31 de dezembro de 2021 11:44 por Mácleim Carneiro
É claro que sabemos ser uma mera questão de convenção, aferição, divisão, ou o que quer que signifique essa equação elaborada para contar de modo racional os segundos, minutos, horas, dias, semanas, meses e anos. O fato é que me parece ser um tanto metafísica (não no sentido do princípio do ser, mas do princípio do tempo) essa adequação sensorial, ao que chamamos de ano velho e ano novo. Provavelmente, isso sempre irá existir e vem se repetindo desde que, nas diversas culturas, os respectivos calendários foram inventados.
Para tal propósito estipulador e demarcatório, é que se justificam os mesmos, pois a simples observação dos fenômenos relativos ao nosso sistema solar estabelece o que seria uma continuidade infinita, pela repetição sistemática dos ciclos. Sendo assim, na existência de tal enquadramento, por longo tempo, folhinhas ainda terão o poder de determinar, cronologicamente, nossa existência neste plano. Não da para fazer de conta que tal fato não influencia o comportamento de pessoas como eu que, embora já tenha tentado abster-me de tal espectro, até agora, ainda não fui capaz de ignorá-lo totalmente. Aliás, sob determinado ponto de vista, para que ignorá-lo?
Pensando bem, se eu resolvesse ignorar o que determina o calendário convencional e minha percepção do tempo fosse intrinsecamente singular, e não mais plural, não faria sentido algum esta proposta de fazer uma retrospectiva do não acontecido. Acho que, ao contrário do que todo mundo faz e do que muita gente pensa, uma retrospectiva do não-acontecido pode ser tão rica e farta em conteúdo quanto aquelas que comumente fazem as revistas e TVs, no final de cada ano. Além disso, uma retrospectiva do que não aconteceu sugere o que poderia ter acontecido e, mais do que isso: o que poderá acontecer. Mesmo admitindo-se que o futuro pode não mais existir a qualquer momento. Mesmo assim, planos e metas são ferramentas necessárias ao presente!
Causa e Efeito
É óbvio que, independente da mudança de algarismos no calendário, as coisas continuarão a não acontecer e vice e versa. Uma sempre estará em função da outra, como causa e efeito! Assim, a retrospectiva do não acontecido, embora nada tenha acontecido, terá no que lhe precedeu o fato gerador do que não aconteceu. Ou seja: ela também será feita de fatos, pois o não acontecido, por si só, também se torna um fato. Cavoucar o que não aconteceu é tão significativo (e às vezes doloroso) quanto vasculhar a memória das coisas concretas.
Quando o prometido não foi realizado, agrega o desconforto e a frustração (pessoal ou coletiva) do objetivo não concretizado. Exibe a mentira em suas diversas proporções; aponta a negligência e, sobretudo, fragmenta a confiança em pedacinhos difíceis de colar. No entanto, apesar de tudo, o não acontecido traz, na maioria das vezes, a magia da possibilidade, que a esperança estabelece, embora eu não ouse discordar de Nietzsche, quando ousou dizer que a esperança é o maior dos males!
A verdade é que o tempo escapa e já não sobra espaço para minha pretensa retrospectiva. Para que não paire nenhuma dúvida sobre esta verdade, valho-me, mais uma vez, do que escreveu Nietzsche e que me parece extremamente pertinente, ao observar que a verdade é um erro sem o qual não conseguimos viver, e os inimigos da verdade não são as mentiras, mas as convicções!
Espero, assim, ter sido capaz de esclarecer a minha surpresa diante da impossibilidade de cumprir o que eu vinha prometendo ao longo deste escrito. Pois bem, foram tantas as minhas convicções que, ao final, conseguiram apenas justificar o título lá em cima e transformar esta retrospectiva em algo, literalmente, não acontecido. Por via das dúvidas, um ano novo maravilhoso para você, onde não seja mais preciso gritar FORA BOLSONARO!!
No +, MÚSICABOAEMSUAVIDA!!!