14 de novembro de 2024 10:03 por Da Redação
Por Magno Francisco*
Após a intensa atuação do Movimento Vida Além do Trabalho (VAT), a deputada federal do PSOL, Erica Hilton, desenvolveu uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que visa acabar com a escala de trabalho 6×1 – 6 dias de trabalho para 1 dia de folga – e busca assinaturas no Congresso Nacional para viabilizar a apreciação e consequente votação.
A PEC pelo fim da escala 6×1 mobilizou toda a sociedade. Assim, pela primeira vez desde o início do terceiro governo Lula, a esquerda conseguiu pautar a sociedade, pois, até então, suas ações se restringiam a reagir às pautas ultraconservadoras da direita. A proposta conseguiu ampla adesão da classe trabalhadora e o ódio dos patrões, que obviamente querem seguir explorando brutalmente os seus funcionários, afinal, a ostentação dos patrões é proporcional à vida miserável dos trabalhadores.
O fim da escola 6×1 é mais do que justo, basta lembrar que o Brasil tem a pior jornada de trabalho entre os países do G7 e metade dos países do G20. Além disso, como sabemos, no capitalismo, o trabalhador produz, mas não tem acesso à riqueza produzida. Prova disso: o Brasil produz comida para 900 milhões de pessoas, mesmo tendo uma população de apenas 200 milhões de pessoas, ainda assim, mais de 20 milhões de brasileiros não têm alimentação garantida diariamente, ou seja, a produção de alimentos do trabalhador brasileiro vai principalmente para exportação ou para o lixo.
O que há de pedagógico na PEC pelo fim da escala 6×1?
Após quase dois anos do novo mandato de Lula como presidente do país, o seu governo não mandou para o Congresso Nacional sequer uma proposta econômica favorável à classe trabalhadora. Pelo contrário, todas as propostas enviadas pelo governo nesse terreno parecem encomendadas pela Faria Lima e o agronegócio. Para justificar a submissão do governo Lula ao capital financeiro e à adoção de uma política econômica neoliberal, os ideólogos do lulismo sustentam a tese de que não é possível fazer um governo de esquerda no Brasil porque o Congresso tem maioria conservadora e os bancos controlam a economia.
É preciso perguntar: quando os bancos deixaram de mandar na economia brasileira? Quando a maioria do Congresso brasileiro não foi formada por uma maioria reacionária? Vivemos no capitalismo, o funcionamento do Estado, as leis, tribunais, parlamento e eleições existem para garantir os interesses da burguesia. Todavia, se adequar a essa lógica ou tentar superá-la são escolhas políticas.
O povo não é bobo, diferente dos que acham que o problema do Brasil é o suposto pobre de direita. Toda vez que a esquerda vence eleições e não realiza o que prometeu ou passa a governar como a direita as derrotas se sucedem. Em um país onde a saúde e a educação funcionam precariamente, onde falta saneamento básico e acesso à cultura para a maioria das pessoas, não parece óbvio que é necessário ampliar investimentos nas áreas sociais? O que fez o governo Lula e o seu ministro Haddad? Apesar da promessa eleitoral de acabar com o teto de gastos, conseguiram piorar a desgraça e colocaram um novo nome: arcabouço fiscal. Não bastasse, Haddad está propondo acabar com o piso salarial da educação e da saúde, além impor novos limites a possibilidade de reajuste do salário-mínimo. Diante dos fatos, o problema é do suposto pobre de direita ou de um governo que aplica uma política econômica de direita?
O mais bizarro desse cenário são os ataques dos ideólogos e influenciadores lulistas contra quem defende que Lula atenda aos interesses populares e abandone a política neoliberal e as alianças com o centrão. Pasmem! Quem critica a política de direita do governo é acusado de ajudar a direita. Nota-se, diante do resultado das eleições municipais, que a direita (centrão) e a direita radical estão felizes da vida. Será que não já não é o momento de fazer uma aliança com o povo e abandonar a aliança com Arthur Lira?
A pedagogia da PEC pelo fim da escala 6×1 está no fato de tornar evidente que a força da esquerda reside na mobilização popular. Não sabemos se a PEC terá assinaturas necessárias e se será aprovada no Congresso. A certeza é que os assalariados já aprovaram a proposta, que a sociedade está discutindo amplamente o assunto e que há uma crescente apoio a essa pauta. A referida PEC já conseguiu provocar fissuras até no campo da direita, vários parlamentares reacionários declararam apoio à proposta por medo de um futuro prejuízo eleitoral. Mesmo que eventualmente não seja aprovada desta vez, é inevitável que seja aprovada no futuro, pois a pressão social com certeza irá crescer a favor dessa mudança nos direitos trabalhistas.
Não existe chance de ganhar jogo só se defendendo
Apesar da maioria conservadora no Congresso, é possível, com a força da pressão social, conquistar direitos e enfrentar a burguesia. Está na hora do governo Lula, se não quiser pavimentar o retorno do fascismo ao comando do país, realizar uma mudança brusca de rota. Isso significa abandonar a subordinação aos bancos e ao agronegócio e apostar na força popular. A única maneira disso acontecer é propondo ao Congresso as demandas da classe trabalhadora, como a revogação da reforma trabalhista e da reforma da previdência, o fim do arcabouço fiscal, a reestatização das empresas públicas privatizadas e a reforma urbana para acabar com o déficit habitacional.
A política não é a arte da conciliação de interesses opostos, isso é uma fantasia delirante. Toda vez que o caminho de unir opostos se estabelece, ganha apenas quem está no comando, no caso, a burguesia. Mas não somente, além de privilegiar a burguesia, os trabalhadores perdem força de ação, a esquerda se desmoraliza, e a reação se apresenta de forma ainda mais intensa.
O momento exige concentrar as energias na aprovação da PEC pelo fim da escala 6×1! Todos os atores políticos da esquerda precisam se unir de forma decidida em defesa dessa proposta. Os sindicatos e centrais sindicais, se não quiserem seguir sendo humilhados pelos patrões, precisam fazer muito mais do que estão fazendo até agora.
Que a pedagogia dessa luta siga trazendo lições!
(*) É professor e historiador