Por João Filho, do The Intercept Brasil
O PL não é apenas o maior e mais forte partido dentro do Congresso. É também o partido oficial da conspiração golpista que tomou conta do país nos últimos anos.
Além de abrigar Jair Bolsonaro, líder máximo do golpismo, e sua tropa de choque, a legenda, liderada pelo seu presidente, foi colocada na linha de frente dos ataques às urnas eletrônicas — as mesmas que lhe garantiram a maior bancada parlamentar. Segundo a Polícia Federal, Valdemar Costa Neto usou a estrutura do PL para planejar um golpe de estado e financiar uma auditoria fake para descredibilizar as urnas eletrônicas. Isso significa que o partido usou grana do fundo partidário — leia-se verbas públicas — para financiar o golpismo no Brasil.
Golpistas do PL foram presos ou estão desfilando por aí com tornozeleiras eletrônicas. A legenda do golpe está encalacrada, com vários outros integrantes fazendo fila para ir para a cadeia, mas continua muito forte politicamente. Nesta semana, o partido conseguiu o comando de duas importantes comissões na Câmara: Caroline de Toni, do PL de Santa Catarina, na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, além de Nikolas Ferreira, do PL de Minas Gerais, na Comissão de Educação. São nomes que não estiveram envolvidos diretamente na organização da tentativa de golpe, mas foram grandes entusiastas do golpismo. A escolha de duas figuras histriônicas e completamente despreparadas para esses cargos mostram que o PL continua desprezando a democracia.
Apesar de ser o mais forte no jogo de correlação de forças do parlamento, o partido encontra-se numa sinuca de bico jurídica. Inevitavelmente mais correligionários serão presos e a sigla corre risco de ter o registro partidário cassado. Sem ter nada de concreto para apresentar ao país além da gritaria moralista dos extremistas, o PL usará a narrativa da perseguição como o grande trunfo nas próximas eleições. Manter-se forte eleitoralmente e se apegar à popularidade do bolsonarismo é o que sobrou para o partido que está sendo arrastado pela Polícia Federal e pela justiça brasileira. E isso não é pouca coisa.
Façamos aqui um breve resumo da trajetória do PL. Fundado em 1985, durante a redemocratização, o partido serviu de abrigo para os políticos que sustentaram o regime militar. Demonstrou-se uma legenda pragmática e com ânsia pelo governismo, tendo integrado a base de governo de todos os últimos presidentes da República. Com a ascensão do bolsonarismo, o PL deixou de ser um nanico sanguessuga para se tornar o partido que dá as cartas no Congresso. Incentivado por Bolsonaro, o PL encampou uma aventura golpista e, agora, encurralado pela polícia e pela justiça, vê suas lideranças sendo punidas e transforma isso em trunfo eleitoral. Esse é o histórico de um partido que se diz vítima de uma perseguição do “sistema”.
Encantado pela força demonstrada pelo bolsonarismo na avenida Paulista no domingo retrasado, o PL apostará todas as suas fichas em novas manifestações que serão mobilizadas por Bolsonaro. A narrativa fantasiosa de que existe uma perseguição contra Bolsonaro e sua turma já demonstrou ser capaz de engajar muita gente. Rio de Janeiro e Belo Horizonte provavelmente serão as próximas escolhidas como palco para a micareta golpista travestida de ato pela anistia. O objetivo, ainda que não declarado, é óbvio: intimidar o STF mostrando que segue com apoio de parte significativa da população, mobilizar a militância bolsonarista para o ano eleitoral e impulsionar seus candidatos. Assim, caso o partido não seja punido com a cassação, ele se manterá forte no jogo político-eleitoral e soberano no Congresso.
O caráter eleitoral dessas manifestações será velado para não configurar campanha antecipada. É bom que o TSE fique atento, pois o PL de Valdemar já demonstrou não ter qualquer pudor em desrespeitar leis. É evidente que os atos servirão de palanque para os candidatos apoiados pelo partido, como ficou claro na Avenida Paulista. Nada mais nada menos que 20 pré-candidatos a prefeituras e atuais prefeitos estiveram presentes na manifestação.
O ato no Rio de Janeiro, por exemplo, servirá para alavancar a candidatura do deputado e ex-chefe da Abin, o Delegado Ramagem para a prefeitura carioca. O fato dele ser alvo de investigação da PF por espionagem ilegal na Abin não é um problema. Muito pelo contrário, para o PL isso não só não atrapalha como será o seu principal apelo eleitoral. O candidato se venderá como um dos heróis perseguidos pelo “sistema”. A vitimização será a principal plataforma eleitoral do PL. E, como se vê pelas ruas e pelas pesquisas, há grandes chances de dar certo. Cerca de 40% dos brasileiros acreditam que Bolsonaro está sendo perseguido. Ele, Valdemar e seus comparsas de golpe seguirão agarrados nesse delírio coletivo para se manterem vivos.
É deprimente a constatação elementar de que uma possível prisão de Bolsonaro antes das eleições impulsionará ainda mais os candidatos do PL. Na cadeia, ele virará mártir e se tornará um cabo eleitoral ainda mais forte. Não é exagerado supor que há candidatos do PL torcendo para que a prisão ocorra antes da eleição. Nós sabemos como funcionam as mentes golpistas.