5 de dezembro de 2023 7:32 por Geraldo de Majella
A implantação da fábrica da Salgema no Pontal da Barra, que mais tarde viria a se chamar Braskem, foi mais um golpe da Ditadura Militar nos alagoanos, nos 1970. Mas, a instalação da empresa responsável pelo maior crime socioambiental em área urbana do mundo não ocorreu sem resistência.
Desde aqueles tempos, a sociedade civil tem lutado e denunciado a mineração irresponsável e os governantes omissos com a questão. A ONG Movimento pela Vida, que nasceu no Sindicato dos Jornalistas de Alagoas (Sindjornal), foi um dos grupos de resistência. A população do Pontal da Barra é testemunha das passeatas realizadas para denunciar o que estaria por vir.
Em 1982, foi eleita uma bancada de vereadores e deputados estaduais que lutaram contra a duplicação da então Salgema. É importante e justo lembrar os nomes dos vereadores Edberto Ticianeli, Fernando Costa, Jarede Viana, Kátia Born, Freitas Neto e Guilherme Falcão. Os deputados estaduais Mendonça Neto, Ronaldo Lessa, Selma Bandeira, Eduardo Bomfim, Moacir Andrade e Ismael Pereira também atuaram contra a expansão da Salgema.
A sociedade civil não silenciou diante da força avassaladora da Braskem e reage de todas a formas. Professores da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), pesquisadores, cientistas estão realizando estudos e diagnósticos para a Defensoria Pública de Alagoas (DPE) embasar cientificamente ações judiciais. São dezenas de mestres e doutores estão empenhados na defesa das vítimas, da cidade e da vida diante do poderio da multinacional que vem praticando crimes ambientais com repercussão na vida de mais de 60 mil pessoas.
Acordos criminosos aprofundaram dor das vítimas
O crime praticado pela Braskem veio a lume em março de 2018, quando parte de Maceió foi sacudida por um terremoto de 2.8 de magnitude. A natureza acusou a ganância da Braskem e trouxe à tona a rede de corrupção, compadrio e conivências que se manteve incólume durante quase 50 anos.
Os ministérios públicos Federal e Estadual, Defensoria Pública da União, o prefeito de Maceió, João Henrique Caldas (JHC) e a Justiça Federal contribuíram, de maneira decisiva, para ampliar os efeitos da tragédia que se abateu sobre 60 mil pessoas, no momento em que assinaram acordos com a Braskem, comprovadamente, autora de inúmeros crimes.
Esses acordos ferem, frontalmente, os interesses da cidade de Maceió, das vítimas diretas e da cidadania. Os atos jurídicos medonhos delegam poderes à Braskem para indenizar as pessoas da maneira que entender ser melhor para ela própria. Não foram levados em consideração, no caso dos imóveis, os parâmetros dos valores de mercado. Os danos morais foram aviltantes.
Resistência das vítimas evita o pior
Há uma sucessão de tragédias que continuam a vitimizar a população atingida do Pinheiro, Bebedouro, Bom Parto, Mutange, Farol e mais as localidades dos Flexais de Baixo e de Cima, das Quebradas, Vila Saem e Rua Marquês de Abrantes.
A tenacidade das vítimas, principalmente, das lideranças dos movimentos que se constituíram e se fortaleceram na adversidade é para ser destacada. São muitas lideranças que emergiram das ruas e dos bairros atingidos pela mineração criminosa da Braskem.
Os que ganharam maior visibilidade na mídia local e nacional têm desenvolvido um trabalho fundamental. Sem esses, talvez, não fosse possível enfrentar a Braskem, que é a maior máquina de moer gente que se conhece em Alagoas.
O papel dos acadêmicos da Ufal e de outras instituições de Alagoas e de universidades de outros estados brasileiros fazem deles mais do que pesquisadores e cientistas. Os transforma em militantes de uma causa humanitária.
A atuação do defensor público Ricardo Melro no caso Braskem também tem sido extraordinária, por ele cumprir a nobre função de servidor público que tem se empenhado na defesa de milhares de vítimas que foram abandonadas pelo Estado brasileiro e alagoano.
JHC deputado x JHC prefeito
O prefeito JHC, quando era deputado federal, chegou a se posicionar ao lado das vítimas, reunindo-se com as lideranças e garantindo que permaneceria na defesa da população. Nesse momento, era candidato a prefeito de Maceió. Eleito, o prefeito iniciou na surdina negociação com a Braskem e passou a não receber as vítimas dos crimes da petroquímica.
O resultado é que JHC colocou as suas digitais na cena do crime ao firmar os acordos com a Braskem para receber R$ 1,7 bilhão. Pelos cálculos dos atingidos, a prefeitura teria direito, no mínimo, a R$ 8 bilhões. Os interesses da cidade, ou seja, de quase 1 milhão de habitantes, foram rifados por interesses, no mínimo, nebulosos.
Até o momento, não se sabe como a compra de um hospital por um valor altamente questionado, beneficiar amigos comprando imóveis com valores astronômicos e propriedades falidas como o Ecoparque, e investimentos em mídia seriam algo benéfico para os maceioenses.
O ex-procurador de Justiça e hoje deputado federal, Alfredo Gaspar, é outro personagem que também assinou o acordou e entregou na bandeja as cabeças das vítimas para a Braskem. Ele tenta esconder o seu passado deletério apostando na falta de memória das milhares de vítimas e segue sem expressar remorso pelas dezenas de pessoas que cometeram suicídio. As pessoas esperavam, como determina a Constituição, que o Ministério Público defendesse a coletividade.
O deputado federal Alfredo Gaspar é um dos responsáveis pela tragédia do ponto de vista da subtração dos direitos dos atingidos em favor da Braskem.
Independentemente de qualquer coisa, do outro lado há pessoas que não estão dispostas a desistir. A luta pelos direitos das vitimas da Braskem vai prosseguir.