7 de julho de 2020 8:10 por Thania Valença
O governo do Estado já publicou o Edital de licitação da concessão regionalizada dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário da Região Metropolitana de Maceió. Pelo edital, até o final deste ano a Companhia de Saneamento de Alagoas (Casal) deixará de ser responsável pela operação dos serviços de água e esgoto da capital e mais 12 cidades da Região Metropolitana.
Com isso, o governador Renan Filho (MDB) dá início ao processo de privatização da Companhia, passando à iniciativa privada concessão para atender a 1,5 milhão de habitantes, o equivalente a 43% da população alagoana. Defensor da iniciativa privativista, o secretário de Estado da Fazenda, George Santoro, diz que o processo de “venda” da Companhia de Saneamento representa um grande projeto de desenvolvimento econômico de Alagoas.
“A finalidade é melhorar a vida da população, a saúde, o bem estar, mas ao mesmo tempo irá melhorar a balneabilidade das praias, o meio ambiente e isso, consequentemente, é importantíssimo para um turismo e uma agenda econômica sustentável no Estado”, afirma Santoro.
Apesar das promessas de desenvolvimento, a decisão de Renan Filho é contestada pela sociedade civil. “Não estamos falando de uma mercadoria que se posa comercializar a qualquer custo. A água, enquanto bem essencial à vida e à saúde, não pode se tornar fonte de lucro”- reage Dafne Orion Ceres da Silva, presidente do Sindicato dos Urbanitários de Alagoas.
Para ela, ao contrário do projeto do governo alagoano, o serviço de abastecimento de água , como se constata em várias cidades no mundo, precisa ser estatizado. “Isso porque a função social do estado é garantir o acesso a água a todos. A gestão privada não dá conta dessa função social e isso foi o principal motivo do insucesso da experiência em outras cidades. Também por isso as empresas públicas tem resultado melhores que as privadas no ranking de empresas de saneamento” – argumenta a dirigente sindical.
Segundo Dafne, mesmo com todas as dificuldades de acesso a investimentos, a Casal e os municípios, com o Serviço Autônomo de Água e Esgoto (Saees), conseguem dar conta de distribuir água em mais de 90% do estado, mesmo nas áreas com insegurança hídrica.
Os Saaes são sistemas que operam em alguns municípios, a maioria deles com comunidades extremamente carentes, comunidades rurais com menos de 1.000 habitantes, que não serão atendidas pelo setor privado. Diante do risco, a presidente do Sindicato dos Urbanitários apresenta um questionamento bastante objetivo: “Quem irá se responsabilizar por continuar abastecendo essas áreas com água é de que forma?”.
Quem perde
A lógica do setor privado é atuar somente em áreas lucrativas, ressalta a dirigente do SindUrbanitários/AL. A avaliação de Dafne Orion é que a venda da Região Metropolitana de Maceió coloca em risco o sistema nas demais regiões do estado. Principalmente nas mais complexas, como Agreste e Sertão.
“O valor que a Casal passará a receber do operador privado na Região Metropolitana não garante que ela poderá continuar levando água para o restante do estado. E fica a grande pergunta quem irá se responsabilizar? O estado, que já disse que não tem recursos, vai investir na Casal para garantir o abastecimento nas demais regiões?” – indaga a sindicalista.
Na sua argumentação, contrária ao projeto de privatização da Casal, Dafne Orion afirma que não se trata de uma batalha entre o setor público e a iniciativa privada, mas de uma luta pelo direito de acesso a água para todos. “Temos exemplos bem sucedidos de parceria público-privada, como as PPP da cidade do Recife (PE) , limitadas à área de esgotamento sanitário, mas cuja arrecadação/faturamento segue sendo administrada pelo companhia pública. Isso dá garantias de compromisso de atendimento a toda a população” – argumenta ela.
A presidente do SindUbranitários diz que o debate sobre o assunto não considerou as questões sociais e o direito do acesso a água. “O programa PPI [programa de parcerias e investimentos], inaugurando pelo governo Temer e aprofundado no governo Bolsonaro, tem um único objetivo: permitir que empresas privadas, ligadas a bancos, obtenham lucro com serviços tão importantes como os de abastecimento e saneamento. É a mercantilização da água, ou seja, o comércio da vida”- alertou Dafne Orion.
Repúdio
Em manifestação pública, logo após a aprovação do Projeto de Lei 4162, que privatiza a água no Brasil, pelo Senado, o Sindicato dos Urbanitários de Alagoas repudiou a postura dos senadores Rodrigo Cunha (PSDB) e Fernando Collor (PROS), que votaram favorável ao projeto. “A aprovação do PL 4162 é extremamente grave, pois muda o marco do setor, extinguindo o modelo atual de contrato entre os municípios e as empresas estaduais de água e esgoto. O novo marco retira autonomia dos municípios e transforma os contratos em vigor em concessões com a empresa privada que vier a assumir a estatal”- diz nota do sindicato.