quarta-feira 2 de abril de 2025

Mioglobina d’alma

Nesse trabalho, além da parceria e amálgama entre Wado e Zeca Baleiro, há uma combinação de saberes e experiências entre profissionais de latitudes diferentes.

30 de março de 2025 5:31 por Mácleim Carneiro

Reprodução

Quando dois compositores, que produzem com proficiência e abundância impressionantes, unem-se para lançar um álbum em comum e agregar valor à vasta lista de trabalhos lançados individualmente, temos uma fórmula bastante eficiente em acertar o alvo e suas possibilidades exitosas! Ambos, com pouco mais de 20 anos de carreira, acumulam lançamentos individuais que, se somados, tem-se quase que o dobro de anos relativos às suas trajetórias. É claro, que a dinâmica do caminho perene do catarinense mesoalagoano Wado e do maranhense Zeca Baleiro, sem chances para hiatos ou hibernações sazonais, gerou uma expertise produtiva, que desembocou no interessantíssimo álbum ‘Coração Sangrento’ / Wado + Zeca Baleiro.

Baleiro chamou para si a produção desse trabalho, na figura de Sergio Foaud, que assina a produção, arranjos de base, mixagem e masterização. Porém, temos também a pegada sururu do experiente Jair Donato, que fez captações no seu estúdio Donamix, aqui no aquário, e igualmente assina alguns arranjos de base. Ou seja, nesse trabalho, além da parceria e amálgama entre Wado e Zeca Baleiro, há uma combinação de saberes e experiências entre profissionais de latitudes diferentes.

Fluxo Arterial

Todas as músicas foram compostas pela dupla dinâmica e dão continuidade a uma parceria que teve início lá no começo dos anos 2000, com a balada ‘Era’ (Wado e Zeca Baleiro), lançada no álbum ‘O Coração do Homem-Bomba Volume 2’, do compositor maranhense. Entre aquele coração e o de agora, a parceria e amizade de ambos foram fortalecidas a pleno fluxo arterial, sem descompassos coronarianos ou apolíneos. O álbum ‘Coração Sangrento’ está aí para ratificar o diagnóstico: música, como expressão de arte, como ofício e prazer, só acontece de verdade, quando existem ingredientes fundamentais, tipo amizade, admiração mútua e parcerias em prol e em nome dela.

Mergulhando nas nuances do ‘Coração Sangrento’, é perceptível a delicadeza na construção dos detalhes que tecem e tramam os encantamentos desse álbum. Se quisermos, poderemos começar pela capa, com as ilustrações de Moisés Crivelaro, que ressaltam os rostos de Wado e Zeca Baleiro, desenhados em giz cera, sem alusão a nada que remeta a corações e romantismos piegas. Portanto, só as cabeças pensantes, os cérebros da gênese desse trabalho estão representados na capa. Aliás, curiosamente, o projeto gráfico, assinado por Andrea Pedro, tem muita semelhança com a capa do álbum Silk Sonic / Bruno Mars + Anderson . Paak, lançado em 2021, o que não é nada mal como referência de qualidade!

Jogo de Adivinha

A música que abre o álbum é, também, a primeira que foi composta para esse trabalho e a que lhe dá título. ‘Coração Sangrento’ traz as vozes dos protagonistas em uníssono e confortavelmente executadas, no que parece ser a região tonal natural para cada artista. Tudo ornamentado pelo belo arranjo de cordas de Pedro Cunha, como um libelo ao bom gosto, que irá permear todo o álbum! Numa espécie de interlúdio, até a base silencia, para ressaltar que o equilíbrio entre o todo será a tônica desse valioso projeto. Na sequência, ‘Carrossel do Tempo’ é outra balada da dupla, que tem a digital melódica inequívoca do Wado e anuncia que eles querem brilhar com o sol, e brilham! Destaque-se uma guitarrinha de aprendiz, solada por Zeca Baleiro. Em ‘Avatar’, Zeca não apenas começa o canto, como, melodicamente, fica claro o seu DNA, quebrando a sequência anterior, onde a pegada do catarinense era bem evidente. E ele prossegue em ‘Dia de Sol’, escolhendo o assovio como instrumento solo, daquele de fazer inveja até mesmo a quem é capaz de assoviar e chupar cana ao mesmo tempo.

A mesma estratégia da terceira faixa foi usada em ‘Incêndios’, com a volta da estrutura melódica perceptível nas canções próprias do Wado, e a mesma divisão para as intervenções do canto dos dois artistas. É assim que chegamos à metade do álbum: leve e literalmente viajando em sutilezas poéticas, melódicas e sonoras. Aí acontece ‘Congelou’, uma canção de sonoridade onírica, que confunde as fronteiras melódicas que, até então, eram claras e demarcatórias de um ou do outro compositor. Daí, logo em seguida, o afoxé de ‘Quebra-Mar’ restabelece quem é quem! ‘Alma Turva’ desanuvia ainda mais esse um e outro criativo, que, ao longo da audição, sugere um interessante jogo de adivinha, como plus desse instigante trabalho. ‘Zaratustra’, evidentemente, faz referência explícita ao meu guru Nietzsche e, sobretudo, traz alguns fragmentos ressignificados do livro ‘Assim Falou Zaratustra’. E, claro, nada melhor para filosofar, do que um samba com a quadratura das cadeiras dum alemão.

‘Amores e Celulares’ encerra nossa prazerosa audição e coloca em perspectiva o contraditório entre o que reza a poesia e o que emana desse belo encontro de dois artistas maturados em seus ofícios. Se os poetas cantam que “amores são iguais a celulares / as vezes esquecemos em lugares / improváveis de esquecer”, o álbum ‘Coração Sangrento’ não dá a menor chance à essa possibilidade! Uma vez desfrutado, jamais será esquecido em lugar nenhum de esquecer! Metaforicamente, ‘Coração Sangrento’ é tão delicioso como a mioglobina de um filé malpassado! E vai além, muito além, pois alimenta a alma!

SERVIÇO
Coração Sangrento, Wado e Zeca Baleiro

Plataformas digitais: Spotify, Apple Music, Deezer, Tidal, Amazon Music e Youtube Music

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