10 de janeiro de 2024 6:16 por Geraldo de Majella
O mal que acomete o Partido dos Trabalhadores (PT), quando chega ao Executivo, é a acomodação. No primeiro momento, se depara com a pouca experiência. No segundo momento, é absorvido pela máquina burocrática do Estado e pela cobrança para apresentar resultados. No terceiro momento, são feitos os arranjos e alianças para manter a governabilidade.
Nessa trajetória, o PT se desloca do seu leito natural – umbilicalmente vinculado às reivindicações das bases da sociedade – e transforma-se no Partido da Institucionalidade.
O partido é o instrumento ou um dos instrumentos de que a sociedade dispõe para exercer o direito ao exercício democrático de pressão sobre o Estado e o governo. Perder ou arquivar essa perspectiva é o meio mais eficiente para ser derrotado.
O direito à pressão é legitimo e democrático, desde que não seja no sentido de ruptura da ordem constitucional. Isso é causa pétrea.
O PT é o partido mais influente na sociedade brasileira, gostem ou não; é o maior partido e mais estruturado de esquerda no Brasil, pelo fato de ter vencido cinco eleições presidenciais, de ter eleito dezenas de governadores e centenas de prefeituras relevantes e de ter alcançado a maturidade política em 43 anos de atividade. Além disso, forma quadros políticos de reconhecida importância nacional e internacional. Essa trajetória é invejável num país como o Brasil.
O PT, não demorou, por força das circunstâncias e obrigações impostas para o exercício do Poder emanado da urnas, aprendeu a dialogar com o mundo do capital.
O capital conhece e sabe manobrar o Estado em seu benefício, tem instrumentos jurídicos, parlamentares e financeiros. Tem lobby estruturado em todas as áreas.
Os trabalhadores têm a força de trabalho vendida na “bacia das almas”, os segmentos que possuem consciência de classe e política contam com os partidos de esquerda para defender os seus interesses e direitos. É uma vanguarda liderada pelas organizações sindicais que nos últimos anos perdeu força e representatividade.
Essa é a realidade com a qual o PT se defronta e se distancia.
O nó górdio que se apresenta ao PT é a burocracia partidária como instrumento político interno. Esse mal atingiu os partidos comunistas, socialistas e social-democratas ao redor do mundo, não é um fenômeno contemporâneo. É antigo e bastante estudado nas ciências sociais e políticas. O PT não se livrou e tende a não se livrar com facilidade no médio e longo prazo.
O veterano dirigente político
Na noite do dia 24 de novembro passado, José Dirceu falou para os militantes petistas da tendência Avante, durante evento em São Paulo. Avante é uma tendência minoritária no PT. Dirceu foi claro, mas, não disse tudo:
“Hoje o PT é o partido de maior apoio popular, de melhor imagem, mas o partido não é nem 10% do que devia ser. Nós temos um problema sério, no PT e na esquerda. O nosso governo tem problemas de governabilidade, organização, de avaliação de cada ministério”.
Dirceu, quando jovem, criticou a maneira burocrática por ele vista dos partidos comunistas. É inegável a sua responsabilidade na estruturação do PT, é um organizador político com méritos inigualáveis. O veterano dirigente opera, na minha visão, um tipo de estímulo aos militantes mais à esquerda do PT para que haja pressão interna sobre a condução do partido e do governo. É um quadro hábil, na linguagem política convencional, é uma “raposa felpuda”.
Mas, quanto ao centro do problema, nem aborda e se esquiva de criticar a burocratização que bloqueia a ascensão de quadros políticos jovens a posições de comando do PT nos diversos níveis.
A burocracia é o “matadouro” de lideranças que surgem nas bases, nas direções intermediárias. As que conseguem furar o bloqueio e alcançar a direção nacional, têm sido isoladas.
A luta interna é uma autofagia político-partidária. Para quem fez parte da tradição leninista em partido comunista, reconheço o PT como um modelo inovador de organização partidária.
A pergunta a ser feita: como destravar ou desobstruir os caminhos para oxigenar o partido?
Os movimentos de massa têm dinâmicas próprias e interesses objetivos e imediatos, seja o movimento sindical, por moradia, reforma agrária etc. O PT não perdeu integralmente o contato com os excluídos – me refiro ao partido, não é o caso de Lula, líder político que transcende ao PT. Esse nunca perdeu a identidade com os brasileiros e brasileiras do andar de baixo da sociedade, o povo.
A importância dos partidos políticos estruturados na sociedade é vital para a democracia, e quanto mais organizado e influente o PT e outros partidos de esquerda, melhor será para o aprofundamento da democracia e para a sociedade brasileira.
Não é possível ter democracia sem que existam partidos consolidados e que representem classes e interesses legítimos emanados da sociedade.
O retorno às bases deve ser o caminho a ser feito pelo PT.