13 de julho de 2021 6:17 por Mácleim Carneiro
Certa vez, escrevi uma espécie de balanço sobre a cena musical alagoana, que foi publicado em 2003, no Caderno de Debates do Conselho de Comunicação N.02. Relendo o escrito percebi que, apesar de passado tanto tempo, a cena aquariana mudou pouco ou quase nada. Continua correndo atrás do próprio rabo, num moto-contínuo circular, que nos coloca uma hora com um pé na lama ancestral, outra hora com os dois pés no limo de sempre, que ceva o velho conceito da corda de caranguejos alagoanos, soltos ao pé da escada.
Resolvi começar o escrito fazendo uma analogia: Imagine um trem com vários vagões, cada um com a sua característica, sonoridade e criatividade próprias. No entanto, esse trem tem circulado em uma espécie de ferrorama, que o leva do nada a lugar nenhum. Eis a visão pessimista da macroestrutura na qual se encontra aprisionada a música contemporânea produzida em Alagoas. Porém, se tivermos (agora já com uma visão mais otimista) como perspectiva a noção de que cada um desses vagões é uma célula particular, e que a qualquer momento poderá se desvencilhar do maquinista e seguir outra trajetória, então, temos pontos positivos a ressaltar, com alguns avanços individuais, mas que pouco ou nada contribuem para o coletivo.
Mercado Pueril
A cena da música alagoana tem sido uma verdadeira colcha de retalhos, feita de alguns acertos e tantos outros desacertos. Música sempre foi, e nos tempos atuais mais ainda, um produto segmentado. Não podemos, para uma melhor compreensão, chegar aos detalhes que formam o todo sem nos determos em alguns pilares básicos dessa complexa estrutura. Então, tomemos como primeira referência os compositores. Afinal, é deles que sai a matéria-prima.
A realidade do pueril mercado alagoano, infelizmente, obriga a grande maioria dos compositores a dependerem de atividades paralelas, para que possam sobreviver financeiramente. São advogados, professores, jornalistas, funcionários públicos, militares, e etc. O paradoxo dessa situação está exatamente no fato de que, na medida em que alguns resolvem não desperdiçar seus talentos, ótimos discos foram lançados no decorrer do tempo. A diversidade destes lançamentos é tão ampla, que vai desde álbuns de proposta totalmente regional e comercial, passando pelo samba, rock, pop, até chegar ao canto coral e ao gospel.
A rapaziada jovem agrupa-se em tribos diferentes e criam bandas e produzem EPs numa quantidade inversamente proporcional à qualidade musical, com algumas exceções, é claro. Os talentosos, certamente, irão permanecer no ofício, chegando até às raízes da nossa cultura musical, para estabelecer uma linguagem que poderíamos chamar de ‘som alagoano’. Temos alguns bons exemplos de bandas que já demonstraram ter o entendimento de que somos um povo de muita musicalidade e, acima de tudo, somos capazes de propor e não simplesmente mimetizar.
Cobertor Curto
O fato é que a produção dos nossos artistas tem sido importante para gerar um mercado, ainda que pueril, mas que vinha se expandindo e se profissionalizando a cada disco gravado, a cada show, abrindo novas oportunidades para a contratação de músicos, técnicos de som e luz, artistas gráficos e produtores que, certamente, será reativado após essa pandemia nos dar uma trégua definitiva. Alagoas já dispõe de pelo menos dois bons estúdios de gravação, cuja qualidade técnica é compatível com o que se produz no mercado nacional. Então, o que falta? Simples: falta o escoamento de toda essa fértil produção.
Bem, em rápidas pinceladas, pudemos ver que a música popular tem tido pano para as mangas, mesmo remando contra a maré, mesmo sendo seus artistas tratados com uma desatenção discriminatória, com raríssimas exceções, é claro. Não obstante, e os outros segmentos? O que dizer da música erudita e do folclore (aqui compreendido como o conjunto de manifestações da cultura popular), por exemplo? Somos, talvez, o único Estado do Nordeste que, vergonhosamente, não tem um conservatório de música, apesar de termos uma juventude talentosa e ávida de conhecimento musical. Somos, talvez, um dos poucos Estados do Nordeste que não tem uma Orquestra Sinfônica da qual possamos nos orgulhar. E somos, com certeza, o único Estado que não valoriza na medida exata, com o devido respeito, os nossos verdadeiros artistas da cultura popular, nossos mestres e mestras do folclore alagoano. Se todo balanço tem que apresentar um resultado, então, o da música contemporânea alagoana é este: como cobertor; essa colcha de retalhos é curta demais.
No +, MÚSICABOAEMSUAVIDA!!!
4 Comentários
Gostei muito de suas reflexões suas constatações… O Brasil não conhece o Brasil…. mestre Aldir fala disso Tom Jobim idem, João Gilberto foi mestre e regate de canções que exaltavam a nação e e Bahia…. Vc Mácleim é um artista filósofo que busca o melhora pra os artistas de alagoas… parceiros e amigos… vc prestigia sua gente! Bravo!
Meu querido parceiro, você é os também mestres têm absoluta razão: o Brasil desconhece o Brasil.
Obrigado pelo seu olhar sempre carinhoso e gentil, para as coisas que proponho. É uma grande honra para mim tê-lo como parceiro e interlocutor.
Grande abraço e, no +, MÚSICABOAEMSUAVIDA!????
Mestre Mácleim, você é um talento, cantando, tocando, compondo e escrevendo. Parabéns.
Meu querido Márcio, a gentileza e generosidade do seu comentário me lisonjeia ao ponto de achar que devo seguir adiante na minha condição de propositor.
Minha gratidão, sempre!
Você é um querido meu, no tanto proporcional à sua estrutura humana e profissional.
Grande abraço e, no +, MÚSICABOAEMSUAVIDA!???