Por Osvaldo Epifânio (Pife)*
Hoje, se você colocar no iutubi “Rás Gonguila” certamente vai encontrar informações impressionantes sobre o passista negro. Isso porque a escola de samba Beija-Flor escreveu um samba em homenagem ao rapaz “nascido no centro da cidade”, segundo o historiador Edberto Ticianeli.
Os algoritmos da vez fazem a festa! Uma cínica aleivosia.
Até então, o engraxate tinha aparecido num frevo do radialista Reinaldo Cavalcante na década de 80, “Saudades que a gente sente”. O locutor esportivo e compositor foi o único a lembrar do icônico negro campeão dos festivais de passo de carnaval de Maceió (Recife ainda não tinha iniciado essas competições na época) dos anos 50 do século passado.
Pois bem.
O prefeito da cidade sorriso fez um milagre. Transformou o Benedito dos Santos, que a beija intimamente o chama de Rás, no homem de 8 milhões de reais, não de dólares, como Steve Austin (Esse foi o valor pago pelo erário publico maceioense à escola fundada pelo bicheiro e contraventor Anísio Abraão.
O respeitável pesquisador Ticianeli não conseguiu descobrir qualquer ligação do engraxate com a mitologia régia africana em sua ancestralidade africana, como reza, quer, impõe e celebra a escola de Nilópolis. Nem mesmo a pesquisadora Regina Glória Nunes, uma das mais importantes estudiosas da africanidade, alcançou tamanha façanha em identificar o Benedito como “Herdeiro da dinastia e das lutas de Zumbi”, segundo a letra, de nem sei quem.
Não é que a história foi colocada como “merda no quintal”!
O Gonguila, como percebemos em Ticianeli, foi um negro simples que gostava do frevo, e que, na quarta-feira de cinzas, voltava ao seu ofício.
Incrivelmente, o prefeito inepto fez uma revisão histórica sem consultar um dos maiores historiadores alagoanos da atualidade, o Geraldo de Majella.
Como o gestor de Maceió é um radical amante do mundo paralelo milionário e maravilhoso, ele se cercou de artistas, compositores, decoradores, políticos, empresários e de homens da justiça para recriar o perfil do Rás (para os íntimos), e detonou: “Gonguila é nosso herói”. A saber: o boçal prefeito da capital é de uma cidade do interior de Alagoas e não tem nenhuma identidade histórica e cultural com Maceió e, pior, não conhece o outro icônico passista “Moleque Namorador” e nem a sagrada “Miss Paripueira”. Mas isso não é problema, claro. Muitos alagoanos foram memoráveis em Maceió, mesmo nascidos em léguas distantes da cidade, como o Velho Graça. Bom, memorável não é o que atribuímos ao atual prefeito.
A totalidade do povo da cidade de Maceió não conhece o Benedito, o Rás, como lembra de Henrique Hequelman, Dilton Simões, Kátia Born, Pedro Vieira e Djalma Falcão. O Gonguila não tem estátua, não é nome de rua, de praça, de beco, de ladeira de favela, de sala de cultura, de retrato na câmara dos vereadores, não é estudado nas escolas do município, não existem livros sobre ele (Quem o salva é o Edberto), não há músicas, imagens, retratos, historiografia, nada, absolutamente nada sobre o Rás deles.
O Benedito nunca foi reverenciado numa portaria municipal como o “Real Cavaleiro dos Montes”, na letra de nem sei de quem da beija-flor. E, de repente, de forma apoteótica, sem trocadilhos, a escola do rapaz prefeito grita, sem vergonha nenhuma: “Aqui é beija-flor, doa a quem doer”
Segundo Ticianeli (apud): “Rás Gonguila silenciou seu clarim para sempre em 1967, fulminado por um ataque cardíaco na Rua do Comércio, Centro de Maceió”.
E desde então, nunca mais foi visto, nem pelos cantos da cidade.
*É professor do Ifal