Por Bárbara Luz, do portal Vermelho
O vereador Rubinho Nunes (União Brasil), ex-membro do Movimento Brasil Livre (MBL), obteve o aval de seus colegas na Câmara Municipal de São Paulo para a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que visa investigar Organizações Não Governamentais (ONGs) que atuam no centro da cidade. A principal mira da CPI é o trabalho filantrópico do padre Júlio Lancellotti, da Paróquia de São Miguel Arcanjo, conhecido por sua atuação na região da Cracolândia.
A iniciativa, que recebeu 25 assinaturas, tem como alvo principal duas entidades que realizam trabalho comunitário destinado à população de rua e aos dependentes químicos da região: o Centro Social Nossa Senhora do Bom Parto (Bompar) e o coletivo Craco Resiste. O vereador acusa o religioso de fazer parcerias com essas organizações, alegando receber “inúmeras denúncias” sobre a atuação de diversas ONGs que, segundo ele, fornecem alimentos, mas não realizam o devido acolhimento dos vulneráveis.
Nunes vai além, denominando essa situação como a “máfia da miséria”, alegando que há uma rede de organizações que receberiam recursos públicos e privados para auxiliar dependentes químicos, mas estariam, segundo ele, agravando a situação dos afetados. Em suas palavras, o padre Júlio seria o “verdadeiro cafetão de miséria em São Paulo”, enfatizando que a distribuição de comida e itens básicos não resolve efetivamente a problemática. A expectativa é de que a comissão seja instalada no retorno do recesso parlamentar, em fevereiro.
Em resposta às acusações, o padre Júlio Lancellotti afirma que a instalação da CPI “é um direito” dos vereadores, mas ressalta que o trabalho da Pastoral é independente e não recebe apoio do governo municipal. Em nota pública, Lancellotti esclareceu que a atividade da Pastoral da Rua é uma ação pastoral da Arquidiocese de São Paulo e não está vinculada às atividades que motivaram a criação da CPI.
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Repercussão
O tema ganhou destaque nas redes sociais, com o nome do padre Júlio Lancellotti figurando entre os assuntos mais comentados do X (antigo Twitter). Parlamentares, lideranças de movimentos sociais, membros da sociedade civil e entidades como a UNE (União Nacional dos Estudantes), criticaram a iniciativa da Câmara paulistana e convocaram seus correligionários a defender as ações do Padre.
A UNE, por exemplo, expressou “todo o apoio ao Padre Júlio Lancellotti, que sempre atuou em defesa da população em situação de rua, combatendo a aporofobia (aversão aos pobres) no Brasil.”
Segundo as publicações, a perseguição a quem trabalha para o acolhimento e garantia dos direitos básicos das pessoas em situação de rua é inaceitável. Nas redes sociais, a hashtag “protejam o padre Julio Lancelotti” circula, evidenciando o apoio popular ao religioso.
É inadmissível que a Câmara de vereadores de São Paulo tente instalar uma CPI contra o Padre Júlio Lancellotti! Enquanto a cidade está ao léu, tentam perseguir quem está ao lado da população, lutando por moradia digna, comida e políticas públicas efetivas. Todo meu apoio ao… pic.twitter.com/OA2kJVHcoA
— Sâmia Bomfim (@samiabomfim) January 3, 2024
Para a deputada federal Daiana Santos (PCdoB-RS), “a aprovação pela Câmara de São Paulo de uma CPI para investigar Padre Júlio Lancellotti é de um tamanho absurdo e vergonha“.
Todo o meu apoio ao nosso querido Padre Júlio Lancellotti, que sempre atuou em defesa da população em situação de rua, combatendo a aporofobia (aversão aos pobres) no Brasil. pic.twitter.com/QntYV2AxSZ
— Daiana Santos (@daianasantospoa) January 3, 2024
João Pedro Stedile, líder do MST, classificou como “absurdo” a instalação de uma CPI que é “nitidamente uma tentativa de perseguição política ao Padre Júlio Lancellotti e todos aqueles que lutam pela justiça social”.
A deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP) também disse ser um absurdo uma CPI para investigar ONGs que acolhem pessoas em situação vulnerável. “Tinha que ser obra dos mimados e criados a danoninho do MBL”, afirmou.
É simplesmente um ABSURDO e OBCENO que a @CamaraSaoPaulo (de vereadores) instale uma CPI para perseguir o Padre Júlio Lancelotti e demais organizações e figuras que, de maneira exemplar, doam seu tempo, sua força e sua vida para ALIMENTAR e ACOLHER irmãos e irmãs em situação de… pic.twitter.com/lpuePw71uc
— ERIKA HILTON (@ErikakHilton) January 3, 2024
Para Marcelo Freixo, presidente da Embratur, essa é uma “página triste da história da Câmara Municipal de São Paulo: perseguir, com uma CPI, quem dedica sua vida a fazer o bem. Sorte tem a cidade de contar com a humanidade de Padre Júlio Lancellotti, que segue o exemplo de Cristo e se dedica tanto a acolher famílias que deveriam, por direito, ser amparadas pelo estado.”
A situação também se tornou uma “pedra no sapato” da gestão de Ricardo Nunes (MDB) e promete ser um dos temas da disputa eleitoral deste ano em São Paulo – que disputa o primeiro lugar com o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL).