quinta-feira 21 de novembro de 2024

1979, o ano feminino

É um livro de peso histórico bem mais significativo do que o seu peso em gramas, 790g, além de ser uma ferramenta imprescindível.

25 de setembro de 2023 6:18 por Mácleim Carneiro

 

Quero pedir licença aos 14 leitores da Depois do Play, para sair um tantinho do combinado, pois, ao invés de resenhar um único álbum, como de costume, trago para conhecimento uma resenha sobre cem outras resenhas, que foram escritas por cem outros autores e estão compiladas em um único volume, cujo título é bem específico: ‘1979 – O Ano Que Ressignificou a MPB’. Dito isso, não há como tecer comentários sobre este livro, sem ater-se ao ano que serve de moldura e foco ao objeto primordial desse tomo: a música popular brasileira, revisitada por uma centena de autores em resenhas que analisam e revelam curiosidades de alguns dos mais significativos álbuns lançados à época.

Portanto, 1979 foi um ano repleto de acontecimentos e movimentos políticos, sociais e musicais, que marcaram o tabuleiro instigante daquele Brasil. Ainda sob os auspícios da ditadura militar, foi em 1979 que tomou posse o general João Batista Figueredo, finalmente, como o último presidente oriundo de um regime ditatorial e antidemocrático. Sim, ainda era um tempo tenebroso e cheio de resquícios do nefasto período de opressão e medo, que se apoderou do Brasil por mais de duas décadas. Porém, já se respirava uma leve brisa dos ares democráticos, o que proporcionou, por exemplo, a criação da Associação Nacional de Jornais, para salvaguardar a liberdade de imprensa. Foi em 1979 que Eunice Michiles tornou-se a primeira mulher a ocupar uma cadeira no Senado Federal e, em agosto do mesmo ano, foi sancionada a Lei da Anistia.

Obra Instigante

Do ponto de vista musical, 1979 é considerado um ano feminino e feminista, como deixa bem claro o jornalista Célio Albuquerque no amplo e explicativo prefácio, dividido em quatro partes e assinado a quatro mãos: Célio Albuquerque, Washington Santos, Mona Gadelha e Ricardo Soares. Aliás, Célio Albuquerque é o que eu chamaria de um abnegado e competente arquiteto literário, aquele que, a partir do terreno propício, elaborou o projeto, organizou todas as fases e delegou a construção, no caso específico, a uma gama de sensíveis e competentes autores, que traçaram o perfil da música brasileira de uma época, pelo prisma de cem discos lançados sob circunstâncias sociais, políticas e artísticas, que foram determinantes e até, em alguns casos, manipuladoras.

Essa obra é instigante da primeira à última página! E olhe que estou me referindo às 574 delas. É um livro de peso histórico bem mais significativo do que o seu peso em gramas, 790g, além de ser uma ferramenta imprescindível a quem quiser aprofundar o conhecimento sobre a música popular brasileira daquela época, posto que ‘1979 – O Ano Que Ressignificou a MPB’ traça um belo e pitoresco painel “sonoro” e até iconográfico, sobre a música brasileira e seus atores, de norte a sul desse país que ainda pode e tem musicalidade suficiente para voltar a ser levado a sério, como outrora. Até porque, como já disse Paulo César Pinheiro, “o destino das canções não está em nossas mãos. Elas são o que elas quiserem ser.”

Paroxismos

São tantos os fatos pitorescos e curiosos, e tantos os músicos e artistas que escreveram super bem, como, por exemplo, Itamar Assiere, Joyce Moreno, Luís Carlos Sá, Marcos Sabino, Miltinho (MPB4), Moacyr luz, Mona Gadelha, Rildo Hora, Túlio Mourão, que fica a dica, antes de manusear o livro: exercite as mãos, faça um alongamento, como quem vai tocar um instrumento, pois, certamente, você será cognitivamente e emocionalmente envolvido e nem se aperceberá do quanto suas mãos serão exigidas, pela capacidade física de ampará-lo. Aconselho, também, o uso de uma bela rede com varanda, para ter “o arrebatamento garantido ou sua insensibilidade de volta”, como escreveu o jornalista e pesquisador musical Marcelo Pinheiro, na resenha sobre o álbum ‘20 Palavras ao Redor do Sol’, da paraibana Cátia de França.

É possível encontrar até alguns paroxismos, como o escrito do historiador Luiz Américo Lisboa, ao resenhar o álbum ‘Na Quadrada Das Águas Perdidas’, do cantador Elomar: “Elomar é fruto de uma tradição que tem como percussor Catulo da Paixão Cearense. É possível dizer que Elomar é o filho mais novo dessa tradição em que podemos incluir também Guimarães Rosa e Ariano Suassuna.” Mais adiante, na página 256, ao resenhar o álbum ‘Gonzaguinha da Vida’, o jornalista e cineasta Dacio Malta ressalta uma fala ‘bisturística’ do grande e saudoso Gonzaguinha: “Se uma música não é contra nem a favor, ela é por inércia, a favor, o que lhe dá a dupla característica de alienada e alienante.”

Occuilatus Abis

Puxando a sardinha para a brasa caeté, na resenha sobre o álbum ‘Zabumbê-bum-á’, do bruxo de Lagoa da Canoa Hermeto Pascoal, o jornalista curitibano Roberto Muggiati, ao se referir sobre a Noite Brasileira do Festival de Jazz de Montreux, onde ele esteve presente e onde o Hermeto dividia o cartaz com Elis Regina, o jornalista revela e corrige um “erro”, sabe-se lá se proposital ou não, ao ressaltar que: “Em livros publicados depois, André Midani, Marcos Mazola e Nelson Mota – traídos pela memória – dizem que Hermeto “abriu” para Elis. Foi exatamente o contrário, nos dois shows: Elis foi o aperitivo e Hermeto o cartaz principal.”

Repleto de curiosidades, ‘1979 – O Ano Que Ressignificou a MPB’ veio para ocupar uma lacuna infindável, pelo tanto que é e pelo tamanho que tem e representa a música popular brasileira. Como diz Jorge Ben Jor, “occuilatus abis”. Ou seja, literalmente, o que vê bem deriva dele. Aliás, você sabia que o latim é uma língua que o Ben Jor domina? Pois bem, essa é mais uma revelação inesperada desse livro. Por fim, permita-me fazer um agradecimento público, ao meu querido amigo Célio Albuquerque, pelo convite generoso que me fez, quando dos primeiros passos desse belo e exitoso projeto. Aceitei com enorme prazer, todavia, por motivos de saúde, não pude cumprir o prazo de entrega. Porém, como o tempo não para, certamente, outros anos virão!

Serviço
1979 – O Ano Que Ressignificou a MPB, organização Célio Albuquerque
A venda nas principais livrarias virtuais e no site da editora www.garotafm.com.br
Preço médio, R$ 99,00

No +, MÚSICABOAEMSUAVIDA!!!

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