quinta-feira 21 de novembro de 2024

Alguns apontamentos sobre os resultados eleitorais na Europa

Os efeitos da invasão da Rússia à Ucrânia e da invasão de Israel à Palestina são sentidos na economia do país.

10 de julho de 2024 3:47 por Redação

Jean-Luc Mélenchon. Foto: by Sylvain THOMAS / AFP.

Magno Francisco é filósofo e historiador.

Após o avanço eleitoral dos partidos fascistas e de direita na eleição do Parlamento Europeu, obtendo expressivas votações em países como Alemanha, França, Espanha e Portugal, o debate político deslocou-se para as eleições dos parlamentos nacionais dos países da Europa.

Na Inglaterra, houve uma vitória eleitoral da centro-esquerda. O Partido Trabalhista conquistou ampla maioria e obteve o número de cadeiras necessárias para compor o governo sem depender de coalizões, alcançando 412 dos 650 assentos. O Partido Conservador perdeu 224 deputados, passando de 344 para apenas 120, e o partido de extrema-direita ficou com apenas 4 representantes.

Porém, o centro das atenções está mesmo na França. O resultado da eleição de deputados para o Parlamento Europeu registrou uma vitória do partido fascista Reagrupamento Nacional, liderado por Marine Le Pen. Diante disso, o presidente do país, Emmanuel Macron, decidiu dobrar a aposta e, utilizando um dispositivo constitucional, dissolveu o parlamento, a Assembleia Nacional, e convocou novas eleições.

A legislação eleitoral da França possibilita, caso um partido não obtenha a maioria necessária para a consolidação do governo, a realização de um segundo turno para a escolha dos representantes na Assembleia Nacional. No primeiro turno, realizado em 30 de junho, o bloco fascista Reunião Nacional obteve 33% dos votos, contra 28% do bloco de centro-esquerda Nova Frente Popular e 20% dos Juntos, bloco de centro-direita, composto por Macron.

Diante deste cenário, uma intensa mobilização social foi necessária para deter a vitória eleitoral do fascista Reagrupamento Nacional, além de alguns acordos para a retirada de candidaturas locais entre a centro-esquerda e a centro-direita. Assim, o segundo turno da eleição do parlamento francês, realizado em 07 de julho, marcou uma impressionante virada eleitoral. A Nova Frente Popular obteve a maior votação, conquistando 182 cadeiras, seguida pelo Juntos com 168 e 143 do Reunião Nacional.

O cenário ainda é incerto, pois nenhuma força política conseguiu maioria para indicar o primeiro-ministro e, caso não se chegue a um acordo, o presidente pode indicar um governo de especialistas, desligados dos partidos políticos, o que precisaria ser aprovado pelo próprio parlamento.

Emmanuel Macron Foto: Ludovic Marin / Pool/EPA.

O que esperar do atual cenário político?

É quase natural que a vitória eleitoral do Partido Trabalhista na Inglaterra e a virada da Nova Frente Popular na França repercutam no Brasil como efeito de uma genialidade eleitoral, algum tipo de descoberta ainda não realizada por aqui. Mas é preciso ter cuidado para que a euforia de um lado e a preguiça intelectual de outro dificultem uma aproximação mais razoável da realidade.

A vitória expressiva do Partido Trabalhista Inglês resulta de uma rejeição massiva aos 14 anos de Partido Conservador à frente do país e do fracassado governo de Rishi Sunak, marcado por escândalos, destruição dos serviços públicos, aumento do custo de vida e inflação galopante. O país presenciou nos últimos três anos o maior período de greves do século XXI, além de grandes mobilizações contra o governo e em favor da Palestina, que vive um genocídio praticado por Israel com a conivência da maioria dos governos do mundo, incluindo o da Inglaterra.

Apesar de todo o caos provocado pelo Partido Conservador, Keir Starmer, novo primeiro-ministro inglês do Partido Trabalhista, em seu primeiro pronunciamento, tratou de elogiar o governo de Sunak, destacando que o conservador havia realizado um “trabalho árduo”. Além de não se esperar grandes coisas do governo de Starmer, que será mais uma expressão do neoliberalismo na sua versão “democrática”, é de se perguntar a Starmer qual o “trabalho árduo” de Sunak?

Na França, apesar de alguns acordos no segundo turno entre a Nova Frente Popular e os Juntos para não dividir o voto em algumas regiões, o elemento decisivo para a virada da Nova Frente Popular foi a intensa mobilização social contra o fascismo. Centenas de comícios e manifestações massivas foram realizadas por todo o país, o que contagiou importantes nomes do futebol francês, especialmente os descendentes de africanos.

A França também vive uma instabilidade social. Os efeitos da invasão da Rússia à Ucrânia e da invasão de Israel à Palestina são sentidos na economia do país. Além disso, o presidente do país (e banqueiro), Emmanuel Macron, tem atacado sistematicamente os serviços públicos, em especial a previdência social, o que gerou greves gerais e dezenas de manifestações massivas, provocando grande desgaste ao governo, o que tem sido bastante aproveitado pelo partido fascista (de neoliberalismo dissimulado de xenofobia) de Marine Le Pen.

Marine Le Pen. Foto: Reuters.

Superar o fascismo sem superar o capitalismo?

É preciso compreender que o fascismo é imanente ao sistema capitalista. Assim, apesar da importância de toda vitória sobre o fascismo, como uma eleição, nenhum taticismo eleitoral, mesmo que exitoso, representará mais que uma derrota parcial sobre o fascismo.

Todos os aspectos do fascismo compõem a estrutura do capitalismo. Em momentos de crise social e política, o fascismo sempre ressurge atualizado às novidades do capitalismo, como vemos nas suas novas expressões, adaptadas ao neoliberalismo e toda a barbárie que ele representa. É uma péssima ilusão acreditar que é possível enterrar o fascismo sem liquidar o capitalismo. A burguesia não tem motivos para renunciar à sua carta na manga e ao seu propósito de instaurar uma ditadura terrorista do capital financeiro.

O avanço do fascismo, sabem bem os brasileiros, ultrapassa as fronteiras da Europa, mobiliza ressentimentos e torna-se projeto de poder quando a democracia liberal se esgota e as crises econômicas ameaçam a sobrevivência da população. Na fase atual do capitalismo, o neoliberalismo, sem a ameaça da União Soviética, a burguesia europeia jogou o estado de bem-estar no lixo, de forma que não existe nenhuma saída para a instabilidade social sem rupturas com o sistema econômico capitalista.

É bom comemorar vitórias eleitorais sobre as forças fascistas, mas alimentar ilusões de superação do fascismo sem superar o capitalismo faz com que sejam vitórias de Pirro. Mais do que uma esquerda que pode vencer eleições, a realidade exige uma esquerda que pode realizar revoluções. Não custa lembrar Horkheimer: “quem não quer falar do capitalismo deve calar-se sobre o fascismo”.

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