Por Gabriel Valery, da RBA
A comunidade acadêmica internacional está dividida sobre os avanços da inteligência artificial (IA). Enquanto mais de mil cientistas, empresários e historiadores pedem pausa nos experimentos com as novas tecnologias, essa posição está longe de ser consenso. Hoje, o cofundador da Microsoft, Bill Gates, disse à agência Reuters não enxergar a viabilidade de uma suspensão global das atividades. Enquanto isso, a Casa Branca promove ampla discussão sobre o tema.
Desde a carta da última semana – que contempla signatários como o cofundador da Apple Steve Wozniak e o empresário da Tesla, SpaceX e Twitter, Elon Musk – alguns importantes players do setor parecem sentir os impactos. Foi o caso da Midjourney, principal ferramente de manipulação de imagens com IA. A empresa norte-americana suspendeu os testes gratuitos um dia após a carta. A OpenAI, por outro lado, responsável pelo ChatGPT, sofreu um importante revés junto à Justiça italiana. Autoridades locais baniram a ferramenta e estudam multas milionárias à empresa.
O ChatGPT é, seguramente, a ferramenta que ganhou maior atenção nos últimos meses. Especialistas disseram estar “chocados” com a precisão da IA. Trata-se de um chatbot, um programa capaz de mimetizar a linguagem humana, dialogar com precisão e imitar personalidade. Além disso, ele tem acesso, virtualmente, a todo conhecimento disponível na internet. Rapidamente, o mundo voltou os olhos para os riscos deste tipo de tecnologia. Impactos que vão desde o mundo do trabalho a até as questões mais complexas e humanas.
Preocupações com a Inteligência Artificial
De acordo com o periódico inglês Daily Mail, um belga na casa dos 30 anos cometeu suicídio após dias de diálogo com o ChatGPT. Ele demonstrou inseguranças e medos sobre o futuro da humanidade. “Esta morte fez crescer as preocupações sobre sérios precedentes que devem ser levados muito a sério”, afirmam as autoridades locais.
Sobre a opinião de Gates, sua declaração não significa que ele não esteja preocupado. Pelo contrário. Ele defende que “é preciso localizar as complicações da tecnologia”. Contudo, o empresário não vê possibilidade de regresso. Muitos concordam com este ponto de vista. Para a pesquisadora de IA, uma das maiores referências na área no Brasil, Dora Kaufmann (PUC-SP), trata-se de um momento de disrupção. A IA veio mudar o mundo “assim como o carvão e a internet”, argumenta.
Logo, de acordo com esse ponto de vista, Gates não acha viável interromper estudos. Ao contrário, ele defende o estímulo às aplicações benéficas da IA. “Não acho que pedir a um grupo específico para fazer uma pausa resolva os desafios. Eu realmente não entendo quem eles estão dizendo que poderá parar, e se todos os países do mundo vão concordar em parar (…) Claramente, há enormes benefícios nessas coisas”, disse.
Casa Branca mobilizada
O fato é que enquanto cientistas e influenciadores de escala global lançam opiniões sobre a IA, autoridades correm para pensar numa regulamentação. Desde 2018 a Comissão Europeia debate a possibilidade de criar uma legislação comum no Velho Continente. Contudo, após cinco anos de debates e mais de 3 mil emendas e modificações dos textos, nenhuma conclusão. Hoje, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, realizou uma reunião sobre o tema.
De acordo com a Casa Branca, a intenção é identificar “problemas e oportunidades” das novas tecnologias. “Discutir a importância de proteger os direitos e a segurança para garantir inovação responsável e salvaguardas apropriadas”, argumentou o governo local. Em primeiro lugar, Biden pretende pressionar o Congresso a criar mecanismo de proteção às crianças diante da IA e outras tecnologias digitais.
Orientação
Ainda sem uma regulamentação expressa, a Casa Branca emitiu um documento oficial sobre IA: Blueprint for an AI Bill of Rights. Na prática, o texto – Projeto para uma Declaração de Direitos em IA – pretende ser uma prévia de “nova Constituição”. “São princípios e práticas para ajudar o desenvolvimento e uso de sistemas automatizados com finalidade de proteger direitos dos americanos na era da Inteligência Artificial”, afirma.
O governo ressalta que “efeitos colaterais são intensamente danosos, mas não são inevitáveis”. Então, o documento lista cinco medidas principais para orientar a população sobre os riscos da IA. “Elaboração de sistemas seguros e efetivos; Algorítmos devem ser blindados de preconceitos; A privacidade de dados deve ser respeitada; Tudo deve ser publicizado; Devem ser priorizadas considerações e posicionamentos humanos em face a problemas”.