sexta-feira 22 de novembro de 2024

BEATOS/BEATAS/MESSIAS EM ALAGOAS NA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XIX À PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XX (2)

10 de julho de 2020 8:46 por Redação

  •  Os Beatos e o Mito Sebastianista em Alagoas

Maria Isaura Pereira Queiroz (2003, p. 220) menciona que “Silvestre José dos Santos, cognominado o Profeta, ex-soldado do Décimo Segundo Batalhão de Milícias”, fez peregrinações, por volta do ano de 1817, na localidade alagoana de Lage do Canhoto (hoje município de São José da Lage). E, depois de juntar muitos seguidores, foi expulso pelas autoridades, saindo daquela região para o monte Rodeador, no Estado de Pernambuco. Ali formou uma cidade encantada – a “cidade do Paraíso Celeste” – “onde tudo era perfeito e onde gozavam de imortalidade; e, se atacados, D. Sebastião os tornaria invisíveis”.

 

Foto 1 : Silvestre José dos Santos (Fonte www.google.com)

 

Este é o único movimento, no território alagoano, com características do sebastianismo ou do “encoberto”. Mas, em Alagoas, não apenas nasceram como suas terras foram percorridas por outros beatos que deram origem a comunidades; embora mais frequente em Alagoas, o fato ocorreu em outros estados. Um exemplo é o Beato José Lourenço, alagoano, que diziam ser a reencarnação do Padre Cícero Romão Batista e viveu na comunidade por ele fundada em Caldeirão – CE, entre as décadas de 20 a 40 do século passado.

Foto 2: José Lourenço
(Fonte: www.google.com)

 

Mauro Mota (1958, citado por Queiroz, 2003, p. 283) afirma que, “…ainda em Alagoas demonstrara José Lourenço pendores místicos, ingressando num grupo de penitentes”.

Não só beatos surgiram nesse universo de catolicismo místico; também tem-se notícia de mulheres, como, por exemplo, a Beata Maria,  sexagenária de estatura mediana, cor morena; usava roupas de tecido grosseiro escuro, uma espécie de hábito ou batina, com um cordão branco amarrado à cintura. Conduzia um terço ou rosário de contas grandes, pretas,  e calçava chinelos tipo franciscano. A Beata Maria instalou-se na Igreja do Rosário (Rua João Pessoa – Maceió-AL), residindo em um pequeno compartimento dos fundos da Igreja. Tomou para si o encargo de limpar os altares, lavar as toalhas, varrer, espanar os móveis e cuidar ainda de um pequeno jardim. Maria tinha dificuldade de locomoção e enxergava pouco nos seus últimos anos. Dizia ser das almas, mas, o sacristão Manoel não acreditava na estória da idosa, pois ela era sócia das almas e as espórtulas arrecadadas na igreja, que ficavam, na maioria, em seu poder, muitas vezes foram roubadas por malandros. O padre Luiz Barbosa, capelão daquela Igreja, vendo a situação da senhora, alugou uma casa próxima à Praça Floriano Peixoto e para lá a transferiu. Dois anos depois da mudança para a nova residência, a Beata Maria faleceu. O capelão fez o enterro, sepultando-a no cemitério de Nossa Senhora da Piedade. Seu túmulo é local de visitas e romarias até hoje (LIMA JÚNIOR, 1967).

Nos fins da década de 40 e início da década de 50 do século passado surgiu, no Rio de Janeiro, precisamente na Avenida Getúlio Vargas, um líder religioso que atendia pelo nome de Yokaanam. Lá, ele instalou a sede de sua seita, com o nome de Fraternidade Eclética Espiritualista Universal. Seu nome era Oceano de Araújo Sá, antigo piloto da Condor e Lufthansa, nascido em Alagoas.

Ainda podemos citar Pedro Batista da Silva, que se estabeleceu em Santa Brígida, povoado de Jeremoabo, na Bahia, onde seu movimento ficou conhecido como o “povo do velho Pedro”. A ele se refere Queiroz (2003, p. 295):

Em 1942, surge também no interior de Alagoas, um penitente de barba e cabelos grisalhos, pregando e curando; chamava-se Pedro Batista da Silva. Afirmava-se que era natural de Alagoas mesmo, mas que vivera muito tempo no sul do país, tendo sido marinheiro, estivador, soldado do exército. Visões lhe indicaram certo dia que devia regressar à terra natal, onde tinha uma missão a cumprir.

 

(Foto 3: Pedro Batista)
(Fonte: www.google.com)

 

Logo após a morte do Padre Cícero Romão Batista, que durante muitos anos atraiu para Juazeiro do Norte – CE verdadeiras multidões de romeiros de todos os estados do Norte e Nordeste, surgiu o “Franciscano”, em Alagoas. Seu nome era Antônio Fernandes Amorim, o “Beato Franciscano”; ele apareceu em 1936, na Serra de Bom Jesus, povoado de Belo Monte, hoje Batalha – AL. Envergava um hábito negro, com um enorme rosário pendurado no pescoço, na mão direita um crucifixo e anunciava, aos quatro cantos, que “…era chegada a hora da penitência”. Como a sua aparição nos sertões de Alagoas ocorreu logo após a morte do padre Cícero Romão Batista, rapidamente apareceram comparações com o patriarca do Juazeiro.

Quando o ‘Franciscano’ apareceu, pregando pelas estradas, o povo se convenceu de que ele era realmente o sucessor do padre Cícero. Suas palavras, seus gestos e seus olhos penetrantes conseguiram impressionar o bastante para que em pouco tempo, uma multidão o seguisse pelas estradas (DANTAS, 1954, p. 2). 

 

(Foto 4: Franciscano) (Fonte: Audálio Dantas)

Com o clero e a polícia intervindo sempre, foi gerada uma situação de insegurança, levando a que ele mesmo confessasse ao repórter da Folha da Tarde: “Minha vida está muito incerta, não sabe?”. (DANTAS, 1954, p.1). Naquele mesmo ano, como acontecera em eleições passadas, muita gente procurou Serra Grande para obter o apoio político do Beato Franciscano para as eleições de 3 de outubro de 1954.  Dantas escreveu:

O ‘Coronel’ Ari Maia, senhor de muitas terras, também bateu às portas do beato para solicitar apoio à candidatura de seu irmão, Reni, candidato a deputado pelo Estado de Alagoas. Acontece que ele apoiava um outro candidato, Humberto Mendes, e vinha aconselhando o povo a votar em seu nome. Ari Maia saiu de Serra Grande desiludido (1954, p. 1). 

 

A situação perdurou até 30 de julho de 1954, quando aconteceu uma tragédia, como descreveu Valois: “À noite de sexta-feira passada, registrou-se, na Vila Franciscana, situada no município de Quebrangulo, um bárbaro crime, sendo vítima o Sr. Antônio Fernandes de Amorim, conhecido por todos como ‘Beato Franciscano’.” (1954, p.5).  

E continua o autor:

Propala-se que o assassínio, praticado de uma maneira brutal e desumana, foi de origem política […] O Franciscano encontrava-se retirando uma lâmpada elétrica de um poste, quando foi alvejado pelas balas assassinas. Preparava a vila para a recepção de romeiros de vários pontos diferentes do estado que ali deveriam se encontrar para participar das comemorações do seu aniversário (VALOIS, 1954, p.5).

 

Referencias:

DANTAS, Audálio. Morreu o último santo do Nordeste. Folha da Tarde, São Paulo, 8 out. 1954. 

LIMA JÚNIOR, Félix. A última Beata. Gazeta de Alagoas, Maceió, 12 jun. 1967. Suplemento literário, p. 2.

QUEIROZ, Maria Isaura P. O messianismo no Brasil e no mundo. São Paulo: Alfa Omega, 2003.

VALOIS, Francisco. Bárbaro crime no interior de Alagoas. Assassinado o “Beato Franciscano”, figura popular no município de Paulo Jacinto – Providências para captura dos criminosos. Diário de Pernambuco, Recife,  7 ago.1954. p. 5.

 

Todas as postagens são de inteira responsabilidade do blogueiro.

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2 Comentários

  • Gilvan, obrigado de coração por dividir as histórias dos Beatos. É lamentável a morte do Beato Franciscano e mais lamentável que o estado de Alagoas, como em muitos estados do Brasil, a matança continua. Será que um dia teremos paz? Que Deus abra os corações daqueles que querem fazer o mal e que possamos de uma vez por todas termos a paz tão sonhada.

  • Histórias que eu gosto de ouvir.
    É impressionante como pessoas que pregam a paz são alvo de tanto ódio. Lembrei agora de Nô Pedrosa, anarquista, que não era beato, mas nunca pregou o ódio.

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