Da página do CRESS/AL
Em Maceió, o caso Braskem trouxe impactos profundos para a população de bairros como Bebedouro, Pinheiro, Mutange, Bom Parto e Farol afetados pelo fenômeno de subsidência do solo causado pela extração de sal-gema. A tragédia forçou milhares de pessoas a deixarem suas casas, enfrentando perdas materiais e emocionais significativas.
Para entender o papel do Serviço Social nesse contexto, conversamos com a assistente social Marta Maria de Lima Alves, que atuou no Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) de Bebedouro, uma das regiões mais atingidas. Marta compartilha como tem sido sua experiência em viabilizar os direitos sociais das famílias afetadas, destacando os desafios de lidar com o sofrimento dos moradores e o papel essencial da/o assistente social na garantia de direitos e na mediação entre a comunidade e as políticas públicas de apoio e reparação.
1. Qual seu nome e local de atuação?
Meu nome é Marta Maria de Lima Alves, sou assistente social. Atuo no CRAS Bebedouro que foi realocado para o bairro da Chã da Jaqueira.
2. Qual foi o papel específico do Serviço Social no atendimento às famílias afetadas pelos problemas gerados pela Braskem na área em que atua?
O papel do Serviço Social foi fundamental para assegurar que as necessidades e os direitos dessas pessoas fossem ouvidos e atendidos. O primeiro passo foi a realização de uma escuta qualificada, um processo que permitiu que as famílias expressassem suas vivências e angústias diante das perdas e deslocamentos forçados. Além disso, foram realizadas visitas domiciliares nas áreas ainda habitadas, um recurso essencial para compreender a realidade das famílias e identificar as necessidades específicas de cada uma. A partir desse contato, o Serviço Social ofereceu orientações sobre os direitos das famílias e sobre as formas de acesso aos benefícios e serviços públicos. Quando necessário, realizamos encaminhamentos para outros serviços e instituições, como saúde e habitação, buscando garantir o acesso a redes de apoio mais amplas. Essas ações foram fundamentais para minimizar o impacto das mudanças e fortalecer os vínculos das famílias com os serviços de apoio social, criando uma rede de proteção mesmo diante da situação de extrema vulnerabilidade.
3. Quais foram os principais desafios enfrentados por você ao lidar com as consequências dos impactos socioambientais e habitacionais onde você atua?
Os principais desafios enfrentados em Bebedouro envolveram diversos fatores que aumentaram a vulnerabilidade socioeconômica das famílias atendidas. Primeiro, o aumento dessa vulnerabilidade foi sentido com a perda de rendas familiares e a precariedade que o deslocamento trouxe para a vida dessas pessoas. Além disso, o êxodo das famílias acompanhadas pelo CRAS, muitas das quais perderam o vínculo com a instituição ao serem realocadas, dificultou o acompanhamento contínuo, essencial para uma intervenção eficaz. A própria mudança de endereço do CRAS para um bairro vizinho também contribuiu para o afastamento, diminuindo a proximidade com as/os moradoras/es mais impactadas/os. Outro desafio foi lidar com o aumento de casos de alcoolismo entre os homens que permaneceram na área ao redor do CRAS, um reflexo das dificuldades emocionais e econômicas que muitas famílias enfrentaram diante da perda de moradia e de vínculos comunitários. Além disso, o desemprego aumentou consideravelmente, pois pessoas que trabalhavam, especialmente na região da lagoa e no comércio local de Bebedouro, perderam sua fonte de renda. Essas mudanças exigiram adaptações constantes e um esforço contínuo para manter o apoio social, apesar de todas as dificuldades de acompanhamento e do impacto profundo na vida das famílias.
4. Como foi o trabalho de articulação com outras instituições, como a Defesa Civil, Ministério Público e ONGs, durante o processo de apoio às comunidades?
O trabalho de articulação com outras instituições foi crucial para viabilizar o apoio efetivo às comunidades afetadas pelos problemas gerados pela Braskem. Esse processo de articulação se deu por meio de reuniões regulares, nas quais discutimos as necessidades mais urgentes das famílias e as possíveis formas de apoio, além de contatos frequentes via telefone e WhatsApp, que permitiram a comunicação ágil e a troca constante de informações. Essa boa articulação entre as instituições foi decisiva para manter uma rede integrada de suporte, possibilitando que as ações fossem coordenadas e focadas nas necessidades das famílias de maneira eficaz.
5. Quais estratégias foram adotadas para assegurar que as populações mais vulneráveis tivessem acesso às informações sobre seus direitos e às políticas públicas disponíveis?
Uma das principais estratégias foi o diálogo contínuo com as lideranças comunitárias. Realizamos reuniões frequentes com essas/es líderes, que foram fundamentais para repassar informações pertinentes e atualizadas sobre a situação das áreas afetadas e os direitos das famílias. As lideranças comunitárias, como figuras respeitadas e de confiança dentro da comunidade, ajudaram a traduzir as informações de forma clara e acessível, alcançando diretamente as/os moradoras/es. Além das reuniões, também mantivemos contatos constantes por telefone e mensagens, facilitando o fluxo de informações urgentes e orientando a comunidade sobre os caminhos para acessar benefícios, assistência social e outros serviços públicos. Essa estratégia foi essencial para garantir que as informações chegassem de forma rápida e eficiente às famílias que mais necessitavam, fortalecendo o acesso a direitos e minimizando a desinformação em um momento de tanta vulnerabilidade.
6. Quais foram as principais queixas ou preocupações relatadas pelas famílias durante o período de realocação?
As principais queixas e preocupações envolveram questões emocionais e práticas, profundamente ligadas à ruptura de suas rotinas e redes de apoio. A incerteza em relação à nova morada foi uma das maiores fontes de angústia, pois muitas famílias, já afetadas pela situação, não sabiam como seria o futuro em um novo local, o que gerou insegurança e medo de uma adaptação difícil. Além disso, a quebra de vínculos sociais e familiares foi um impacto significativo, pois as relações construídas ao longo dos anos entre vizinhas/os, amigas/os e familiares próximos foram interrompidas, criando um sentimento de isolamento. Outro ponto preocupante foi o aumento da vulnerabilidade social e econômica, já que muitas famílias perderam empregos locais ou tiveram que abandonar suas fontes de renda devido à necessidade de realocação. Por fim, a insegurança aumentou especialmente para as famílias que ainda residem na região dos Flexais, onde permanecem expostas ao risco e convivem diariamente com o medo de novos problemas estruturais e ambientais. Essas preocupações evidenciam a complexidade do processo de realocação e o impacto profundo que ele trouxe à vida das famílias, afetando-as em múltiplas esferas.
7. Na sua opinião, as políticas públicas implementadas pelo governo municipal e estadual foram adequadas para lidar com a magnitude do problema?
Na minha opinião, as políticas públicas implementadas pelo governo municipal e estadual foram insuficientes para lidar com a magnitude do problema gerado pela questão Braskem. As ações adotadas não conseguiram responder às necessidades complexas e multidimensionais das famílias afetadas, nem oferecer soluções sustentáveis para o deslocamento forçado e a ruptura social vivenciada pela comunidade. A falta de políticas mais abrangentes e de recursos destinados especificamente a questões habitacionais, psicológicas e econômicas evidenciou uma resposta limitada e fragmentada por parte dos governos, que não conseguiu contemplar a gravidade dos impactos sociais e ambientais. Esse cenário acabou deixando muitas famílias em situação de maior vulnerabilidade, sem a devida assistência ou garantia de direitos.