12 de novembro de 2021 3:31 por Mácleim Carneiro
Estava eu vasculhando meus arquivos, quando descobri anotações que havia feito para um pretenso artigo, sobre um debate que assisti em 1999, no Rio de Janeiro, promovido pelo jornal O Globo, dentro da série “Encontros O Globo”. Já que o tema ainda faz sentido, resolvi tirar a poeira das minhas lembranças e abrir o velho baú. Farei isso em duas partes, para não virar textão, como diz a moçada avessa à leitura.
Lembro-me que, ao observar a plateia, me veio à lembrança dos cristãos da era romana. Certamente, em algum momento, eu tenha achado ingenuamente que, por se tratar de um debate cujo tema era “música, a hora da renovação”, estaria então armado o clima ideal para aglutinar nomes de peso da MPB, que prestigiariam e debateriam os assuntos relevantes à classe. Lêdo Ivo engano! Por que eles iriam descer do pedestal e ter uma atitude coletiva? Assim, a plateia, na sua grande maioria, era composta por artistas que estão à margem do mercado, segregados como os cristãos das catacumbas. Não deu outra: confirmei a teoria do espermatozoide. Mas, este é um assunto que rende outro caldo.
Mesa Nada Redonda
Como sempre acontece em debates organizados por entidades alheias ao assunto a ser debatido, a composição da mesa foi estratégica. De um lado, os guerrilheiros (acho que posso usar essa figura de linguagem), representados pelos músicos Muri Costa e Mauro Senize. Do outro, a indústria fonográfica multinacional, na figura do também músico e, à época, diretor artístico da EMI, Torquato Mariano. Aliás, acho que ele foi ao debate só porque ainda tinha a alma de músico. Porém, ao vestir a camisa da companhia, ele ficou sob um enorme telhado de vidro e, claro, foi o alvo perfeito para se atirar não só a primeira, mas todas as outras pedras, naquela noite. Também fazia parte da mesa o produtor, DJ e bobo falante, Memê. Com certeza, ele estava lá credenciado pelo sucesso numérico que conseguiu produzindo discos de artistas como Lulu Santos e Claudinho e Bochecha. Para completar a mesa, nada redonda, os jornalistas Maurício Valadares e Carlos Albuquerque, que, convocados para defender a visão de certo segmento da imprensa, acabaram funcionando como contrapesos centralizadores. Claro que não faltou o performático do debate, o cara que atira para todos os lados, capaz de provocar os momentos mais engraçados. Para esse papel, o compositor pernambucano Otto foi o protótipo perfeito.
Vários foram os temas abordados, cada um merecedor de reflexões mais aprofundadas e soluções específicas. Falou-se sobre as dificuldades de acesso dos novos artistas à mídia e às grandes gravadoras. Falou-se, também, sobre a programação das emissoras de rádio, Tvs e seus respectivos jabás. Foi abordada a questão dos selos independentes e as novas tecnologias, que mudaram o antigo conceito de comercialização da música, tipo: Internet e o MP3.
Famigerado Jabá
Na verdade, tudo o que foi discutido nós já estávamos cansados de saber. Infelizmente, os debates acabam sempre ficando nesse chove e não molha, quando deveriam trazer soluções, perspectivas e sugestões viáveis para os problemas debatidos. Algumas questões, entretanto, ficaram bem claras. Uma delas foi o famigerado jabá! Para quem não é do ramo, jabá é o que as gravadoras (e agora qualquer artista que quiser ter sua música executada nas rádios comerciais) pagam aos programadores e diretores das rádios, para tocarem insistentemente o lixo que eles determinam que você deve ouvir. Memê, que já foi radialista, abriu o jogo e confirmou: “Existe sim o jabá! Hoje está institucionalizado em algumas rádios, que são líderes em audiência”. Será que aqui em Alagoas acontece o mesmo? Particularmente, eu estava pensando em fazer o caminho de Santiago de Compostela, para descobrir a verdade. Todo mundo que vai, diz que descobre. Porém, depois daquele debate, não preciso mais. Heureca! O jabá existe!
No +, MÚSICABOAEMSUAVIDA!!!