sábado 9 de novembro de 2024

“A história do Brasil é marcada por diversas experiências de lutas pela terra”

Diferente do que se pensa, "reforma agrária" e "direito à terra" não são coisas apenas de “comunista”. Pesquisador e pesquisadora falam sobre seu novo livro paradidático, “História de Luta pela terra no Brasil (1960-1980)”, que pode ser baixado gratuitamente.

28 de dezembro de 2021 1:15 por Da Redação

 

Alessandra Gasparotto e Fabrício Teló | Reprodução

 

 

 

 

 

 

Por Bruno Leal, do Café História

Há algumas semanas, a pesquisadora Alessandra Gasparotto, professora do Departamento de História da Universidade de Pelotas, me escreveu a fim de divulgar seu mais recente livro didático, “História de Luta pela terra no Brasil (1960-1980)”, escrito em parceria com o sociólogo Fabrício Teló, que foi meu colega na Universidade Federal Fluminense (UFF) por volta de 2015, quando ambos fomos professores substitutos na instituição.

O livro é um projeto fantástico e que está disponível gratuitamente para download. Além de envolvente e bem escrito, ele é cheio de boxes explicativos, fotografias, recortes de jornais e diversos tipos de ilustrações. Embora seja um livro paradidático, isso é, um livro que visa aprofundar os conhecimentos dos alunos sobre um determinado tema visto em sala de aula, “História de Luta pela terra no Brasil” é acessível a todos e todas.

Minha ideia inicial era fazer uma notícia divulgando o lançamento, mas o projeto é tão interessante e o tema é tão importante (e, ao mesmo tempo, mal compreendido), que eu decidi fazer uma entrevista com os seus autores. Abaixo, Gasparotto e Teló falam mais sobre o livro e nos ajudam a entender o que, afinal, significa, reforma agrária e a luta pela terra no Brasil. Boa leitura e não deixe de baixar o livro no site da Oikos Editora.

Como surgiu a ideia do livro?

Alessandra: o livro paradidático foi produzido a partir das investigações do Projeto de Pesquisa “Mobilizações e movimentos agrários, repressão e resistência do pré-64 à ditadura civil-militar: as trajetórias do Master no RS e das Ligas Camponesas em PE”, financiado pela CAPES por meio do edital Memórias Brasileiras – Conflitos Sociais.

Quando elaboramos o Projeto, já tínhamos a ideia de produzir um material paradidático sobre as lutas pela terra no Brasil. Nossa percepção é de que, muitas vezes, as histórias e memórias sobre tais lutas e experiências de resistência das populações do campo estão ausentes das salas de aula da Educação Básica. Então nosso desejo era produzir um material que pudesse contribuir para a abordagem do tema nas escolas.

Em geral, pensa-se “reforma agrária” e “direito à terra” como “pautas comunistas”. Isso é verdade?

Fabrício: A associação entre a ideia de reforma agrária e comunismo no Brasil foi ganhando espaço nos anos 1950 e 1960, quando os movimentos camponeses, muitas vezes liderados por lideranças comunistas ou da esquerda em geral, intensificaram a luta por terra e por reforma agrária.

No entanto, há vários modelos de reforma agrária, que podem ser influenciados por uma visão de mundo tanto comunista como capitalista, com diversos graus de nuances entre esses dois polos. No pré-1964 havia vários projetos de reforma agrária apresentados no Congresso Nacional. Roberto Campos, por exemplo, defendia uma reforma agrária que estimulasse o desenvolvimento do capitalismo no campo brasileiro.

Portanto, a associação entre reforma agrária e comunismo é em parte produto de uma estratégia das oligarquias agrárias brasileiras de estigmatizar, com base na propaganda anticomunista, qualquer projeto de distribuição fundiária que representasse alguma ameaça a seus privilégios.

Quando pensamos em histórias de lutas pela terra, pensamos em MST ou, no máximo, em Ligas Camponesas, mas há muitos outros grupos nessa história, certo?

Alessandra: Sim, a história do Brasil é marcada por diversas experiências de lutas pela terra e de resistências no meio rural. Lutas protagonizadas por povos indígenas, por comunidades quilombolas, por diferentes categorias de trabalhadores e trabalhadoras do campo.

O livro paradidático, que é focado nas décadas de 1960 a 1980, evidencia essa diversidade: conta a história de quilombos e quilombolas, de agricultores/as sem-terra, de posseiros/as, da criação das Ligas Camponesas, da resistência de povos indígenas durante a ditadura etc.

Nosso objetivo é que o livro contribua para que essas histórias e memórias sejam ensinadas com toda sua diversidade e complexidade, transformando a escola em um espaço potente de discussão acerca da questão agrária, que é um dos principais fatores da desigualdade e da violência que marcam a nossa sociedade.

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