10 de julho de 2020 8:05 por Redação
A construção do campo artístico, em especial no Brasil, é historicamente marcada por um racismo estético ou um autoritarismo sutil, que perpetua o status quo. A representação do corpo negro na arte tem o seu caráter ideológico, submisso às estruturas dominantes e reproduzido através de distintos aparelhos coercitivos. A necessidade de inferiorizar e vulgarizar o negro também se expressou através da arte, que não poderia estar aparte das diversas teorias eugenistas, que surgiam no século XIX, tal como o darwinismo social.
Inicialmente, as marcas da escravidão e, posteriormente, do eugenismo encravaram profundamente nas produções artísticas brasileiras, que, ainda no século XIX, estariam sujeitas à necessidade e às políticas de “embranquecimento” da população, que visavam progressivamente apagar o fenótipo negro do Brasil, no período pós-abolição. As consequências da colonização e da escravidão geraram um efeito de apagamento e destruição da história pré-colonial africana, que foram e são nocivos à identidade negra e sua autoafirmação.
No entanto, a exposição do corpo negro em papel de servidão e inferioridade, como em “A redenção de Cam”, de Modesto Brocos (1852-1936), ou “Olympia”, de Édouard Manet (1832-1883), é lentamente subvertida com a introdução de ilustres personagens, que contribuíram tanto intelectualmente quanto artisticamente para construção de uma identidade negra empoderada e resistente durante a história. O fato é que a arte também desempenha sua parte na reprodução de opressões e na perpetuação das formas relacionais de poder.
A nação brasileira foi construída sobre o suor negro, e, apesar disso, há uma grande discrepância racial entre as posições que negros e brancos ocupam nas estruturas sociais, de modo que, enquanto um é vítima dessas mesmas estruturas, o outro utiliza-as para perpetuar seus privilégios e autoridade. As estruturas e relações de poder na sociedade brasileira podem ser facilmente resumidas com as obras de Jean-Baptiste Debret (1768-1848) – em especial com sua obra intitulada de “O regresso de um proprietário” –, onde é retratado um proprietário de escravos sendo carregado numa rede por negros escravizados.
Dentro desse contexto, figuras históricas surgem e tomam seu papel de resistência e combatividade na luta contra as opressões, por exemplo, pessoas como; Arthur Timótheo (1882-1922), Benedito José Tobias (1894-1963), Lima Barreto (1881-1922) e Luís Gama (1830-1882), ilustres personagens, que com seus trabalhos ajudaram a reconstruir uma identidade negra afirmativa e lutar contra as formas simbólicas de racismo.
Em um contexto mais amplo, no século 20, a partir da década de 30, veríamos o advento do “Négritude”, movimento literário e intelectual de exaltação dos valores culturais dos povos negros. Pode-se dizer que essa insurreição intelectual negra é o resultado das influências de um outro movimento, o “Harlem Renaissance”, uma espécie de explosão e florescimento artístico e literário entre pensadores e escritores negros, que emergiu nos Estados Unidos, em Nova York, durante 1920.
O objetivo do movimento era simples; combater a representação estereotipada do corpo negro feita por brancos, a qual influenciava diretamente no jeito como pessoas negras viam sua própria hereditariedade. A concentração memorável de intelectualidade e a atenção chamada pelo movimento, que tinha Langston Hughes (1902-1967), poeta e ativista americano, e Claude Mckay (1889-1948), escritor e poeta jamaicano, como seus principais representantes, influenciou os jovens pensadores do Négritude.
*Devido ao seu tamanho, o texto foi dividido em duas partes*.
17 Comentários
O texto de Madson Costa é simplesmente revolucionário. A capacidade de criticamente resgatar toda uma margem da produção negra intelectual em seu texto merece aplausos. No texto, é visto a reconstrução, de maneira subversiva ao que se espera deste gênero, empoderada da memória histórica e da identidade negra ao que concerne sua produção tanto artística quanto intelectual. É, decerto, um gatilho a uma nova forma de perceber a arte e a questão da negritude. O texto resgata toda uma produção artística, literária e intelectual negra justamente num momento que se faz extremamente necessário agregar a luta antirracista, ao passo que traz a tona nomes de grande importância, mas ocultados historicamente. É realmente uma reafirmação moderna da auto estima negra e de sua produção. Os olhos devem se virar e observá-lo como uma nova faísca cintilante, que abre incitáveis portas dentro dessa luta. É algo que não se espera de uma mente tão longe, mas que prova todo o mérito e capacidade desse jovem intelectual maceioense. Ademais, inicia mais uma pauta sobre a questão da arte como mecanismo de reprodução de opressões.
?????
Muito bom, obrigado pela reflexão. Um tema hodierno na sociedade contemporânea.
Muito bom.
É sempre um prazer, ler o seu belo trabalho.
Que lindo esse texto, Madson.
Muito bem escrito, parabéns ?
Belíssimo texto.???
Parabenizo pelo seu trabalhor continue assim que vc vai longe?
Claro, simples e didático.
Bela reflexão.
Parabéns.
Ótimo texto excelente.
Ficou ótimo!
Trabalho maravilhoso, parabéns ao colunista.
Bem dms ?
Olá tudo bem? Espero que sim 🙂
Adorei seu artigo,muito bom mesmo!
Abraços e continue assim.