Marcos Vasconcelos Filho é ensaísta e professor universitário
Dia 3 de agosto, às 19 horas, no Complexo Cultural do Teatro Deodoro, lançaremos mais um livro — “Temóteo Correia: ação pública e bastidores da vida de um parlamentar”.
Conheci o protagonista no meado dos anos 90. Objetivava ele o segundo mandato de deputado estadual. Nunca me sairia da cabeça o seu “jingle”, na voz de Cláudio Rios. Vivíamos ainda os outrora tão saborosos pleitos. Lá na Viçosa das Alagoas, conquanto menino de nove anos, já eu acompanhava meu Pai no seu anseio por um dia alcançar gerir a municipalidade.
Surpreende-me em Temóteo, de par da lhaneza e do raríssimo dom de preservar amigos, a infrequente sensibilidade à cultura. Sublinhei esse traço, incomum nos políticos, ao prefaciar “Muito além, no tempo: raízes de Alagoas” (2008), publicação da autoria do meu saudoso colega de Instituto Histórico e de Academia Alagoana, o ex-governador Divaldo Suruagy (1937-2015), o qual, onde me avistasse, exclamaria: “Meu mestre; meu biógrafo!”
Quando da leitura de um título, devemos sempre nos indagar: — Que mensagem as suas páginas transmitem para o nosso tempo?
Todo engenho biográfico exige ir além da poeira cronológica; a fim de potencializar a sua força crítico-criadora, imprescindíveis se revelam à técnica expositiva: a mescla da análise com o estilo literário, bem assim a problematização temática. E na presente obra, ademais de abundantemente ilustrada, contêm-se ao menos três reflexões medulares:
(1) Temóteo pertence justo à geração transitória (1.1) da política de peso-galo de ontem, lastreada na lealdade da amizade e no reconhecimento dos favores, época em que pontificou o seu sogro Tarcísio de Jesus (1923-1990), (1.2) ao racionalismo profissional dos cifrões de hoje, de modalidade peso-pesado no ringue da atividade eletiva.
(2) Somente aquele que vivenciou o quotidiano eleitoral poderá compreender, na inteireza, as passagens perto de filosóficas:
“Quantos políticos, ao calor de uma campanha, não se iludem com a crença no triunfo tais quais os moribundos sobre o leito, minutos antes do fim, aparentam convalescer”. Ou: “Só quem participou de campanhas eleitorais saberá pesar o quanto são exigentes e cansativas. O ritmo? Alucinante. Quase todo candidato julgará cada abraço, cada sorriso, cada gota de suor, cada visita, cada quilômetro percorrido como conversão em votos, de maneira a levá-lo à vitória. Ledo engano. A vida pública morde e assopra. Engabela. O sentimento de protagonismo de seus partícipes os envolve numa nuvem de promessas e de felicidades às vezes ardilosa. Nublam-se as perspectivas na malha do horizonte do êxito, o qual parece se aproximar do ato palpável, contudo apenas se constitui em realidade na mente dos postulantes. O sacrifício físico e pessoal talvez seja a única verdade no páreo pelo pódio”.
(3) O enredo fixa a coxia do tablado político local nas últimas décadas.
Tudo se tempera com o gosto do autor pela minudência, cujas energias melhores ele tem gastado (há mais da metade do viver) na louvável intimidade dos livros. Cochicha-se: cobiça ocupar (sob o perdão ao esnobismo terrível) um lugar na tradição ensaísta brasileira, ao lado da ficção graciliânica e da poética jorgelimiana.