sexta-feira 22 de novembro de 2024

Memória Afetiva

enquanto a vice-prefeita, à época, dava entrevistas em defesa da casa, que estava prestes a ser demolida, a Prefeitura de Maceió expedia o alvará de demolição.

10 de dezembro de 2021 10:05 por Mácleim Carneiro

 

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Quem já andou em estradas vicinais, margeadas por canaviais, sabe que o sentido de localização é extremamente dificultado quando, ao voltarmos logo após a colheita, a paisagem se mostra completamente mudada pelo corte da cana. Para quem vivência este tipo de experiência, ocorre apenas um estranhamento e não a sensação de perda do que seria uma memória afetiva.

Saiamos dos canaviais e cheguemos à “modernidade” urbana do nosso aquário, afinal, preciso ater-me aos fatos ocorridos lá pelos idos de 2006. Lembro-me, que a mídia local noticiou (com direito a entrevistas de autoridades frágeis em argumentos e ações) a demolição audaciosa de um belo exemplar arquitetônico da cidade de Maceió, a Casa Rosada, localizada na Praia de Pajuçara. Com ela, ruiu também parte da nossa memória afetiva!

Casta Poderosa

Infelizmente, por um contexto civilizatório-cultural, pouquíssimos habitantes do nosso aquário foram capazes de atinar para a gravidade do fato. Mesmo assim, foi essa minoria que se rebelou contra a demolição. A imensa maioria dos aquarianos não era (e continua a não ser) dotada de cidadania e percepção suficientes, para o entendimento do que seja memória afetiva, sobretudo, no contexto urbano. Assim, a força que teriam ao protestar contra a demolição, permaneceu anestesiada pela ignorância. Existia e ainda existe uma terceira vertente, que habita o nosso aquário: a casta poderosa e escrota, onde o que lhes sobra em avareza lhes falta em escrúpulos. São exatamente essas pessoas, detentoras do poder político e econômico, que subjugam os demais setores da sociedade, pela imposição da “força da grana que destrói coisas belas.”

Em 2001, o Conselho de Cultura deu um parecer respondendo ao pedido de tombamento da Casa Rosada, feito pela UFAL (Universidade Federal de Alagoas), reconhecendo que a casa era um exemplar de valor arquitetônico e cultural, mas que a responsabilidade sobre tal questão cabia ao município. O município, por sua vez, reconheceu que a casa se enquadrava na lei municipal Nº 4545, (lei municipal de proteção às edificações de importância histórico-arquitetônico-cultural), porém, por obra e graça desses mistérios que acontecem na calada da noite, enquanto a vice-prefeita, à época, dava entrevistas em defesa da casa, que estava prestes a ser demolida, a Prefeitura de Maceió expedia o alvará de demolição. O resultado deste imbróglio deu no que deu.

Capitalismo Babaca

A pergunta é: quem amarelou na Casa Rosada? Uma boa dica seria observar quais as autoridades envolvidas naquela negociata (que poderiam impedir a demolição e fizeram exatamente o contrário), certamente por uma daquelas felizes coincidências do destino, foram os privilegiados proprietários dos melhores apartamentos do empreendimento imobiliário “ítalo-alagoano”. Embora eu reconheça que essa possibilidade é de uma obviedade pueril, pois esse tipo de gente não costuma ser tão óbvia em suas transações, por uma questão de assepsia. Aliás, guardadas as devidas proporções, o que diria o tal empresário italiano (que, segundo soube-se, à época, não entendia o porquê de tanta reclamação) se alguém, caído de pára-quedas, chegasse a Roma com grana no bolso para comprar até consciências e, com a sensibilidade característica do capitalismo babaca, resolvesse demolir um pedacinho do Coliseu?

Na verdade, babaca mesmo sou eu, que estou aqui perdendo tempo na tentativa inútil de recordar um fato depois da porta arrombada. Ou melhor, literalmente, demolida! Ainda mais quando sei que, no estágio atual da humanidade, a construção da vida está muito mais no poder dos fatos do que das convicções.

No +, MÚSICABOAEMSUAVIDA!!!

 

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