2 de abril de 2020 11:14 por Geraldo de Majella
Alberto Leão Maia (1949-2015), conhecido como Beto Leão, artista plástico, ator, diretor de arte, cineasta, compositor, cenógrafo, esse artista múltiplo nasceu em Quebrangulo – AL, no dia 4 de maio de 1949. Filho de Arani Tenório Maia e Maria Elizabete Leão Maia.
Iniciou os estudos na escola pública em sua cidade natal, e na adolescência inicia as leituras dos clássicos da literatura com o seu conterrâneo, Graciliano Ramos. A juventude em Maceió é o ponto inicial de sua participação nos movimentos culturais.
O temperamento agregador entrava em choque com o ambiente opressivo e de censura, resultando na constituição informal de um grupo de jovens artistas e intelectuais na Maceió do final da década de 1960 e início da década de 1970, que se reuniam em residências, na Praça Deodoro e no Teatro Deodoro para ler poesia, falar de cinema e teatro, compor músicas e participar dos festivais de poesias e canções organizados pelo Diretório Central dos Estudantes da Universidade Federal de Alagoas (UFAL).
Esses grupos onde Beto Leão pontificava eram constituídos por gente como José Geraldo Marques, Isaac Bezerra, Lúcia Guiomar Teixeira, Carlos Vasconcelos, Everaldo Moreira, Leureny Barros, José Márcio Passos, Ângela Uchoa, Alex Barbosa, Juarez Gomes de Barros, Ronaldo de Andrade, Maria Beatriz Sá Brandão, Homero Cavalcanti, Dario Bernardes, Maria Lídia Torres Bernardes e outros.
O epicentro da contracultura em Maceió foi a Praça Deodoro, o imponente Teatro Deodoro e o Teatro de Arena. Essa trupe, inicialmente liderada por Beto Leão, José Geraldo Marques e Lucia Guiomar, transpirava arte e irreverência como arma para enfrentar, à maneira deles, a opressão.
O encontro da trupe com a turma da Praça Deodoro, segundo me falou o poeta Marcos de Farias Costa, aconteceu naturalmente e, sobretudo, pelas afinidades intelectuais. Assim, dividiram o espaço físico e compartilharam ideias de contestação política, dos costumes e da censura; nutriam o gosto pelo cinema de arte, pela literatura e pela política em plena ditadura e na vigência do Ato Institucional nº 5 (AI-5).
A turma da Praça Deodoro, constituída por Gildo Marçal Brandão, Djalma Cahet, Marcelino Máximo Dantas da Silva, Henrique Rodrigues, Rui Sales Costa, César Rodrigues, Imanoel Caldas, Denis Bernardes, flertava com o marxismo quando os espaços políticos se fechavam. As discussões nos pequenos salões e nas sessões do Cine Arte passaram a ocupar boa parte do tempo desses jovens irrequietos e contestadores.
Os festivais de música, poesia e o Festival de Verão de Marechal Deodoro eram um dos fatores mobilizadores da energia de Beto Leão e dos demais jovens. A música, a poesia e as artes plásticas no final da década de 1960 impulsionaram a sua carreira.
A sua participação no cinema inicia-se profissionalmente ao ingressar na equipe do cineasta Cacá Diegues durante as filmagens de Joana Francesa (1971), quando contracena com Jeanne Moreau, “a diva do cinema francês”. Ainda trabalhou com Cacá Diegues no filme Xica da Silva (1976). Já com Nelson Pereira dos Santos trabalhou como cenógrafo em Tenda dos Milagres (1977) e A Ilha dos Escravos (2008), dirigido por Francisco Manso.
Na Rede Globo trabalhou na novela Lampião e Maria Bonita como ator, e na equipe de produção de Rabo de Saia e Renascer, bem como nas minisséries O Tempo e o Vento, Quarup e Os Homens que eu Tive.
Na extinta TV Manchete foi o diretor de arte das novelas Kananga do Japão, Amazonas e Helena. Em São Paulo, atuou no SBT, tendo realizado a cenografia das novelas Éramos Seis, As Pupilas do Senhor Reitor e Sangue do Meu Sangue.
A sua obra cinematográfica é pequena; são três filmes curta metragem em vídeo: Um Baile no Paraiso (2002), A Casa dos Santos Alagoanos (2002) e Jayme Miranda, Vida e Luta (2006).
A ideia do documentário enfocando aspectos da vida do jornalista e dirigente comunista Jayme Miranda, fui eu quem sugeri a Beto Leão. A minha participação foi com a pesquisa histórica e o pré-roteiro, a finalização foi realizada pelo cineasta Pedro Rocha.
Entre outros trabalhos no teatro, o último, salvo engano, foi como diretor, cenógrafo, figurinista, iluminador e criador da trilha sonora do espetáculo Graciliano, um Brasileiro (2004), com Paulo Poeta e Chico de Assis, apresentado em Alagoas e em outros estados do Nordeste, e no Rio de Janeiro, no programa Alagoas de Corpo e Alma.
Em 1979, na Galeria Alternativa, em Maceió, ocorre a sua primeira individual, com curadoria de Juarez Gomes de Barros. Só volta realizar outra individual em 2014, intitulada Ofícios, na Galeria Fernando Lopes, no Centro Universitário Cesmac, com curadoria de Carol Gusmão e participação da professora e poeta Vera Romariz. A exposição foi uma retrospectiva da produção artística de Beto Leão, compreendendo o período de 1970 a 2014.
Nesse evento também ocorreu a noite de autógrafos do livro Inversão de Orfeu, escrito nos anos setenta, organizado pelo professor Antônio José Rodrigues Xavier e editado pela Uneal em parceria com o Cesmac.
A capacidade de criação e de realização transformou-o num artista múltiplo. Em 1971, em companhia de Solange Chalita Lages, realiza um dos mais ousados eventos daquela época, o Festival de Verão de Marechal Deodoro. A temática girava em torno da música, poesia e artes plásticas.
Após o festival de verão muda-se para o Rio de Janeiro, onde passa a morar e de onde se projeta nacionalmente. O seu regresso a Alagoas acontece décadas depois, quando é convidado e assume o cargo de secretário da Cultura de Alagoas, no governo Ronaldo Lessa, função que exerce por dois anos (1999 a 2000).
Beto Leão foi um artista múltiplo, um dos mais brilhante de sua geração. Numa das suas músicas disse, referindo-se a Maceió:
“(…) Mas eu vou voltar pra passear no mar”.
Beto Leão faleceu, em Maceió, no dia 08 de outubro de 2015.
Bom passeio, Beto.
2 Comentários
Conheci pessoalmente Beto Leão, um artista polimorfo, a imagem de um Proteu vivo, incansavelmente criando e produzindo. Uma noite em sua casa, com Djalma Canet Bola Sete e Marcelino Máximo ele nos mostrou os originais de Invenção de Orfeu. Eu tava bêbedo mas compreendi o valor do poeta rimbaldiano. Ele gostou muito de um texto que fiz sobre poetas alagoanos antigos e novíssimos e ele me considerava muito encrenqueiro. Ria disso. Fizemos uma parceria que muito me honra: Ele bolou a capa de meu livro “Ocios do Oficio”. Era um homem de capacidade criadora inesgotável. Encerrando, ele era primo legítimo de minha esposa Sônia Maria Leão.
Quando faleceu, em 2015, BETO LEÃO já há muito merecia — e ainda merece! — uma biografia em livro. Mas quem na “Maceió medúsica” da velha Alagoas de sempre se atreverá à escrevê-la? (Perguntar não ofende)