sábado 4 de maio de 2024

Cinema e as “bruacas”

Como mulheres possuem uma data de validade na indústria artística
Bette Davis e Joan Crawford em “O Que Terá Acontecido a Baby Jane?” (1962). Reprodução

Por Raquel Moraes*

A história das mulheres no cinema é uma complexa linha que acompanhou prudentemente a trajetória feminista do cotidiano, sendo feroz e cruel. Longas décadas de estratégias infelizes e contratos perversos trouxeram o destaque feminino para as grandes telas, ainda sim, não sendo o suficiente.

Com padrões estéticos indestrutíveis e dizeres ultrapassados, ser uma mulher na indústria cinematográfica torna-se um desafio eminente. A beleza é hipervalorizada, sendo esta vivamente associada à juventude, entendemos o campo minado que a velhice natural das atrizes adotam como destino.

Qual seria o outro destino de atrizes mais velhas a não ser o caricato papel de mãe nas telas? O estrelato acompanha o envelhecimento da pele, tendo um prazo restrito a ser cumprido. Grandes nomes e talentos são esquecidos e desvalorizados devido aos padrões impiedosos de Hollywood. A indústria do cinema constantemente está em busca de jovens moças para sugar os seus talentos e usufruir de seus corpos.

Bette Davis e Joan Crawford, rivais da época de ouro de Hollywood, encontraram-se em uma escassez de trabalhos após anos de atuação. Sendo mães, concorrentes algumas vezes na premiação do Oscar e de talentos inegáveis, foram vítimas da crueldade hollywoodiana, sendo apagadas devido ao envelhecimento de ambas. Mesmo com os holofotes as abandonando, as mulheres fizeram história com a colaboração em, “O Que terá Acontecido a Baby Jane?”, proporcionando um novo subgênero de terror, um clássico e consagrando seus nomes mais uma vez na história do cinema.

A atriz Bette Davis foi um grande acontecimento em vida, sendo uma artista aplicada e perfeccionista, sempre alcançou mais do que era exigido. Nunca teve medo de interpretar qualquer tipo de personagem e de qualquer forma, desde de que fosse feito com competência. Mesmo com tanta devoção ao ofício, teve que juntar grandes forças para alongar sua carreira na indústria. Tantas outras atrizes estiveram na mesma labuta, enfrentando a emblemática que continuamente passou despercebida pelos homens, estes que nunca tiveram suas carreiras em decadência por causa da idade avançada.

Os padrões estéticos são tirânicos, acentuando a ideologia de que o corpo de uma mulher nunca será seu e sim do meio social em que está incluso. A velhice é associada com a feiura. Jovens moças são ensinadas desde de crianças que tudo que elas têm e podem oferecer são sua juventude e beleza, que devem ser alvo de desejo para os olhos alheios, caso contrário, não há valor na pele que possuem.

A obra, “X — A Marca da Morte”, trata-se de um dos filmes da nova trilogia de terror da produtora A24, gira em torno de como o envelhecimento é um meio de fraqueza para todas as mulheres. O verdadeiro terror não mora somente na matança, mas também na personagem Pérola, que tem o maior feito de terror contra a audiência sendo apenas uma idosa frustrada. A velhice feminina torna-se amedrontadora para moças, pois é do saber coletivo que suas ações e vontades “precisam” ser paradas quando esse momento chegar.

Mia Goth em “X — A Marca da Morte” (2022). Reprodução

Uma mulher não é apenas uma mãe, uma irmã, uma filha, um objeto para satisfazer os prazeres dos olhos e do corpo. Mulheres são mulheres, são seres humanos completos, cheios de talentos, pensamentos e sonhos. Não podemos enquadrar seres humanos em caixas e muito menos enfeita-los com etiquetas com um prazo de validade. Parece que é impossível no saber social entender a liberdade e a beleza que há dentro da feminilidade. A velhice não anula tudo que uma mulher é, tudo que ela já fez e ainda faz.

A aptidão feminina reina em todos os lugares e em qualquer tempo, assim como no filme, “Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo”, estrelado pela talentosíssima Michelle Yeoh, de 60 anos. O filme retrata sobre multiverso, é uma viagem extraordinária de emoções e com relações cinzas, tendo uma mulher mais velha como protagonista, sendo profunda e interessante. Todo o elenco brilha em seus respectivos papéis, trazendo uma obra completamente inovadora.

Mulheres não devem ter suas diversas habilidades limitadas, devem ser constantemente aprofundadas e reconhecidas. A indústria artística deve entender que a plenitude de uma mulher vai além da idade e o valor vai além do que eles podem definir. Tudo que uma mulher pode oferecer vai mais alto do que as marcas do rosto e dos cabelos brancos. São guerreiras, lutadoras, são pessoas que entendem perfeitamente os desafios que ninguém poderia vencer por elas. A beleza e as ambições de uma mulher não podem ser mortas porque são eternas e atemporais.

Michelle Yeoh em “Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo” (2022). Reprodução

“Mulheres, têm mente e alma, assim como possuem corações. E elas têm ambição e talento, além de beleza. Estou tão cansado de pessoas dizendo que o amor é tudo para que uma mulher serve.”

Jo March, Mulherzinhas.

*Colaboração para o site 082Notícias

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1 Comentário

  • Lendária,texto acertivo demais!

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