Na última terça-feira (25), os ministérios públicos Federal (MPF) e Estadual (MPAL), a consultoria Diagonal Empreendimentos e Gestão de Negócios, a petroquímica Braskem e a Prefeitura de Maceió fizeram um encontro virtual para falar sobre as ações a serem realizadas nos bairros impactados – direta ou indiretamente – pela realocação dos moradores devido ao afundamento do solo causado pela Braskem.
Segundo nota do MPF, a base da discussão foi o Diagnóstico Técnico-Participativo do Plano de Ações Sociourbanísticas (PAS) elaborado pela Diagonal após escutas públicas. As ações abrangem saúde, educação, assistência social, geração de emprego e renda, qualificação urbana e patrimônio cultural, em parceria com secretarias municipais.
Essa informação mobiliza um grupo de entidades e moradores das áreas afetadas, que não reconhecem a imparcialidade da Diagonal na elaboração do (PAS). As razões para a insatisfação do grupo com a consultoria estão em um dossiê de 89 páginas, destinado ao MPF.
No documento, eles explicam os motivos de não confiarem na Diagonal e, por isso, se sentem excluídos da elaboração do plano de ações, que abrangem os bairros Pinheiro, Bebedouro, Bom Parto, Farol, Benedito Bentes, Vergel do Lago, Jacintinho, Clima Bom, Tabuleiro do Martins, Santa Amélia e Eustáquio Gomes.
“As vítimas não foram ouvidas, os moradores como também os empreendedores não participaram da construção dos termos desse acordo. Inclusive, nós apresentamos um requerimento, um pedido de autocomposição, solicitando a revisão do acordo com a participação das vítimas, mas a força tarefa indeferiu nosso pedido”, disse a professora Neirevane Nunes, que assina o dossiê.
De acordo com os pesquisadores, o diagnóstico apresenta falta de rigor científico, as lacunas metodológicas, dados escassos e deficientes, além da utilização de referências inadequadas e algumas delas inexistentes, como no caso do Plano de Mobilidade de Maceió. “O grupo continua exigindo novos estudos, desta vez, com a efetiva participação da sociedade”, destaca o texto.
Os signatários do dossiê acreditam que as “escutas públicas” e a construção do Diagnóstico foram realizados, apenas, para dar sustentação ao acordo celebrado entre a Braskem e os poderes constituídos, ignorando a realidade das comunidades e negando os seus direitos à reparação integral.
“Diagnóstico afirma que as comunidades dos Flexais, Quebradas, Marquês de Abrantes e Vila Saem se encontram em ‘áreas habitáveis e seguras’ (DIAGONAL, 2021, p.358) e defendem a permanência das mesmas. Isso é aviltante, pois estas comunidades estão em isolamento socioeconômico e em total vulnerabilidade, tendo seus direitos violados sendo submetidas a viver num ambiente insalubre, inseguro e sem habitabilidade. Condições estas desumanas constatadas em todos os estudos realizados nestas comunidades”.
Vícios
O dossiê traz alguns fatos que caracterizariam vícios e falta de rigor científico no Diagnóstico da Diagonal. Entre eles:
- Utiliza sempre o termo “evento” ou “fenômeno” geológico ou invés de crime ambiental;
- Utiliza o termo “bairros anfitriões” se referindo aos bairros que estão recebendo os moradores das áreas afetadas pelo afundamento.
- Em nenhuma parte do documento a Braskem é citada como responsável pela tragédia/crime em Maceió.
- O documento declara que “o processo de realocação deverá gerar maiores oportunidades de trabalho e renda” (pág.346), o que é um absurdo diante do processo real de empobrecimento e aumento da vulnerabilidade das famílias realocadas.
- O Diagnóstico também afirma que “o pagamento das indenizações é uma oportunidade para o reaquecimento do mercado imobiliário de Maceió”. Aliás, este é o Diagnóstico das “oportunidades”, visto que a palavra “oportunidade” aparece 171 vezes (diagnóstico mais seu suplemento) enquanto a palavra dano apareceu por 11 vezes e “desastre” apenas 4.
- Enaltece o valor pago pelo aluguel social aos afetados quando diz que “o aluguel social da Braskem é superior ao aluguel social municipal”. Uma comparação absurda visto que o valor pago pela Braskem é insuficiente fazendo com que muitos dos afetados arquem do próprio bolso pra completar o aluguel, para além dos outros custos que surgiram na mudança drástica da dinâmica familiar.
- Afirma que a população tem feito a “opção” por morarem em bairros com valores de imóveis mais baratos. Ora, não é uma questão de opção uma vez que esta população ficou sem alternativas diante do valor irrisório e vergonhoso que a Braskem tem pagado pelos imóveis, não considerando a alta de preços do mercado imobiliário local.