quinta-feira 24 de outubro de 2024

MPF perde prazo e associação apresenta queixa-crime contra Braskem e órgãos públicos

Reprodução

Por Alexandre Sampaio

Diante do crime que expulsou 60 mil pessoas de casa, seis mil empresas, dezenas de milhares de trabalhadores e afetou, direta e indiretamente, 42 grupos sociais diferentes, incluindo alunos de escolas públicas municipais, estaduais e também de particulares, a sociedade de Maceió esperava que o Ministério Público Federal (MPF) cumprisse o seu dever de processar criminalmente a Braskem e os órgãos que foram coniventes com ela nesse processo predatório de exploração de sal-gema, que resultou no afundamento de cinco bairros.

Infelizmente, passados mais de quatro anos do terremoto que revelou o crime, que já vinha sendo perpetrado há muito mais tempo, e depois de 15 dias que nós fizemos a notícia-crime (a representação criminal no MPF), e ele continuou inerte, não restou outra alternativa, senão a gente fazer uma queixa-crime subsidiária, processando a Braskem por poluição qualificada e fraude no processo de licenciamento ambiental; processando o IMA por emissão de licença em desacordo com a lei, a Agência Nacional de Mineração (ANM) por não ter feito a fiscalização correta e alertado a sociedade das deformações das minas, e o BNDS por ter financiado com mais de sete bilhões de reais uma atividade criminosa sem o correto processo de licenciamento ambiental. Obviamente, quem vai definir isso é a Justiça, mas, os fatos são tão evidentes com autoria, materialidade e motivação, que não tem como não formalizar o processo para que os responsáveis por essa barbaridade sejam punidos.

Uma coisa que chama bastante a atenção é que nós, nesse processo de investigação para entrar com a queixa-crime, pedimos acesso ao inquérito da Polícia Federal contra a Braskem e, pasmem, não encontramos nenhuma possibilidade de acesso. Por mais de oito vezes, por diversas formas, a Polícia Federal, o Ministério Público e o próprio juiz negaram o acesso da gente, como representante das vítimas, ao inquérito. E só quando a gente começou a mexer no processo agora, no primeiro semestre desse ano, que foi decretado o segredo de justiça.

Então, o processo decorreu frouxo, sem nenhuma movimentação, praticamente, durante quatro anos. Aí, na hora em que a sociedade civil tenta ter acesso a Polícia Federal nega, o Ministério Público nega e o juiz federal do caso nega. A Corregedoria da Polícia Federal nega também e eu fico impressionado, né? E aí, o juiz responde dizendo que nunca foi provocado e nem sabia do processo que corria apenas entre o MPF e a PF. Então, isso significa que, durante quatro anos, não houve nenhum pedido de interceptação telefônica, nenhum pedido de quebra de sigilo fiscal, de busca e apreensão, pois, nesse tipo de caso é necessária a autorização judicial para você saber quem são as pessoas físicas envolvidas e como elas se beneficiaram com esse processo. É, realmente, muito estranho o processo como ele está correndo aqui em Alagoas.

A gente pergunta qual a importância de um processo criminal, de uma ação penal, no caso dessa movida pela Associação. É que a Braskem pratica o ‘greenwashing’ que é, na verdade, a lavagem verde. Diante dos acionistas e da Bolsa de Valores, ela é uma empresa que segue rigorosamente as regras de ‘compliance’ ambiental, que assina compromissos de sustentabilidade com a ONU, considerada uma das empresas que são exemplares de reciclagem, de processos de sustentabilidade e tudo mais. Mas, isso não passa de um discurso de maquiagem verde.

Nós sabemos que na prática, em Maceió, nada disso é verdade. Uma empresa que lida com a sustentabilidade não pode, jamais, ter praticado o que ela praticou em Maceió. É aí onde vem a curiosidade da nossa ação. Por exemplo, ela nunca fez um EIA, um estudo de impacto ambiental, em todo o processo de crescimento da exploração de sal-gema. Ela só apresentou em 1986 um Rima, então, ela foi aumentando o número de minas e o impacto necessariamente desse aumento da atividade não foi estudado a cada ampliação, sem fazer um estudo de impacto ambiental atualizado a cada momento de renovação de licença. E o próprio IMA, depois que o problema veio à tona, multa a Braskem por fraudar as informações no processo de licenciamento. Ora, isso significa que o próprio IMA sabia já dos problemas e não tomou atitudes antes do problema vir à tona, por isso, que ele está sendo processado também por ter emitido licença em desacordo com a legislação.

Nós temos consciência da importância dessa ação penal no cenário econômico do país, na bolsa de valores e, principalmente, para a responsabilização criminal da Braskem e dos seus cúmplices diante da barbárie que aconteceu em Maceió. Agora, a gente só deu entrada contra as pessoas jurídicas, porque contra as pessoas físicas que, dentro dessas jurídicas, teriam praticado eventuais crimes, isso cabe à investigação da Polícia Federal, a qual nós não tivemos acesso. Estamos vivendo um momento histórico em que a justiça vai dizer que tipo de sociedade queremos deixar pros nossos filhos e netos: a do lucro selvagem e predatório que destrói a natureza e as pessoas sem pena, ou da verdadeira sustentabilidade entre a atividade econômica e a natureza.

*É presidente da Associação dos Empreendedores e Vítimas da Mineração em Maceió

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