8 de junho de 2021 6:12 por Fátima de Sá
Relembrando…
Como em todos os anos, desde 1974, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) elege um tema e lidera as comemorações do Dia Mundial do Meio Ambiente, visando “sensibilizar e promover a ação ambiental pelo mundo”.
Por outro lado, desde que foram definidos os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), esse é um dia em que se busca incentivar ações que permitam atingir as metas propostas na Agenda 2030.
Assim, neste ano (2021), o dia 5 de junho tem como marco principal, o lançamento da Década das Nações Unidas para a Restauração de Ecossistemas, cujo anfitrião será o Paquistão. Por isso, no site do PNUMA, há a proposta:
“REIMAGINE. RECRIE. RESTAURE.
Este é o nosso momento.
Não podemos voltar no tempo. Mas podemos cultivar árvores, tornar nossas cidades verdes, renovar nossos jardins, mudar nossas dietas e limpar rios e encostas. Somos a geração que pode fazer as pazes com a natureza.
Vamos ficar ativos, não ansiosos. Sejamos ousados, não tímidos.
Junte-se a #GeraçãoRestauração!”
Tudo bem que é uma proposta que se estenderá pelos próximos 10 anos, e, como nos lembrou Lao-Tzu[i] “Uma jornada de mil milhas começa com um único passo”, mas não podemos fazer de conta que estamos em um ano “normal”. E não é somente por conta da pandemia – que afeta a todos e todas – mas é que, acredito que, em nenhum outro país, se vive a distopia que vivemos no Brasil. Portanto, creio que o Dia Mundial do Meio Ambiente terá, aqui, características únicas, embora haja a programação oficial proposta pelo PNUMA[ii].
Enquanto isso, no Brasil…
No Brasil, a forma como está sendo conduzida a gestão da pandemia, levando muitos à morte e, de acordo com cientistas da área, muitas dessas mortes poderiam ter sido evitadas se tivéssemos governo comprometido com o bem-estar de todos e todas, que tivesse adotado ações sérias baseadas em evidências científicas.
Por outro lado, temos nos defrontado com fatos cada dia mais catastróficos: aumento de áreas desmatadas, queimadas, comunidades indígenas e quilombolas desrespeitadas e agredidas, garimpeiros invadindo terras indígenas, aumento da população pobre desassistida – que volta a sentir os efeitos da fome, do desemprego, habitando as ruas das cidades por não ter moradia e nem condições de pagar aluguel.
Estamos no mesmo mar, mas não na mesma embarcação
Certamente, o próprio PNUD não desconhece que “bilhões de cidadãos e cidadãs em vários países continuam a viver na pobreza e a elas é negada uma vida digna”. Portanto, PREVENIR, PARAR E REVERTER A DEGRADAÇÃO DOS ECOSSISTEMAS EM TODO O MUNDO, como proposto para refletirmos e agirmos hoje, não será tão fácil diante do quadro montado no Brasil.
E, ao informar que a Década das Nações Unidas para a Restauração do Ecossistema “é um grito de guerra global para curar nosso planeta”, é lançado o desafio: “O que você vai restaurar?”
O que você vai restaurar?
Antes de tudo, creio que a maioria dos brasileiros, imediatamente gritará: PRECISAMOS RESTAURAR A DEMOCRACIA em primeiro lugar. Ou estaremos atados e sem forças para cuidarmos de nossos jardins, de nossas hortas, de nosso entorno, da segurança alimentar, do nosso meio ambiente. Pois, tudo isso está interligado e depende de políticas sérias e comprometidas com uma visão de mundo totalmente diferente do que está aqui sendo imposto à população brasileira.
Quando o PNUMA diz: “Nunca houve uma necessidade mais urgente de reviver ecossistemas danificados do que agora”, concordo. E temos urgência de viver. Cada alerta nos leva ao mesmo diapasão: queremos DEMOCRACIA ou sufocaremos sem ar, sem as mínimas condições de enfrentamento da crise ambiental global.
A COVID-19 ofusca a crise ambiental
Crise ambiental que é assim vista pelo monge budista Bhante Buddharakkhita: O mundo está atravessando muitas, muitas crises; por exemplo, a pandemia de COVID[…]. Temos também as mudanças climáticas. Essas são crises bem grandes. Mesmo agora, acho que a COVID está ofuscando as mudanças climáticas. Temos conflitos em larga escala, guerras em todo lugar, a crise humanitária[iii].
O grifo acima é meu. Sim, a pandemia da COVID-19 está “ofuscando” a crise climática, principalmente no Brasil onde o (des)governo se aproveitou da maior atenção de que necessita para a pandemia para “passar as boiadas” que, entre outras consequências, têm contribuído para ampliar a crise climática. E precisamos mostrar a relação entre as pandemias e a forma como tem sido tratado o meio ambiente. “Tudo está interconectado”, é sempre bom lembrar.
Como estão os ecossistemas aquáticos, por exemplo?
Portanto, não há como “tapar o sol com uma peneira”. O que continuam fazendo com nossos cursos d’água? Como falar de restauração de ecossistemas aquáticos sem falar em saneamento básico? Sem falar e sem se executar o que é essencial.
A gestão das águas nas mãos da iniciativa privada vai deixar as periferias ainda mais abandonadas porque não interessam aos que apenas visam lucro imediato. O lixo continua sendo acumulado a céu aberto nas ruas. Riachos, rios, lagoas e lagunas têm sido a lata do lixo e dos efluentes que contaminam e poluem o ambiente. E, grande parte desse lixo desce até as praias, juntando-se aos efluentes e ao lixo que tem sido atirado fora das lixeiras. Portanto, quando falamos disso, repetimos mais do mesmo.
Em publicação de março deste ano, o Instituto Trata Brasil informa: … o país mantém sem serviços de água tratada quase 35 milhões de habitantes, sendo 5,5 milhões nas 100 maiores cidades […]. Temos aproximadamente 100 milhões de pessoas sem acesso à coleta de esgotos, sendo 21,7 milhões nesses maiores municípios […]. O Brasil ainda não trata metade dos esgotos que gera (49%), o que representa jogar na natureza, todos os dias, 5,3 mil piscinas olímpicas de esgotos sem tratamento. Nas 100 maiores cidades, em 2019, descartou-se um volume correspondente a 1,8 mil piscinas olímpicas diárias.
A construção de uma casa começa pelo alicerce
O PNUD nos lembra: Os ecossistemas sustentam toda a vida na Terra. Quanto mais saudáveis forem nossos ecossistemas, mais saudável será o planeta – e seu povo. A Década das Nações Unidas para a Restauração de Ecossistemas visa prevenir, interromper e reverter a degradação dos ecossistemas em todos os continentes e oceanos. Pode ajudar a erradicar a pobreza, combater as mudanças climáticas e prevenir uma extinção em massa. Só terá sucesso se todos participarem.
Concordando com tudo isso, volto a lembrar: são necessárias medidas de suporte básico para que o cidadão e a cidadã deem sua contribuição no cotidiano, apoiando projetos de “restauração local” (do seu bairro e da sua cidade). Lembrando que a construção de uma casa não começa pelas paredes, para restaurar os ecossistemas há ações que dependem de políticas públicas que saiam do papel: saneamento básico, fiscalização, parar o desmatamento, reduzir o uso de agrotóxicos, manter saudáveis as matas ciliares e outras APP (Áreas de Proteção Permanente), entre outros.
Em conclusão…
Enfim, tudo isso vem antes de a comunidade plantar árvores, limpar margens de rios”. Além disso, para que “a natureza se recupere” é preciso que cessem as agressões à Terra. Concluo com reflexão do próprio PNUD: O esgotamento dos recursos naturais e os impactos negativos da degradação ambiental, incluindo a desertificação, as secas, a degradação dos solos, a escassez de água doce e a perda da biodiversidade aumentam e agravam a lista de desafios que a humanidade enfrenta.
[i] LAO-TZU – apelido do autor do Tao-te King e que viveu “nos fins do século VII a.C., contemporâneo de Confúcio” (LAO-TZU. Tao-te King: o livro do sentido e da vida. São Paulo: Ed. Pensamento, 1978.
[ii] Disponível em: https://www.unep.org/pt-br/events/un-day/dia-mundial-do-meio-ambiente-2021. Acesso em: 5 jun. 2021.
[iii] Disponível em: https://bodisatva.com.br/cebb-talks-bhante/. Acesso em: 5 jun. 2021.