quarta-feira 2 de abril de 2025

Militares no banco dos réus: um marco na história republicana

O julgamento desses réus será um divisor de águas para a democracia brasileira
Foto: Antonio Augusto/STF

A decisão da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), de tornar réus o ex-presidente Jair Bolsonaro e outros sete acusados por tentativa de golpe de Estado, representa um marco inédito na história republicana do Brasil.

Entre os denunciados, destacam-se três generais que ocuparam postos-chave no governo Bolsonaro: Augusto Heleno, Paulo Sérgio Nogueira e Walter Braga Netto. A inclusão de altos oficiais militares nesse julgamento revela um novo patamar na relação entre as Forças Armadas e o poder civil, especialmente no que diz respeito ao controle democrático sobre a atuação militar.

A República brasileira, desde sua proclamação em 1889, foi profundamente marcada pela presença militar na política, ora como protagonista, ora como tutora do regime. No século XX, os golpes de 1930 (Revolução de 30), 1937 (Estado Novo) e 1964 tiveram participação direta dos militares, com destaque para a ditadura instaurada a partir de 1964, que consolidou uma tradição de impunidade para oficiais envolvidos na repressão política. Mesmo após a redemocratização de 1988, a Lei da Anistia tem sido um escudo contra punições a agentes de Estado responsáveis por violações de direitos humanos.

O fato de o STF aceitar a denúncia contra generais da reserva por tentativa de golpe de Estado e abolição violenta do Estado democrático de direito sinaliza uma inflexão histórica: pela primeira vez, altos oficiais enfrentam a possibilidade real de responsabilização penal por atentar contra a ordem constitucional. Essa mudança ocorre em um contexto de fortalecimento das instituições democráticas, que, desde os atos golpistas de 8 de janeiro de 2023, demonstraram firmeza na defesa do Estado de Direito.

Foto: Antonio Augusto/STF

No entanto, a decisão do STF também põe à prova a resiliência das instituições frente à tradição de proteção corporativa dentro das Forças Armadas. Ao longo da história, o Exército, a Marinha e a Aeronáutica demonstraram resistência a julgamentos que envolvessem seus integrantes, sob o argumento da “hierarquia e disciplina”. Resta saber se essa barreira será mantida ou se o Estado brasileiro conseguirá, enfim, estabelecer um novo paradigma de controle civil sobre os militares.

O julgamento desses réus será um divisor de águas para a democracia brasileira. Caso haja condenações, o país poderá se aproximar de uma justiça de transição tardia, que reafirme a ideia de que a democracia não pode tolerar conspirações contra si mesma. Se, por outro lado, os acusados fossem absolvidos ou beneficiados por leniência institucional, o Brasil correria o risco de dar um perigoso sinal de que intentos golpistas poderiam continuar sendo tolerados.

No entanto, diante das declarações dos ministros em seus votos, essa possibilidade parece estar descartada, consolidando a mensagem de que não haverá espaço para impunidade em casos de ataques ao Estado democrático de direito.

Independentemente do desfecho, o simples fato de militares de alta patente serem julgados por tentativa de golpe já representa um teste crucial para a democracia brasileira. O veredicto do STF não será apenas sobre os acusados, mas sobre a capacidade das instituições republicanas de reafirmar que, no Brasil, ninguém está acima da Constituição.

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