29 de julho de 2022 12:04 por Mácleim Carneiro
Dos meus 14 leitores, tem um, apenas um, que cobrou o desfecho final e trágico da personagem central do escrito ‘Meu Guru’, o Bob Nelson, um fox terrier de dons premonitórios, na Copa de 2010. Para mim, ter 14 leitores é um grande privilégio! Sobretudo, em contraponto ao universo virtual, onde a régua usada é tão somente quantitativa e é por ela que tudo é avaliado, mensurado, consumido, endeusado, engolido ou descartado, de acordo com a quantidade de visualizações ou likes. Certamente, a minha peneira deve mesmo ter malha muito fina e, claro, tem a ver com o que eu sou e o que produzo. Então, sendo eu um artista que, recentemente, tive o meu novo álbum recusado por uma gravadora, porque no dia em que eles pesquisaram meu desempenho no streaming eu só tinha 35 visualizações no Spotify (a plataforma que paga a fortuna de US$ 0,00397 por play), é uma honra poder atender ao pedido do meu querido leitor e amigo Alex Santana.
Pois bem, ocorre que a minha história com o cãozinho Bob Nelson teve uma sequência evolutiva, baseada na conquista mútua, passo a passo, até o fim trágico provocado por ambos, como suponho ter sido, na vã tentativa de aliviar a minha culpa cristã. Acontece que, quando nos conhecemos, não houve a menor empatia por parte do arisco Bob Nelson para comigo. Só me recebia, na casa dos meus pais, rosnando e com latidos desaforados, que sempre foram interpretados por mim como: “você não é bem-vindo em meu território!”. Na maioria das vezes eu ignorava ou, no máximo, respondia: “Pra você também!”
Pequeno Amigo
Um belo dia, resolvi mudar de estratégia e decidi que iria conquistar aquele pequeno e resoluto ser. Prometi a mim mesmo trazê-lo para a minha capacidade afetiva, onde sempre cabe uma nova possibilidade de compreensão, apego e afeição. Daí, a estratégia usada foi de uma eficácia paulatina e visivelmente evolutiva a cada nova abordagem. Simplesmente, pensei: peixes, homens e cães são fisgados e até morrem pela boca. Sim, cooptei Bob Nelson dessa maneira e nos tornamos amigos fraternos, do tipo que sempre tem um sorriso a cada reencontro. Não se espante, Bob Nelson sorria para mim, escancarando os dentes e balançando freneticamente seu cotoquinho de cauda.
No escrito ‘Meu Guru’, publicado anteriormente aqui, encontraremos os seguintes trechos: “do alto dos seus 70 anos” e, também: “se as vias respiratórias do Bob Nelson ajudassem…”. Pois bem, são indícios sobre a saúde já um tanto debilitada do pequeno amigo. Talvez, por isso, fui eu o escolhido por ele para o seu rápido e trágico fim. Para amenizar o sentimento de responsabilidade, já pensei até que foi um ato de suicídio canino. O fato é que Bob Nelson morreu com um frágil gemido, uma espécie de ui, sob uma das rodas do meu carro. Até hoje não sei por que razão, naquele dia e nunca antes nem depois, estacionei o meu carro na garagem da casa dos meus pais. Quando ia embora, ao dar a ré, não imaginei que ele havia escolhido o seu próprio fim e a mim como executor; não imaginei que eu teria tamanha incapacidade emocional, a ponto de não conseguir tirá-lo, já sem vida, debaixo do carro; muito menos imaginei que a minha última homenagem e castigo seria cavar uma cova e sepultá-lo no quintal da casa Nª 192, da Rua Herman Soares Torres.
No +, MÚSICABOAEMSUAVIDA!!!
1 Comentário
Meu amigo, acrescente mais um que lê e se emociona. Agora são 15 os seus leitores.