18 de maio de 2023 6:33 por Da Redação
Nos últimos dias surgiu de modo mais acentuado um debate público se a Braskem pode, ou não, explorar economicamente a área do maior desastre ambiental urbano do mundo causada por ela mesma.
O Promotor de Justiça Jorge Dória defendeu que a Braskem não pode fazer exploração econômica da área. O MPF lançou nota de esclarecimento reforçando essa posição.
Em contrapartida a Defensoria Pública do Estado de Alagoas, por meio do seu membro Ricardo Melro, também emitiu uma nota de esclarecimento mostrando que a Braskem pode sim no futuro explorar economicamente a área urbana destruída por ela.
Para compreender a essência desta discussão temos que resgatar os termos dos acordos firmados. O primeiro dos acordos firmados foi o chamado Acordo dos Moradores, firmado em 30-12-2019, que diz: “CLÁUSULA 14ª Os pagamentos referentes aos terrenos e edificações pressupõem a transferência do direito sobre o bem à Braskem, quando transferível.”
Claramente o Acordo autoriza a Braskem transferir para seu nome os imóveis que ela tinha, e tem, a obrigação de indenizar pelo ato ilícito praticado por ela. Transformando uma indenização por ato ilícito em uma verdadeira compra e venda de imóvel. Poderia ter feito isso? Entendemos que não! Se João esbofetear Franscisco ao ponto de ele ser hospitalizado por vários dias, Francisco tem o direito de ser indenizado material e moralmente por João e nem por isso João terá o direito de ficar com o rosto de Francisco! Esta cláusula constituiu um verdadeiro enriquecimento sem causa para a Braskem, pois a obrigação de indenizar por ato ilícito não dar o direito do agressor de se apropriar do bem danificado; além de permitir que o praticante de uma torpeza venha a tirar proveito da torpeza que praticou! Isso é ilegal e não tem qualquer amparo legal, contudo os ministérios públicos, fiscais da ordem jurídica, permitiram essa tamanha violência! E o que deveria ter acontecido? A Braskem deveria indenizar cada pessoa atingida pelo desastre ambiental e os proprietários dos imóveis deveriam continuar com a propriedade destes imóveis e no futuro se discutiria o destino deles, como aconteceu no desastre de Mariana em Minas Gerais, garantindo o princípio da participação efetiva das vítimas.
Para piorar vem um segundo acordo, chamado Acordo Socioambiental, firmado em 30-12-2020, cujo parágrafo segundo da cláusula 58 diz: “Parágrafo Segundo. A Braskem compromete-se a não edificar, para fins comerciais ou habitacionais, nas áreas originalmente privadas e para ela transferidas em decorrência da execução do Programa de Compensação Financeira, objeto do Termo de Acordo celebrado em 03 de janeiro de 2020, salvo se, após a estabilização do fenômeno de subsidência, caso esta venha a ocorrer, isso venha a ser permitido pelo Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano da Cidade de Maceió – AL.” (Destaque nosso).
Dizia um professor de direito que a desgraça de um artigo é seu parágrafo e que a destruição de uma proposição jurídica bem-intencionada constante no início pode estar no seu final. É o caso. No início do parágrafo está dito que é proibido construir qualquer edificação, mas no final consta a ressalva “salvo se”, que tem claro sentido adversativo, negando o que se disse antes!
Os defensores da tese de que essa cláusula não permite que a Braskem faça no futuro uma exploração econômica da área esquecem os poderes inerentes do proprietário, de que quem é dono manda! A propriedade tem em si um inegável poder econômico, político e social que quem é proprietário pode exercer! A Braskem, apesar de ser uma infratora da legislação ambiental, tendo possivelmente praticado um crime contra o meio ambiente, pode tirar proveito de sua torpeza! Vindo no futuro ganhar enormes lucros apesar de ter causado a desgraça para dezenas e dezenas de maceioenses, inclusive provocado doenças insanáveis e mortes por suicídios!
Parece que os ministérios públicos esqueceram com o que já foi feito com os nossos planos diretores em que o poder econômico interferiu livremente sobre essa importante lei e aqui vai dois exemplos: a) a própria Braskem interferiu para transformar a área em que está localizada, numa região de restinga, em área industrial, ferindo toda a sistemática do plano diretor e da legislação ambiental; b) o lobbie das empresas de construção civil para que o plano diretor permitisse a construção de “espigões” na área costeira do litoral norte, preceito este que inclusive que chegou a ser objeto de questionamento judicial pela Procuradora da República Niedja Kaspary. Se a Braskem já fez lobbie e interferiu a seu favor um plano diretor, se as nossas empresas de construção civil interferiram no plano diretor para o atendimento de seus interesses, porque a Braskem não poderia interferir novamente para recuperar com larga margem de lucro todas as despesas que está tendo com as “compras” de imóveis das áreas atingidas que está fazendo!? É no mínimo ingenuidade dos defensores da tese da proibição de futuras construções, quando o próprio texto do acordo nega veementemente essa conclusão!
Lamentavelmente os ministérios públicos cometeram um duplo erro contra a legislação e a favor da Braskem, primeiro autorizando que a empresa infratora ambiental adquirisse os imóveis que destruiu; segundo, abrindo uma possibilidade para que essa infratora do meio ambiente possa no futuro explorar uma área nobre da cidade de Maceió, recuperando com enormes lucros tudo o que despendeu!
*É morador do Pinheiro, Membro do MUVB e procurador regional do Trabalho
1 Comentário
Então, povo burro, vamos nos entregar ao neoliberalismo total, privatizar, desestatizar, desrregulamentar para 0,50% da população , precificando tudo, que, assim, seremos mais “livres e felizes”…