segunda-feira 23 de dezembro de 2024

Orcas atacam barcos na Europa e ensinam filhotes a fazer o mesmo

Desde 2020, os ataques de orcas a embarcações na Europa têm sido mais frequentes, seguindo todos o mesmo padrão
Foto: Governo da Espanha – Ministério dos Transportes, Mobilidade e Agenda Urbana

Um estudo publicado há um ano na revista Marine Mammal Science trazia relatos de encontros agressivos de orcas com embarcações no largo da costa ibérica reunidos desde maio de 2020. Passados três anos desde o início do levantamento, os episódios têm ficado cada vez mais frequentes nos mares da Europa.

No início do mês passado, seis animais da espécie Orcinus orca atacaram um veleiro que navegava pelo estreito de Gibraltar. Greg Blackburn, que estava a bordo da embarcação, diz ter percebido como uma orca mãe apareceu para orientar os golpes de seu filhote. “Era definitivamente alguma forma de educação, de ensino acontecendo”, disse Blackburn ao site 9news.

Dois dias depois, no mesmo local, segundo uma publicação alemã chamada Yacht, um grupo de três orcas atingiu um iate, perfurando o leme. “Havia duas orcas menores e uma maior”, disse o capitão Werner Schaufelberger. “Os pequenos sacudiram o leme na parte de trás, enquanto o grande repetidamente recuou e abalroou o navio com força total do lado”.

Segundo o capitão, as orcas menores imitavam as maiores. “As duas pequenas orcas observaram a técnica da maior e, com uma leve correria, também batiam no barco”. A guarda costeira espanhola resgatou a tripulação e rebocou o barco para Barbate, mas ele afundou na entrada do porto.

Ataques de orcas na Europa seguem um padrão

Conforme destaca o site Live Science, esses ataques parecem ser dirigidos principalmente a barcos à vela e seguem um padrão claro, com as orcas se aproximando da popa para atingir o leme e perdendo o interesse quando param o barco com sucesso.

“Os relatos de interações são contínuos desde 2020 em locais onde as orcas são encontradas, seja na Galiza [noroeste da Espanha]ou no Estreito”, disse o coautor Alfredo López Fernandez, biólogo da Universidade de Aveiro, em Portugal, e representante do Grupo de Trabalho Orca Atlântica.

À esquerda, uma orca nada ao lado de um barco no Estreito de Gibraltar, em registro feito em 24 de maio. À direita, um veleiro danificado por orcas na costa do sul da Espanha | Reprodução Instagram @April_Georgina

Ele ressalta que a maioria dos encontros tem sido inofensiva. “Em mais de 500 eventos de interação registrados desde 2020, há três navios afundados. Estimamos que as orcas só tocam um navio em cada cem que navegam por um local”.

Segundo Fernández, o aumento das investidas contra barcos é um fenômeno recente. Os pesquisadores acreditam que um evento traumático pode ter desencadeado uma mudança no comportamento de uma orca, que o resto da população aprendeu a imitar.

Por que elas estão agindo assim?

“As orcas estão fazendo isso de propósito, claro, não sabemos a origem ou a motivação, mas o comportamento defensivo baseado no trauma, como origem de tudo isso, ganha mais força para nós a cada dia”, disse o pesquisador.

Especialistas suspeitam que uma orca fêmea que eles chamam de White Gladis sofreu um “momento crítico de agonia” – uma colisão com um barco ou aprisionamento durante a pesca ilegal – que virou um interruptor comportamental. “Essa orca traumatizada é que iniciou esse comportamento de contato físico com o barco”, disse Fernández. “Não interpretamos que as orcas estejam ensinando os jovens, embora o comportamento tenha se espalhado para os jovens verticalmente, simplesmente por imitação, e depois horizontalmente entre eles, porque eles consideram isso algo importante em suas vidas”.

O pesquisador acrescenta que as orcas parecem perceber o comportamento como vantajoso, apesar do risco que correm ao bater em estruturas de barcos em movimento. Desde que as interações anormais começaram, quatro orcas pertencentes a uma subpopulação que vive em águas ibéricas morreram, embora as suas mortes possam não estar diretamente relacionadas a encontros com barcos.

Outra explicação para o comportamento incomum também considera um fator lúdico ou o que os pesquisadores chamam de “modismo” – um comportamento iniciado por um ou dois indivíduos e temporariamente adotado por outros até ser abandonado. “Eles são animais incrivelmente curiosos e brincalhões e, portanto, isso pode ser mais uma coisa lúdica do que uma coisa agressiva”, disse Deborah Giles, pesquisadora de orcas da Universidade de Washington e da organização sem fins lucrativos Wild Orca.

À medida que o número de incidentes cresce, aumenta a preocupação tanto com os marinheiros quanto com a subpopulação de orcas ibéricas, que está listada como criticamente ameaçada pela Lista Vermelha da IUCN.

Segundo Fernández, o censo mais recente, de 2011, registrou apenas 39 orcas ibéricas. “Se essa situação continuar ou se intensificar, pode se tornar uma preocupação real para a segurança dos marinheiros e uma questão de conservação para essa subpopulação ameaçada de baleias assassinas”.

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