postergar sua existência insalubre, irregular, sob o estímulo de aparelhos invasivos e de medicamentos de efeitos duvidosos, seria o mesmo que submetê-lo ao padecimento físico duradouro e às aflições psicológicas intermináveis. Bastaram as expiações que o destino lhe reservou, dentre elas, a fratura irreparável no tornozelo que o obrigou abandonar involuntária e precocemente o esporte que tanto amava.
Servidor público dedicado, vinculado a uma área sensível, à qual se dedicou zelosamente, durante décadas, até se aposentar, aos menores infratores. Refiro-me à antiga Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor/ FEBEM, onde deu sua valiosa contribuição social.
Saiba, amigo, que o amo naturalmente. E fiel a esse sentimento, sou levado a sobrepujar meu egoísmo idiota, desprezar meus interesses mesquinhos de querer vê-lo vivo em condições tão desfavoráveis. Vá em paz. Nada me deves. Eu é que estou em débito com você. E o pior é que tal obrigação não possui natureza pecuniária, mas moral, afetiva, que são bens considerados intransmissíveis e impagáveis. Perdoe-me, Vavá, por não lhe ter dado o que deveria, nem lhe ter feito o que merecias enquanto estavas vivo. Como sanção às minhas faltas condenáveis, serei eternamente o fiador de minha própria inadimplência. Carregarei, resignado, o peso de minha culpa tardia e o mal-estar que me fustiga a consciência devido às minhas ausências e omissões. Perdoar-me-ás? Talvez. Mas tenho certeza de que me recepcionarás quando ocorrer o meu inevitável transpassepara a dimensão em que você agora se encontra. Teremos, então, juntamente com outros amigos comuns que já se encontram por aí, a eternidade à nossa disposição. Esbanjá-la-emos sem critérios nem emergências. Confesso que “serei feliz e sábio terei sido se a morte, quando me arrebatar, não me puder tirar senão a vida”. Dou-lhe um abraço transitório de despedida, mas demasiadamente extenso, até onde as águas e o céu se irmanam, afetuosamente, no infinito. Até à vista, Vavá!