sexta-feira 22 de novembro de 2024

SANEAMENTO BÁSICO

10 de julho de 2020 8:16 por Redação

Vergel do Lago
Saneamento básico – conceito

Para se “criar ambientes saudáveis que apoiem o bem-estar humano”, como preconizava o Conselho Nacional de Saúde com vistas à construção da Política Nacional de Saúde Ambiental [i]), antes de tudo é preciso falar em saneamento básico. Mas não basta só falar. Certamente é preciso tornar isso uma política de Estado. Enquanto isso, eu tenho percebido que o conceito de saneamento básico é, às vezes, interpretado erroneamente. Muitos acreditam que diz respeito apenas ao esgotamento sanitário. No entanto, o Saneamento Básico é bem mais abrangente.

Em uma consulta ao site SNIS – unidade vinculada à Secretaria Nacional de Saneamento do Ministério do Desenvolvimento Regional, é possível ver dados sobre a prestação de serviços em áreas urbanas, dos quatro componentes do saneamento básico. Primeiro, o Abastecimento de Água inclui captação, tratamento e distribuição da água potável. Depois, o Esgotamento sanitário – coleta, tratamento e lançamento em corpos receptores após tratados. Paralelamente, a Limpeza urbana e Manejo dos Resíduos sólidos – coleta, transporte e tratamento ou disposição de maneira ambientalmente adequada. E, por fim, mas não menos importante, tem a Drenagem e Manejo de Águas pluviais.

Doenças de veiculação hídrica

O Portal Saneamento Básico[ii] trouxe informações que dão conta de que entre janeiro e fevereiro deste ano, somente no Estado do Paraná houve 5,1 mil internações em leitos do SUS devido a doenças provocadas por falta de saneamento básico.

E essa falta está ligada aos crescentes casos de doenças a que estamos familiarizados com os nomes,  mesmo não sendo profissionais da área de saúde. Por exemplo: dengue, esquistossomose, cólera, febre tifoide, hepatite infecciosa, diarreias por infecções intestinais bacterianas, doenças intestinais provocadas por protozoários (como ameba e giárdia), malária, entre outras.

Isso quer dizer que a falta de abastecimento de água potável e de esgotamento sanitário tem levado à ocupação de leitos que poderiam estar liberados para as vítimas de outras doenças, principalmente da Covid-19.

Lembrando que os dados citados  são de um estado da federação que tem “100% da população urbana abastecida com água potável e 74,2% dos moradores têm acesso à rede coletora de esgoto, bem acima da média nacional de 53,2%”.

Dados atuais

Enquanto isso, o Instituto Trata Brasil[iii]  analisou os dados mais recentes (2018) das 100 maiores cidades do país, apresentando o “Ranking do Saneamento Básico 2020”.

Na análise, constatou-se que “16,38% da população brasileira não têm acesso ao abastecimento de água, o que representa quase 35 milhões de pessoas – 3x a população de Portugal; 46,85% não dispõem da cobertura da coleta de esgoto, chegando a mais de 100 milhões de pessoas sem esses serviços básicos – mais de 2x a população da Argentina. Além de tudo isso, o volume de esgoto no Brasil ainda é abaixo do ideal, somente 46% do volume gerado de esgoto no país é tratado”. Em outras palavras, “o Brasil despejou na natureza 5.715 piscinas olímpicas de esgoto sem tratamento por dia e 2 milhões por ano”.

Por outro lado, em Maceió, os dados de 2018 mostram que 87,1% da população recebem água tratada enquanto apenas 42,2% são beneficiadas com a coleta de esgotos. Como resultado, imóveis residenciais e empresas que não estão ligados às redes coletoras de esgotos lhes dão destinos nada recomendáveis. Assim, vemos esgotos lançados na rua, em riachos, na lagoa ou em fossas rudimentares. Há ainda os que desviam para galerias pluviais que subsequentemente vão despejar os efluentes em corpos hídricos. Basta uma caminhada pela praia da Pajuçara em um dia sem chuva para encontrarmos esgotos sempre escorrendo, vindos de imóveis situados nas imediações.

Águas “pluviais” – Praia de Pajuçara
Serviços Públicos

Análise feita pelo Portal Saneamento Básico, em plena pandemia, constata: “Os serviços públicos, necessários para mais de 75% da população, são precários. O sistema de saúde é insuficiente e começa a entrar em colapso em alguns estados. A falta de saneamento básico, uma agenda do século 19, ainda assola o país e 35 milhões de pessoas não têm acesso à água. A informalidade é brutal, com mais de 38 milhões de brasileiros invisíveis ao Estado. E as moradias são indignas para grande parte da população, que não consegue nem manter a higiene básica, muito menos cumprir os protocolos que reduzem o risco de contaminação. A pandemia desnudou as mazelas do Brasil”.

Indicadores educacionais são influenciados pelo saneamento básico

Entretanto, não são somente dados epidemiológicos que estão relacionadas à ausência de saneamento básico. Os pesquisadores Juliana Scriptore, Carlos Azzoni e Naércio Menezes Filho analisaram a relação entre Saneamento básico e indicadores educacionais no Brasil (iv).  Como resultado, destacaram que “o impacto direto da falta de saneamento sobre a saúde pública é preocupante, pois incide de forma mais significativa sobre as crianças, os organismos mais frágeis e suscetíveis à contração de doenças relacionadas ao saneamento ambiental inadequado”.

Assim, os resultados da pesquisa mostraram que “há efeito positivo e significativo de saneamento sobre indicadores educacionais” tais como aumento percentual na frequência escolar e redução na taxa de evasão no ensino fundamental, além da redução na taxa de distorção idade-série da parcela da população que reside em domicílios providos de banheiro e água encanada. E afirmam que, embora os dados epidemiológicos sejam preocupantes, “uma vez que destrói capital humano”, subestimam-se “os efeitos socioeconômicos de longo prazo para o país”. Eles também destacaram os prejuízos sobre “a função cognitiva” dos alunos, “juntamente com a capacidade de atenção e concentração”. Por consequência, os problemas decorrentes da ausência do saneamento básico adequado afetam “o rendimento escolar e dificultam o aprendizado”.

Agenda 21
Vila Brejal

No entanto, há 28 anos, desde a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento – que ficou conhecida como Eco-92 -, surgiu a Agenda 21. Este é um documento que serve de guia para a sociedade na “construção de um programa de ação estratégico dirigido às questões prioritárias para o desenvolvimento sustentável”. Ele é composto de 40 capítulos e vários desses devem ser especialmente considerados quando falamos de Saneamento Básico.

Assim, o Cap. 4, que trata de “Mudanças dos padrões de consumo”, nos leva a refletir sobre a (in)sustentabilidade crescente dos padrões de consumo e geração do lixo que é descartado na natureza. Já no Cap. 6, que orienta sobre a “Proteção e promoção das condições da saúde humana”, há a chance de correlacionar dados epidemiológicos com a poluição crescente. Esse, por sua vez, nos leva à necessidade de dar atenção ao Cap. 7 – “Promoção do desenvolvimento sustentável dos assentamentos humanos”.  Aqui é onde devemos nos voltar para as condições de moradia e de trabalho. O Cap. 18 trata da “Proteção da qualidade e do abastecimento dos recursos hídricos: aplicação e critérios integrados no desenvolvimento, manejo e uso dos resíduos hídricos”. Por fim, o Cap. 21 trata do “Manejo ambientalmente saudável dos resíduos sólidos e questões relacionadas com os esgotos”.

Providências urgentes
Arapiraca Foto do Portal G1, de 09/12/2018

Em conclusão, é preciso dar prioridade ao Saneamento Básico se quisermos cuidar com responsabilidade dos habitantes deste país e não ficarmos apenas na retórica dos discursos vazios de campanhas eleitoreiras.  Assim, não podemos aguardar para 2022, como quer o governo federal, para cobrarmos dos municípios seus planos de saneamento básico.

E, como afirmou o médico sanitarista Sérgio Arouca, “O SUS tem de, em primeiro lugar, perguntar o que está acontecendo no cotidiano das vidas das pessoas e como eu posso interferir para torná-las mais saudáveis”. A pandemia tem evidenciado, mais do que nunca, as gritantes desigualdades sociais neste País e, particularmente, em Alagoas.

[i] BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE. Subsídios para construção da Política Nacional de Saúde ambiental. Brasília: Ed. do Ministério da Saúde, 2007. 56p.

[ii] Portal Saneamento Básico: https://www.saneamentobasico.com.br/. Acesso em: 11 maio 2020.

[iii] Instituto Trata Brasil. http://www.tratabrasil.org.br/blog/2020/03/12/instituto-trata-brasil-lanca-mais-um-ranking-do-saneamento-basico/. Acesso em: 10 maio 2020.

[iv]Scriptore, Juliana Souza; Azzoni, Carlos Roberto; Menezes Filho, Naércio Aquino.  Saneamento básico e indicadores educacionais no Brasil.  Working Paper Series, n. 2015-28, Dep. of Economics – FEA/USP, s/d.

Todas as postagens são de inteira responsabilidade do blogueiro.

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4 Comentários

  • Excelente! É preciso mostrar e mostrar essa realidade. Burguesia hipócrita! Veja!

    • Mostrar e cobrar. Temos que encontrar formas de ouvir as vozes da parcela abandonada da população. Grata pela leitura e feedback.

  • Excelente texto. Mostra a realidade nua e crua das questões ambientais no Brasil e como o poder público ignora tais questões. Por isso, a sociedade como um todo tem que se conscientizar quando for depositar seu voto mas urnas. Pensem nisso antes de votarem.

    • Esta é a nossa luta, meu amigo. Se esta parcela abandonada da população enxergasse a força que tem, o voto seria diferente. O voto é a arma. E a fiscalização do que é feito entre eleições.

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