8 de março de 2023 1:31 por Da Redação
Técnicos e ex-moradores dos cinco bairros de Maceió atingidos pela mineração da Braskem chamam de “faz de conta“ a Escuta Pública iniciada nessa terça-feira (7) pela mineradora, no ginásio do Cepa. A empresa de consultoria Diagonal, contratada pela Braskem, apresentou o Diagnóstico de desocupação dos bairros do Mutange, parte de Bebedouro, Pinheiro, Bom Parto e Farol.
De acordo com a empresa, a elaboração do Diagnóstico servirá como base técnica e fará parte do Plano de Ações Sociourbanísticas, como consta no Termo de Acordo Socioambiental assinado em dezembro de 2020 entre a Braskem e o Ministério Público Federal (MPF), com a participação do Ministério Público do Estado de Alagoas (MPE).
A arquiteta e urbanista Isadora Padilha contesta o teor do documento encomendado à Diagonal. “É irônico que chamem o processo de ontem (7) de ‘escuta pública’, porque não é! Não há escuta alguma ali. O relatório apresentado pela Diagonal ano passado e invalidado publicamente pela sociedade e pela prefeitura foi reapresentado praticamente sem melhorar nada”, disse a arquiteta.
Ouvida pelo 082 Notícias, Isadora destaca algumas distorções que considera “gritantes”:
– Denominar o que ocorre em Maceió de “evento”. “É uma brutal perfumaria, malabarismo linguístico, para tentar aliviar a calamidade que assola o território”;
– o documento tem base extremamente frágil e escrita desconexa em muitos pontos e, o que é mais importante, métodos absolutamente questionáveis que simplesmente invalidam os dados obtidos, se eles não conseguirem (e não conseguiram ontem) explicitar e justificar o método.
Segundo Padilha, o encaminhamento do diagnóstico é de eximir a Braskem. “O documento tem ainda uma clara tentativa de transferir a responsabilidade pela implantação das medidas mitigatórias/compensatórias da empresa para a prefeitura, inclusive, tentando justificar em vários momentos que os lugares já eram problemáticos antes do ‘evento’ do afundamento”.
Ele chama a atenção para o fato de, na apresentação, todo o tempo a linguagem vai no sentido de “apoiar o fazer da prefeitura”.
Isadora, que é ex-presidente do Instituto dos Arquitetos do Brasil em Alagoas, aponta outras falhas no documento, como a falta de explicação sobre a metodologia utilizada para sua elaboração.
“Em nenhum lugar do documento é explicado como eles selecionaram a amostra de população que compõe o que eles chamam de grupos focais. E todos os dados são obtidos desses grupos. Se a amostra estiver comprometida, o material inteiro está comprometido, pode ter desvio de informações, direcionamento, esses dados podem não serem representativos da realidade que se quer investigar e portanto não haveria validade, legitimidade, no quadro das informações obtidas”, explica.
Continua, Isadora: “Além disso a quantificação é problemática: o número é ínfimo dentro do universo da população atingida e isso também coloca em xeque a representatividade dessa amostra”.
‘Esse Diagnóstico é um insulto à nossa inteligência e à nossa dignidade’
A bióloga e professora Neirevane Nunes, uma das vítimas da Braskem e moradora de Bebedouro, ficou indignada com o encaminhamento da Diagonal e dos órgãos públicos. “Nós saímos indignados com o que foi apresentado o Diagnóstico não tem rigor científico, com sérios problemas na metodologia e usam termos de forma indevida com o intuito de ‘maquiar’ a gravidade da situação”, destaca.
Segundo ela,em nenhum lugar do documento a Braskem é colocada como responsável pela maior tragédia socioambiental do mundo em área urbana. “O município de Maceió é citado várias vezes apontando suas deficiências inferindo uma culpa ao município de não conseguir atender às novas demandas que foram geradas devido ao crime da Braskem. Também não fica claro quem irá custear as ações que são propostas no Diagnóstico. Será que a Braskem, a infratora, está tirando o corpo fora e jogando essa responsabilidade também para o Município? Essa é uma das várias perguntas que a banca da Diagonal não respondeu”.
“Esse Diagnóstico é um insulto à nossa inteligência e à nossa dignidade como pessoas afetadas pela mineradora”, finalizou a bióloga.
Calendário de Escuta Pública
07 de março às 17h30 – Eixo 1 – Políticas sociais e redução de vulnerabilidades
14 de março às 17h30 – Eixo 2 – Atividade econômica, trabalho e renda
21 de março às 17h30 – Eixo 3 – Qualificação urbana e ambiental
28 de março às 17h30 – Eixo 4 – Preservação da cultura e memória.
Para os eventos presenciais, é necessário realizar cadastro no site (www.maisdialogos.com) ou no telefone: (82) 99950-5639.
2 Comentários
Uma verdadeira palahaçada. Cerca de 7 mil imoveis continuam dentro do Pinheiro, convivendo com os escombros do resto do bairro e com fissuras e rachaduras tão fortes quanto as das residências que foram retiradas. Os equipamentos instalados pela Braskem para monitorar as areas que entram no mapa “não identificam” nenhuma movimentação em cerca de 35% do bairro do Pinheiro. As rachaduras são uma obra do além ou todas essas residências estão rachando por coincidência. O pior de tudo é ver as instituições públicas que deveriam questionar a Defesa Civil sobre a motivação dessas rachaduras nos imoveis fora do mapa, recebe uma resposta da mesma, baseada em equipamentos da própria Braskem, ou seja, o agressor quem fornece subsidios para o Estado definir se a vítima é vítima mesmo. Inacreditável. Ainda sim, como essas mesmas Instituições não colocam no termo de acordo a obrigação que alguém assine se responsabilizando pela afirmação que essas rachaduras são meras coincidências e que por isso não estão dentro do mapa. Alguém precisa se responsabilizar, pois as rachaduras não pararam de avançar e no futuro alguém precisa ser responsabilizado. Decepcionante tudo isso.
Onde se lê 7 mil imoveis, leia-se pessoas.