sábado 27 de abril de 2024

Juros, a pedra no caminho

Caso o Banco Central não ajuste adequadamente a política monetária, o país corre o risco de ficar preso em um ciclo estagnante, como observado nas últimas décadas, caracterizado pelos chamados "voos de galinha"
Freepik/Reprodução

 

O ano de 2023 para a economia brasileira reiterou a notória dificuldade do mercado em acertar suas previsões. A seguir, destacaremos os ajustes feitos nas expectativas do mercado em 2023, mais uma vez evidenciando que, em matéria de previsões econômicas, o erro é a regra e o acerto a exceção (ver artigo “Previsões do Mercado” publicado há alguns meses aqui neste Blog).

Inicialmente, o PIB brasileiro estava projetado para crescer apenas 0,79%, porém, ao longo do ano, essa projeção foi ajustada para 2,92%. Esse crescimento notável veio principalmente dos setores agropecuário (que teve um ajuste positivo de 6% para 15,8%) e setores de indústria e serviços (cujas expectativas também foram revisadas para cima, passando de 0,25% para 1,26% e de 0,8% para 2,4%, respectivamente). No entanto, essa expansão ressalta a fragilidade do crescimento industrial e a necessidade de diversificação econômica para sustentar o crescimento a longo prazo.

No que se refere à demanda, ocorreram ajustes significativos nas expectativas, com o crescimento dos gastos privados aumentando de 0,85% para 3,2% e os gastos públicos subindo de 1,1% para 1,5%. Isso destaca a importância desses componentes na recuperação econômica. Esse cenário foi impulsionado pelos gastos autônomos do governo, especialmente em programas sociais, e pelo reajuste do salário mínimo em termos reais, o que contribuiu para o aumento do consumo das famílias. Além disso, um superávit comercial recorde de US$ 98,8 bilhões fortaleceu a demanda da economia, reduziu o risco país e melhorou a avaliação pelas agências de rating, ao mesmo tempo em que a taxa de desemprego diminuiu de 8,7% para 7,5%, refletindo melhorias no mercado de trabalho.

No curto prazo, as expectativas iniciais do mercado para 2023 divergiram consideravelmente dos resultados observados, refletindo o impacto positivo da política macroeconômica na estabilização econômica. Notadamente, a expectativa para o IPCA em 02/01/2023 era de 5,62%, mas foi revisada para baixo, atingindo 4,45% em 31/12/2023. Essa significativa redução nas expectativas de inflação, por si só, já teria justificado um ajuste mais agressivo na política de juros, minimizando seus efeitos negativos em termos de investimentos produtivos e do ponto de vista fiscal, com pagamento de juros da ordem de R$ 713,0 bilhões, ou 6,6% do PIB.

Olhando para o médio e longo prazo, os avanços na reforma tributária e no novo arcabouço fiscal são promissores para a estabilidade macroeconômica. Essas reformas visam aprimorar a eficiência do sistema tributário e a gestão dos gastos públicos, fundamentais para sustentar o crescimento econômico e aumentar a confiança dos investidores, contribuindo para um ambiente econômico estável e propício ao crescimento sustentável.

Neste contexto, a persistência de juros reais elevados atua como um obstáculo pronunciado para um crescimento econômico mais sustentado e robusto no Brasil. O esforço de estabilização e reforma econômica corre o risco de ser minado pela política monetária restritiva do Banco Central do Brasil (BCB), limitando o potencial de crescimento econômico e prejudicando a rentabilidade dos investimentos produtivos. As projeções de mercado para o investimento foram negativamente revisadas, passando de um aumento modesto de 1,25% para uma queda de -2,5% em 2023, refletindo o impacto adverso desse ajuste gradual na redução dos juros.

Ademais, com base nas estimativas de mercado, a taxa de juros real estrutural deve situar-se no intervalo de 4,5% a 5%, o que representa um patamar desafiador quando comparado à taxa de crescimento esperada de 2,5% a 3%, no cenário mais otimista para os próximos anos. Considerando a mediana das expectativas de inflação para os próximos doze meses, que se situa em torno de 3,8%, a taxa SELIC nominal poderia ser estabelecida em 8,5% sem desencadear pressões inflacionárias. No entanto, a taxa de 11,75%, além de ser altamente restritiva para os investimentos, tem um impacto prejudicial no cumprimento das metas fiscais. Cada 1% da taxa de equilíbrio SELIC resulta em R$ 45,0 bilhões nos pagamentos de juros, comprometendo o crescimento do PIB, da arrecadação e a redução da relação dívida/PIB ao longo do tempo.

Em síntese, é essencial a sincronização das políticas macroeconômicas para criar as condições estruturais e de estabilidade necessárias ao crescimento sustentável. Caso o Banco Central não ajuste adequadamente a política monetária, o país corre o risco de ficar preso em um ciclo estagnante, como observado nas últimas décadas, caracterizado pelos chamados “voos de galinha.” Portanto, é crucial estar ciente de que, no caminho, tem uma pedra, como poeticamente lembrada por Carlos Drummond de Andrade, e ignorá-la comprometerá nossa caminhada em busca do desenvolvimento.

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