4 de março de 2020 11:42 por Geraldo de Majella
As articulações golpistas civis e militares vinham acontecendo nos estados e nas principais cidades há tempo. Desde o suicídio de Getúlio Vargas militares procuravam a melhor oportunidade para deflagrar o golpe, não foi possível impedir a posse de Juscelino Kubitschek, a oportunidade aparece contra o governo de João Goulart, em 1964.
A partir de 1962 o golpe entra na agenda política do presidente John Kennedy, tendo o embaixador dos EUA no Brasil, Lincoln Gordon, como o idealizador e estrategista mais qualificado.
Contava com a participação de políticos udenistas e de outras siglas, governadores, senadores e deputados, empresários, religiosos e da quase totalidade da grande mídia nacional fartamente subsidiada por recursos oriundos da Agência Central de Inteligência (CIA), Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD) e Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES).
O comandante da 4ª Região Militar, general Mourão Filho, sem que houvesse combinado com os líderes golpistas, desce a serra de Juiz de Fora (MG) em direção ao Rio de Janeiro, na madrugada do dia 1º de abril de 1964, antecipando o golpe.
Em Maceió, distante 1.948 km, o governador de Alagoas, general Luiz Cavalcante, amanheceu o dia transmitindo e recebendo informações. O aparelho de radiotelegrafia do Palácio dos Martírios funcionou durante a noite e a madrugada do dia 31 março e 1º de abril.
Os secretários de Estado foram convocados pelo governador em caráter extraordinário. Em depoimento ao autor, no dia 19 de fevereiro de 2000, o então secretário da Fazenda, Divaldo Suruagy, recebeu em sua residência, no bairro da Cambona, o chefe do gabinete militar coronel Cícero Argolo, convocando-o para uma reunião em palácio.
Suruagy, testemunha privilegiada dos acontecimentos, disse: “[…] O comandante do 4º Exército, general Justino Alves Bastos, através de rádio, tinha aderido à revolução, e o “Major” Luiz, da UDN, correligionário de Carlos Lacerda, adversário do Jango, decidiu pela Revolução. Era uma questão política. […] Nós ficamos de 31 até o dia 1º no palácio, reunidos, batendo papo, conversando. Quem comandou o processo das prisões foi o coronel João Mendes de Mendonça, secretário de Segurança Pública, com o apoio do Rubens Quintela e do (Albérico Barros) Barrinhos. Eles transformavam as ordens de prisão em realidade”.
O presidente do sindicato dos motoristas de Alagoas, Rubens Colaço Rodrigues, foi o primeiro preso político, no amanhecer da manhã de 1º de abril. Extrai esse trecho do meu livro: Rubens Colaço: Paixão e Vida – A trajetória de um líder sindical (Edições Bagaço, 2010), e agora publico.
Você foi preso no dia 1º de abril? Como se deu a sua prisão?
− Sim. Foi no dia 1º de abril e foi o Rubens Quintela quem executou a minha prisão. Ele parou o carro em que vínhamos de Pernambuco, no Tabuleiro do Martins, por volta das três horas da madrugada, dizendo:
– Você é Rubens Colaço?
– Às suas ordens.
– Está preso?
– Por quê?
Ele falou grosso:
– Nós fizemos uma revolução e vocês perderam; desça, venha cá.
Foi me escorando numa guarita, ali onde foi a Petrobras, Tabuleiro do Martins, e perguntou:
– Onde estão as fardas de guerrilheiros que você foi buscar no Recife, vindas de Cuba?
Falei sério:
– Devem estar aí no carro. Seus homens já devem ter achado.
Mas eu falei aquilo por pura ironia; aí ele engatilhou a metralhadora e disse:
– Olha, a sua vida está nas minhas mãos. Não tome deboche não, que você morre. Eu calado estava, calado fiquei. Ele olhou para mim uns trinta segundos e desengatilhou a metralhadora, botou no ombro e disse:
– Olha, Colaço, vou lhe dar uma oportunidade. Sabendo que se eu estivesse em suas mãos você não me daria.
Ordenou para os seus esbirros que estavam parados em pé, observando o diálogo:
– Levem o homem.
O que ocorreu em seguida?
− Nos levaram direto para a Secretaria do Interior e Segurança Pública, na Praça dos Martírios, depois para a penitenciária. Estranhei o fato do Expedito, o Expedito de…, era um rapaz funcionário da Petrobras, não me lembro o sobrenome dele. Nós ficamos presos e ele foi num carro especial para casa, onde os pais dele moravam, na usina Utinga Leão.
E vocês foram levados presos para a penitenciária?
− E nós fomos levados para a penitenciária, já amanhecemos o dia na cela 12. Fomos os primeiros a chegar. Quando foi às oito horas da noite, a cela 12, onde nós estávamos, que só cabia 24 homens deitados marcando cartão um no outro, tinha 28; então 12 ficaram na grade, na porta de entrada, e 12 ficavam na janela, que dava para o sanitário, acordados; aí depois, quando cansavam, iam para lá, fazíamos um revezamento, tinha sempre quatro acordados e 24 marcando cartão um no outro. O mesmo acontecia nas demais celas, na 13, em todas, enfim. No dia 4 de abril éramos 151 presos.
Nos próximos artigos abordarei as condições precárias da Cadeia pública de Maceió onde ficam trancafiados centenas de presos e outros aspectos de como a ditadura-militar agiu em Alagoas e as formas de resistências para derrotar o arbítrio e reconquistar a democracia.
5 Comentários
????
Aguardando o próximo texto. É sempre bom saber como os fatos ocorreram por aqui.
Que não se repitam.?
Amanhã tem mais serão trinta e dois textos sobre o golpe e a ditadura em Alagoas.
Pode espalhar pelo mundo.
DITADURA NUNCA MAIS!!!
É isso aí, Iremar.