Por Redação RBA
“É urgente estabelecer transparência e limites para redes sociais”, defende o professor da Universidade Federal do ABC (UFABC) e referência nos estudos sobre políticas públicas e novas tecnologias Sérgio Amadeu. O professor participou no sábado (6) do 4º Encontro Estadual de Blogueir@s Ativistas Digitais de São Paulo, promovido pelo Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé. Amadeu defendeu a urgência da aprovação de uma lei nos moldes do Projeto de Lei 2.630, o PL das Fake News.
A matéria está com sua tramitação suspensa após intensa campanha de difamação e desinformação da extrema direita aliada com as empresas do setor, as big techs. Para aqueles que lutam para que os crimes no ambiente virtual sigam impunes, trata-se de censura. Contudo, o PL é claro em garantir a liberdade de expressão e busca responsabilização sobre os crimes cometidos em ambientes virtuais. Para além disso, cobra transparência das big techs. “As plataformas digitais entraram profundamente na vida das pessoas – bem mais que a Rede Globo – de forma a reorganizar a vida na nossa sociedade”, lembra Amadeu.
Funcionamento das redes sociais
Essas empresas escondem do grande público o fato de que elas controlam o que cada um consome. As vontades e humores das big techs ficaram mais claras nas últimas semanas. O Google, por exemplo, passou a impulsionar conteúdos contrários ao PL. Mais do que isso, o algorítmo do mecanismo de busca começou a recomendar críticas hostis ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O que aqueles que controlam estas redes não conseguem entender, é que o projeto não é do governo e não prevê qualquer influência da Presidência em seu funcionamento.
“Se Google, Twitter, TikTok e afins não produzem os conteúdos, quem produz? Os usuários. O que as plataformas, sim, fazem, é controlar o que será mais ou menos visto. Quantas vezes veremos. Como será distribuído o conteúdo”, explica o professor. Mais do que isso, as plataformas coletam as informações dos usuários e rodam programas de análise em cima deste conjunto de dados, chamado big data.
Diante destes pontos, Amadeu fez uma provocação. “Precisamos ou não regular? Precisamos regular para que não tenhamos desinformação. Para que estas empresas não tenham tanto poder, que é outra face do problema. Mas precisamos também regular para que os dados das crianças brasileiras não saiam do país. Para sabermos que tipo de dados eles cruzam da gente. Você sabe o que o Facebook está fazendo com nossas informações? A gente não sabe. Eu sou um professor universitário, se quero fazer uma pesquisa, passo por um Comitê de Ética. Eles passam por onde?”.
Sem novidades
Além de Amadeu, participou do debate o professor aposentado da Universidade de São Paulo (USP), conselheiro da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, Lalo Leal Filho. Ele lembrou que a regulamentação de mídias não é um tema novo em democracias consolidadas. “A discussão sobre regulação da comunicação não é nova. Tem pelo menos 100 anos. Parece que caiu do céu, um raio no céu azul, mas tem 100 anos. Como regulá-las dentro dos limites da democracia é que é a questão”, disse.
Lalo trouxe o exemplo da Inglaterra, que possui a BBC como um grande exemplo de empresa pública independente de comunicação. “Trouxe um trecho da revista Public Opinion de 1924. A BBC foi fundada em 1922. ‘O fundador da BBC tem um poder único que nunca nenhum homem teve antes dele. De entrar em milhões de lares simultaneamente. Não há poder como este no mundo’, afirmava a revista, à época, sobre rádio. É importante notar que o rádio estimulava a discussão semelhante a essa que o mundo trava hoje em relação à internet. O fundador da BBC, Elon Musk (CEO do Twitter) e Mark Zuckeberg (CEO da Meta) estão na mesma. Com significativa diferença entre tecnologias”, disse.
Exemplos não faltam
Então, o Brasil se debruça neste momento sobre as redes sociais, mas Lalo lembra que “o país sequer resolveu seus problemas com a radiodifusão”. Ele cita monopólios midiáticos que comandam a opinião pública a serviço das vontades das grandes corporações há décadas. “Então, temos regulação da radiodifusão por todo o mundo (…) A França tem uma boa regulação; Portugal tem uma boa regulação com uma empresa pública de comunicação. Para não ficarmos apenas em modelos europeus, uma referência muito mais concreta é a Lei de Meios da Argentina (…) Enfrentaram o poderoso Clarín, algo como a TV Globo de lá”, lembra.