Por Priscila Lobregatte, do portal Vermelho
Em outra frente de revisão das posições adotadas sobretudo durante a gestão de Jair Bolsonaro (PL), o governo de Luiz Inácio Lula da Silva vai reavaliar os atos do ex-presidente contrários às recomendações resultantes da Comissão Nacional da Verdade (CNV), que apurou violações aos direitos humanos durante a ditadura militar. Entusiasta do autoritarismo e da tortura, Bolsonaro agiu para inviabilizar ou limitar os desdobramentos do órgão.
Na quarta-feira (26), em audiência pública na Câmara dos Deputados, o ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, anunciou a iniciativa de criar uma comissão interministerial com o objetivo de colocar em prática as recomendações contidas no relatório final da CNV.
“Vamos criar uma comissão, por portaria, no ministério, para que haja o monitoramento das ações e para que nós possamos estabelecer estratégias de implementação das recomendações da Comissão Nacional da Verdade”, disse Almeida.
Ao todo, segundo dados apresentados na ocasião pelo Instituto Vladimir Herzog em parceria com a Fundação Friedrich Ebert Brasil, o Estado brasileiro cumpriu, em totalidade, apenas duas das 29 recomendações feitas pela CNV em 2014, ou seja, apenas 7%. Além disso, 21% das recomendações foram parcialmente realizadas, 24% retrocedidas e 48% ignoradas pelo Estado brasileiro.
Dentre as medidas não cumpridas estão a falta de reconhecimento, por parte das Forças Armadas, da responsabilidade pelas violações e rompimento democrático; a promoção dos direitos humanos na educação e o fortalecimento das defensorias públicas.
No conjunto das recomendações que sofreram retrocesso no governo anterior estão medidas como, por exemplo, a proibição de eventos em comemoração ao golpe de 1964; o fortalecimento da política de localização e abertura dos arquivos da ditadura e a continuidade das medidas para localizar, identificar e entregar aos familiares os restos mortais dos desaparecidos políticos.
A Comissão Nacional da Verdade foi criada pela presidenta Dilma Rousseff e atuou entre em 2012 e 2014, com a finalidade de apurar violações do período de 18 de setembro de 1946 até 5 de outubro de 1988.
Ao longo de seus trabalhos, realizou audiências públicas, recebeu documentos e fotos e colheu depoimentos de vítimas e acusados. Seguindo o exemplo da CNV, outras comissões foram criadas em estados e municípios.
Ao final, a Comissão concluiu que houve ao menos 434 mortos durante a ditadura e outras 210 vítimas ainda desaparecidas. No total, 377 agentes do Estado foram indicados como responsáveis pelas violações de direitos humanos. A CNV também apontou que as violações de direitos humanos ocorreram como resultado de ação generalizada e sistemática do Estado brasileiro.
Como desdobramento dessas conclusões, a CNV indicou que o governo deveria criar um órgão permanente para dar seguimento às ações e recomendações da comissão, o que nunca ocorreu. Na falta dessa instância, algumas ações acabaram sendo assumidas pelo Instituto Vladimir Herzog e pela Fundação Friedrich Ebert (FES) Brasil.