sábado 23 de novembro de 2024

Poeta em extinção

Sua lavra lhe contradiz e o desafia à razão, posto que, na primeira parte do livro, como relata o poeta, sua “fúria exterminadora” não foi capaz de nos punir com a possível ausência do poema ‘Perdas’:

21 de março de 2023 2:15 por Mácleim Carneiro

 

 

Poeta Sidney Wanderley.

Recentemente, recebi do poeta Sydney Wanderley uma mensagem, via WhatsApp (todas as mensagens dele são de voz, o poeta não é de gastar palavras escritas), onde ele dizia que estava nos Correios da Fernandes Lima enviando-me um exemplar do seu recém lançado livro, ‘Antes do Fim’. A partir desse comunicado, do bardo de Viçosa, a possibilidade da chegada do seu mais novo rebento começou a provocar uma ode de lembranças poéticas e nostálgicas, de um tempo onde era normal esperar correspondências, desejadas ou inesperadas. Veio-me logo à mente o samba-canção ‘Mensagem’, dos compositores Aldo Cabral e Cicero Nunes, lançada em 1946 por Isaurinha Garcia. Não muito diferente do que diz a canção, “Quanta verdade tristonha ou mentira risonha uma carta nos traz…”, encontro paralelos ao propósito do poeta, com o lançamento do ‘Antes do Fim’.

 

Se realmente o poeta estiver convicto do que fala, ao afirmar: “De alguns anos para cá, venho observando uma dificuldade cada vez maior para que a poesia nos bafeje. As metáforas estão me visitando cada vez com mais avareza e má vontade”, então, teremos nessa fala uma “verdade tristonha”, sobretudo, para alguém como eu, fã declarado da produção poética e literária de Sydney Wanderley. No entanto, logo na introdução do livro, Poeta Bissexto, encontraremos uma “mentira risonha”. Sydney Wanderley cita o noturno, desengonçado e pesado papagaio kakapo, que “não só esqueceu como se voa, mas igualmente não se lembra de que esqueceu como se voa.” Ao se comparar ao papagaio neozelandês, o poeta renega a persuasão, ao passo em que chega ao paroxismo das metáforas:

“Sou, hoje, esse desengonçado kakapo no reino mineral da poesia.”

 

Seguramente, sua lavra lhe contradiz e o desafia à razão, posto que, na primeira parte do livro, como relata o poeta, sua “fúria exterminadora” não foi capaz de nos punir com a possível ausência do poema ‘Perdas’:

 

Por uma maçã – reza a lenda –
perdemos em remoto dia o Paraíso.
Por outra maçã – reza outra lenda –
aprendemos com Newton a gravidade.
Entre maçãs e lenda agonizamos,
órfãos do Éden e da eternidade.

 

Existe um detalhe, sobretudo nos livros de poesia, que me é caro! Entendo que o fazer poético, em sua manifestação de beleza estética, deve começar pela capa do livro, pelo seu invólucro, num processo levitatorio ao fruidor, abrindo a senda para tudo aquilo que comove, sensibiliza e desperta sentimentos. Nesse sentido, o projeto gráfico do Fernando Rizzotto cumpre essa missão maravilhosamente azulado, onde menos é mais, por dentro e por fora, nos detalhes de puro bom gosto e delicadeza, revelando o simbolismo do irrefutável encantamento existente entre a lagarta e o seu porvir.

 

Dito isso, a poesia de Sydney Wanderley não carece de nenhuma tradução e muito menos de academicismos e suas ideias e atitudes especulativas, sem efeito prático. Carece menos ainda de pitaqueiros como eu! Ou seja, a poesia de Sydney Wanderley nos basta por si e se basta em si mesma! Que me perdoe o poeta, mas, custa-me crer no significado implícito ao título Antes do Fim, embora eu saiba que o papagaio kakapo, ou caçapo, como queiram, é uma ave em perigo crítico de extinção e poetas da grandeza de Sydney Wanderley, também.

 

No +, MÚSICABOAEMSUAVIDA!!!

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2 Comentários

  • Parabéns pelo texto. Não li o livro mas certamente vale a pena de ser apreciado. É do querido Sidney.

    • Olá, Ronaldo!
      Obrigado pela gentileza do seu comentário.
      Sim, eu diria que vale mesmo a pena lê-lo.
      Grande abraço e no +, MÚSICABOAEMSUAVIDA!????????????

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