domingo 24 de novembro de 2024

Uma breve e lamentável história para turista saber

Como todo esse itinerário de bandidagem não constitui um crime ambiental e não tem réus ou rés? O que é então que a Braskem é? Uma Máfia? Uma Organização Secreta? O que?
José Geraldo Wanderley Marques | Reprodução

Por José Geraldo Wanderley Marques*

Sim, Maceió ainda é o “Paraíso das Águas”! E assim continuará a ser!

Por tudo e apesar de tudo o que lhe fazem agora e por tudo o que lhe fizeram, sua beleza é inconteste, mas…

Vou contar-lhes uma tenebrosa história onde o verbo “roubar” vai ser usado de modo recorrente e nem sempre com sentido metafórico. Deixo esta questão semântica ao critério do quanto pesem as vossas diversas consciências e as vossas múltiplas sensibilidades.

Começa bem ali e já agride o simples olhar de quem mire na direção das belas praias mais centrais da cidade. Vê-se um monstrengo! Pois bem, foi ele que roubou dos maceioenses um pedaço paradisíaco da sua bela paisagem, um que possuía enorme potencial turístico. O monstrengo atende hoje pelo nome de Braskem, mas foi batizado com o nome de Salgema.

Para se apropriar do pedaço abocanhado, antes tinha cometido um daqueles piores crimes, aquele cuja tipificação passou a emergir com furor de capitalismo selvagem no século XX: um ecocídio. Com ímpeto de vendaval levou no eito ecossistemas de beleza e fragilidade ímpares. IRRECUPERAVELMENTE!

Tais ecossistemas, capital natural não inerte (pois prestava relevantes serviços ambientais) avizinhavam-se da urbe, cujo tecido expandia-se, numa direção por território de crescente valor imobiliário e em outra de importante comunidade de pescadores artesanais. Com relação a esta, a injustiça ambiental era claramente manifesta. Simplesmente ignorada, viu-se imersa num terror de incertezas, não só quanto ao presente, mas sobretudo quanto ao futuro, tanto o seu quanto o dos seus recursos naturais.

Para abrigar o monstrengo, belíssimas dunas foram totalmente destruídas, imponentes manguezais foram devastados, aniquilados foram coqueirais antigos e produtivos, praias foram poluídas e vegetação de restinga foi reduzida a nada.

O monstrengo encravou-se, com pleno conhecimento de causa, em uma ponta de restinga (sabidamente até por iniciantes ser intrinsicamente frágil e legalmente classificada como área de preservação permanente), na proximidade de uma oscilante abertura de conexão do mar com as lagoas e em área sobejamente conhecida como sujeita a alterações da linha de costa, inclusive já tendo experimentado antropicamente esta ação em área contígua.

E para cumprir o seu destino ecocida começou a esburacar, sem o menor respeito e sem a mínima competência técnica, cavernas imensas no subsolo da capital, sob ruas, escolas, equipamentos urbanos, empresas e… pasmem: residências! Cavernas do tamanho de um Maracanã, próximas umas das outras e nas proximidades de falhas geológicas. Isso tudo para satisfazer os apetites gulosos da empresa norte-americana Dupont de Neymours, que queria e ganhou de graça a principal riqueza mineral do Estado de Alagoas, com isenção fiscal e tudo: o sal-gema abundante de que o nosso território fora adotado.

Usou e abusou o quanto e enquanto quis e depois, com os bolsos super cheios, bateu em retirada, permitindo, diz-se, tenebrosas transações que geraram até os dias de hoje uma sucessão acionária que culminou em um casamento de duas empresas com antecedentes socialmente postos em dúvidas: Odebrecht (isso mesmo: ODEBRECHT) e PETROBRAS, as quais, feito prostitutas que buscam vender seus corpos, andam de cuia na mão, atrás de quem queira compra-lhes o controle acionário.

Busca inútil, pois comprá-la é “ganhar” de presente um gigantesco passivo ambiental e uma dívida colossal que a empresa contraiu com governos, empresas e populações das Alagoas. E sob três ameaças de concretização iminente que a apavoram: a abertura de uma CPI no Senado, um julgamento internacional em Corte de Amsterdam e uma queixa-crime impetrada com o explícito objetivo de criminalizá-la.

Pois ela não se reconhece ré, nem assim foi ainda reconhecida pelas instâncias jurídicas que patrocinam um simples acordo de validade duvidosa. E ainda se abriga sob guarda-chuvas de clausulas fiscais secretas e de trâmite jurídico sigiloso!

Como não é criminosa? Vejamos os caminhos até agora percorridos:

Para inaugurar-se aqui, a Dupont deu início ao roubo do nosso capital mineral e exportou-o em transporte perigoso sob as benesses e as vistas grossas da isenção fiscal e dos irresponsáveis órgãos ambientais. Para tanto, construiu cais e terminal marítimo próprios sob pilotis implantados em substrato geologicamente inapropriado, utilizando-o também para o lançamento permanente de ácido clorídrico e outros efluentes industriais perigosos em águas marinhas imediatas a um dos mais importantes bancos de camarões do Estado de Alagoas, fato que veio a se tornar rotina ao longo dos anos.

Antes da despedida, o tentáculo norte-americano que havia cavoucado semiclandestinamente as profundezas geológicas legou aos seus seguidores a vocação de minhocas, transmitindo-lhes, se não pela fala, pelo inconteste exemplo, a missão e as lições aprendidas para atuar no vácuo institucional de controles, nos meandros das semiclandestinidades e nas peripécias governamentais e jurídicas, tão ao gosto de boa parte das elites alagoanas. Os seus sucessores aprenderam bem a lição e semiclandestinamente ultrapassaram o subsolo urbano atingindo a região lagunar que também passou a ser cavoucada, inclusive nas vizinhanças do órgão de controle ambiental do Estado. E assim sucessivamente, de roubo em roubo, de golpe em golpe, os novos capítulos foram escritos, até o embrião tornar-se na gigantesca Braskem.

No percurso, roubou a nossa água lagunar rica em plâncton, causou explosão com vítima, contaminou o lençol freático e tem lançados sucessivas emanações fugitivas de cloro sobre a vizinhança. De roldão, inviabilizou totalmente um campus da Universidade Federal de Alagoas e inutilizou várias escolas. Roubou o futuro de nossas crianças e de nossos adolescentes.

E o pior ainda pode acontecer, segundo relatório da CETESB, não é descartável a probabilidade de uma emanação massiva de cloro sobre a cidade de Maceió com seu milhão de habitantes que poderão ser vitimizados, inclusive com a possibilidade de eventos letais. Pior do que o pior já acontecido? Pois os desmandos foram num crescente que culminaram no maior desastre socioambiental do mundo em curso em área urbana: cavernas coalesceram, o teto das minas ruiu nas profundezas e a superfície viu-se sacudida por um terremoto, cujas consequências racharam casas e vias que tiveram que ser abandonadas com a geração de pelo menos cinquenta mil refugiados ambientais expulsos ou vitimados por um engodo de indenização que mais mereceria o termo de “roubo consentido”. Parte da cidade começou a afundar tornando inabitáveis bairros inteiros, cuja paisagem agora é similar à de bombardeios bélicos!

Como todo esse itinerário de bandidagem não constitui um crime ambiental e não tem réus ou rés?

O que é então que a Braskem é? Uma Máfia? Uma Organização Secreta? O que?

Ela é o que ela é: uma perita em greenwashing e uma mestra em expertise de acordos tácitos que lhe dão vantagens! Isto, para usar termos legantes e de jargões modernos na nossa área ambiental. Dando melhor nome aos bois: ELA É UMA EMPRESA ECOCIDA QUE SE ESCONDE SOB UMA MÁSCARA ECOPORNOGRÁFICA!!!

“Há algo de podre no reino das Alagoas” (parafraseando Shakespeare). E o seu nome é Braskem! NOVONOR é apelido que ela comprou como tática de greenwashing. E há vítimas, milhares de vítimas de “latrocínios” disfarçados!

Chegou a hora final do acerto de contas. E não vamos perdoar. Tudo fizemos até agora para termos um final de jogo onde todas as partes ganhassem. Uma parte não quis. Então vai ter de pagar! Não há crime sem criminosos. E cadeia foi feita para aprisionar!

*Originalmente publicado no portal Maltanet

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1 Comentário

  • Décadas se passaram e não houve um Cafuçu Alagoano ( aqueles que detinham poder) que se antepos a tragédia, agora tardiamente todos pegaram o bonde no fim da linha pq? Pruque???

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