Os valores fixados no acordo assinado entre a Braskem e os ministérios públicos Federal e Estadual são insuficientes para reparar todos os danos socioambientais e à mobilidade urbana que ocorreram após o afundamento do solo em cinco bairros de Maceió. Além disso, a quantia sequer cobre os danos morais coletivos e todos os desdobramentos da maior tragédia socioambiental em área urbana do mundo.
Pelos cálculos, somente às vítimas diretas, o valor que a Braskem deixou de pagar referente a danos morais seria quase dez vezes superior aos R$ 3,4 bilhões efetuados até janeiro deste ano. Os dados estão no documento entregue nessa segunda-feira, 17, por representantes de ex-moradores e comerciantes dos bairros atingidos pela mineração de sal-gema ao Ministério Público Estadual (MPAL) e ao governador Paulo Dantas. As visitas foram acompanhadas pelo senador Renan Calheiros, pelos deputados estaduais Alexandre Ayres e Ronaldo Medeiros, e pelo deputado federal Rafael Brito.
Veja a tabela:
Para chegar ao número apresentado, foram utilizadas premissas internacionais da Corte Interamericana de Direitos Humanos, estudos da Organização Cáritas, da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Esses dados apontam as matrizes de danos em casos de remoção forçada, como foi o caso de dezenas de milhares de pessoas, empresas e trabalhadores em Maceió. Os estudos definem, basicamente, que as vítimas diretas devem receber entre U$ 40 mil e U$ 80 mil do causador do problema. E as vítimas indiretamente afetadas, entre US 2,5 mil U$ 50 mil. Antes de fazer as contas, é necessário entender quem são e quantas são as vitimas, onde estão e como foram afetadas.
O levantamento independente revela a existência de 22 categorias de vítimas (físicas e jurídicas) diretas da Braskem, como proprietários de imóveis, inquilinos, usuários de linhas de transporte desativadas, empresários, trabalhadores formais e informais. E outras 20 categorias afetadas indiretamente.
O recorte analisado foi o número de vítimas dentro e fora do mapa de risco, a partir de dados oficiais obtidos no sítio eletrônico da Braskem. “Contudo, não são todos os dados que estão disponibilizados pela empresa, desta forma, esta comissão buscou por meio de solicitações oficiais para os órgãos, através da Defensoria Pública do Estado de Alagoas”, explica Alexandre Sampaio, presidente da Associação dos Empreendedores no Pinheiro e Região Afetada pela Braskem.
O levantamento inclui as áreas vizinhas, ou seja, que foram diretamente afetadas pela remoção de moradores e empresas das áreas afetadas:
- Corredor Viário Cambona/Bebedouro – início Santa Amélia e entorno.
- Flexais de Cima, de Baixo, Quebradas e Marquês de Abrantes.
- Corredor Viário Ladeira do Bebedouro/Pinheiro (e todas as ruas próximas) até antes da borda da Avenida Fernandes Lima.
- Corredor viário do Eixo Cepa/Virgínio de Campos (e todas as ruas próximas) até antes da borda da Avenida Fernandes Lima, no Farol.
Crime
O deságio “assombroso”, afirma Alexandre Sampaio, é fruto de acordos “lenientes, tendenciosos, omissos é frágeis do ponto de vista do bom direito, da Constituição Federal, do Código Civil Brasileiro, do direito empresarial e de cálculos feitos por instituições independentes como a Cáritas e a Fundação Getúlio Vargas”.
Ele considera a ação da Braskem criminosa e defende que os processos contra a empresa sejam transferidos do direito civil para o direito criminal pois “somente uma Orcrim – Organização Criminosa – poderosa e cheia de tentáculos na administração pública e de instituições de pesquisa como a Diagonal e Tretra Tech para criar uma aparência de legalidade para uma sequência de crimes contra a humanidade e ao meio ambiente perpetrados pela mineradora Braskem”.
Sampaio sugere a nomeação de um delegado especial para investigar uma sequência de crimes cometidos pela empresa:
- Como, em que circunstâncias e com base em que documentos legais e estudos ambientais foram concedidas as licenças de mineração pela ANM-Agência Nacional de Mineração, MA e Prefeitura numa área densamente povoada em Maceió? As evidências da mineração fora dos padrões são públicas e notórias, a exemplo do diâmetro das minas, da distância entre elas e do péssimo manuseio técnico.
- Quem eram os gestores responsáveis pelo processo de liberação de lavra e licenciamento ambiental?
- Como, em que circunstâncias condicionantes foram realizados os Termos de Cooperação Técnica da Braskem com as Defesas Civis Municipal, Estadual e Federal, que aparelhou com equipamentos, carros e técnicos a Defesa Civil, que passa a ter uma dependência suspeita dos recursos da Braskem?
- Coma foi possível os ministérios públicos aceitarem, com base apenas uma declaração de independência, que a Diagonal (empresa que acompanha a Odebrecht em vários estados brasileiros e países) fosse responsável por uma série de diagnósticos tendenciosos, omissos e cheios de falhas técnicas e metodológicas para, no final encobrir as consequências dos crimes da Braskem?
- Por que os governos estadual, federal e municipal não tomaram nenhuma providência enérgica para realizar as pesquisas e diagnósticos e cobrar seriamente os valores devidos?
A liderança cobra empenho das autoridades, sob pena de termos a “perpetuação da barbárie soba aparência da legalidade, fruto de gestores públicos e líderes de entidades representativas completamente coniventes com o maior crime socioambiental do mundo em curso numa área urbana”.