terça-feira 7 de maio de 2024

Prédios abandonados em Maceió, um problema em série

Prédios abandonados geram na paisagem urbana do centro de Maceió e nos bairros afetados uma caraterística de terra arrasada com intensa degradação visual, estética e sanitária do ambiente urbano

28 de julho de 2023 3:04 por Da Redação

Foto: Vitória Canuto de Alencar

Por Dilson Batista Ferreira*

Estes dias, me perguntaram se existia uma explicação para o aumento no número de prédios abandonados capital alagoana. Minha resposta foi de que, geralmente, existem processos semelhantes em centros urbanos em diversas partes do Brasil e do mundo, sendo a maior causa a desvalorização econômica local, por deslocamento de centros de compras antes centrais.

Na verdade, há várias razões pelas quais muitos prédios estão abandonados no centro de Maceió. O principal foi a mudança gradativa da área comercial para shoppings e mini shoppings a partir dos anos de 1990 (Shopping Iguatemi, Mini Shopping Farol, Mini Shopping Cidade) e a falta de investimentos em infraestrutura e revitalização urbana do Centro ao longo de décadas.

Antes, tínhamos um único shopping (Antigo Shopping Iguatemi, atual Shopping Maceió) e hoje possuímos 03, além destes mini shoppings, galerias e a construção de um quarto na parte alta da cidade. Isso fez com que muitas empresas se instalassem em locais mais seguros, com melhor mobilidade, com maior atratividade imobiliária, maior conforto, segurança viária e infraestrutura moderna. Tudo isso fez com que, ao longo do tempo, estes prédios mais antigos se tornassem menos atrativos e menos procurados.

O tempo fez com estes imóveis esquecidos pelo mercado começassem a aparecer problemas estruturais levando-os à interdição dos imóveis centrais e ao seu consequente abandono em série. Outro problema são as dívidas de impostos e outras questões judiciais, falta de alvarás, licenças vencidas e documentação irregular impedindo até mesmo a negociação e a revitalização destes edifícios, devido a ter todos estes passivos.

Foto: Vitória Canuto de Alencar

Muitos destes prédios acabam também abrigando populações de ruas desabrigadas e vulneráveis que acabam residindo nestes imóveis, gerando risco para elas, que acabam habitando estes espaços em condições extremamente precárias e subumanas. Na verdade é um problema em série ter prédios abandonados nas cidades.

Para se ter ideia, hoje possuímos uma média de 50 prédios abandonados na área central de Maceió, segundo a Aliança Comercial local. Somados a eles possuímos mais de 17 mil imóveis atingidos, diretamente ou indiretamente pelo afundamento em cinco bairros causados pela mineração de sal-gema da Braskem.

O abandono destes edifícios não afeta apenas o edifício, mas seu entorno, pois gera um cenário de caos, falta de urbanidade, insegurança, por vezes até mesmo criminalidade e atos ilícitos, com risco físico para as pessoas que trafegam, trabalham e moram nestes locais. Além do risco de saúde pública (abrigando vetores de doenças) para pessoas que trafegam próximas a estes edifícios, pois muitos prédios soltam partes estruturais das fachadas nas ruas, podendo afetar gravemente à população que passa na calçada. Não é raro marquises de concreto desabar em grandes centros urbanos, decorrência de abandono de edifícios, principalmente em áreas centrais.

Apesar de pouco debatido a presença de prédios abandonados no centro urbano da capital alagoana e nos bairros afetados possui muitos impactos para os maceioenses. Imagine 50 prédios no centro abandonados, sem inspeção sanitária por anos, sem manutenção e sem inspeção de órgão como Corpo de Bombeiros? Gera um eminente foco de risco de incêndio, desmoronamento do edifício ou partes dele, transmissão de doenças em todo seu entorno, além de abrigo de animais peçonhentos e vetores de doenças graves. Isso acaba afetando os demais comércios vizinhos, afugentando clientes, novos lojistas e todos que visitam o centro de Maceió. Isso também está acontecendo nos 05 bairros afetados e já está gerando um passivo enorme para a cidade de Maceió. Esses impactos afetam negativamente a qualidade de vida de quem passa, trabalha e mora no centro da cidade de Maceió e nos bairros atingidos, bem como, nas bordas tanto do centro da cidade como dos bairros afetados pela Braskem.

Foto: Vitória Canuto de Alencar

O principal ponto que impacta diretamente quando se abandona uma área urbana é a segurança, já que como os prédios estão abandonados, geralmente não há efetivo de segurança pública no seu entorno, sendo um local propício para atos ilícitos. Muitas vezes é o único refúgio e abrigo possível de pessoas em vulnerabilidade social, que moram na rua e que são as principais vítimas destes edifícios, pois correm risco de segurança, risco ambiental e risco de integridade física por falta de manutenção e conservação destes prédios. Há em alguns casos o risco de incêndios e desmoronamentos, como já observamos em São Paulo com o caso do edifício prédio Wilton Paes de Almeida de 24 andares, que pegou fogo e desabou na região do Largo do Paissandu, no Centro de São Paulo em 2018, deixando mortos e feridos.

Prédios abandonados geram na paisagem urbana do centro de Maceió e nos bairros afetados uma caraterística de terra arrasada com intensa degradação visual, estética e sanitária do ambiente urbano. Isso afeta a imagem da cidade de Maceió, sua potencialidade turística, ambiental, arquitetônica, comercial e histórica.

No caso do centro de Maceió, o abandono desta zona urbana gera problemas sociais e segregação espacial, concentrando problemas em algumas áreas da cidade e em outras não. Lidar com estas situações não é fácil, pois gera desigualdade urbana em cadeia. Cito como exemplo a região da Luz (Cracolândia) e a Região da Faria Lima (Centro Financeiro) em São Paulo, dois extremos de abandono e investimento por parte do poder público. Antes a Cracolândia era na região do bairro da Luz e hoje se espalha por outras áreas da Capital Paulista, chegando em áreas nobres como Higienópolis.

Não faz nenhum sentido abandonar nossa história, nosso núcleo urbano original, por falta de ação por parte de governantes que não olham o centro como um local de alto potencial comercial, turístico e gerador de emprego e renda. Lembrar que o centro de Maceió possui belíssimos exemplares de igrejas, edifícios históricos, museus, prédios legislativos, autarquias, praças e uma conexão com a orla lagunar também abandonada faz décadas. A mancha de degradação é inevitável de não ser ampliada, caso não se trabalhe uma requalificação urbana, pois uma área desvaloriza a outra (exemplo: Praia da Avenida, Centro, Orla Lagunar e agora a região dos 05 bairros afetados). O impacto de uma área abandonada a médio prazo afeta bairros vizinhos inevitavelmente e Maceió está se tornando uma cidade sem conexões urbanas, entre bairros. Tudo isso gerado por degradação de áreas como avenida da paz, Centro, Orla Lagunar e agora a região dos bairros afetados como Pinheiro, Farol, Bebedouro, Mutange e Bom Parto e os flexais.

Edifício Palmares reflete abandono do Centro de Maceió | Reprodução/TV Gazeta

Bem, quais as soluções poderiam ser adotadas para contornar a problemática do abandono, principalmente do Centro de Maceió? Há instrumentos punitivos no IPTU para quem abandona edifícios, em outras capitais, só que isso já se mostrou apenas como solução pontual do problema.  A saída é a requalificação destes edifícios para tornar eles habitáveis, seguros, sustentáveis e atraentes para mercado imobiliário, para moradia, comércio e serviços públicos que atraiam as pessoas para o centro de Maceió. Além de criação de espaços para atividades artísticas, culturais ou empresariais, transformando a área em um local vibrante e atrativo.

Isso envolve criação de novas zonas de interesse no plano diretor, política de incentivo e investimentos, espaços públicos, áreas de lazer e infraestrutura adequada para atrair moradores, empresas, população local e turistas. É preciso nestes projetos, incluir a população residente atualmente no centro, associação comercial, sindicatos, universidade e poder público. Agora tudo isso associado a política de infraestrutura urbana com a melhoria do sistema de transporte da capital alagoana, ampla mobilidade urbana, melhoria na rede de esgoto e água, fornecimento de iluminação pública moderna, redes de internet públicas e sem fio, sistema de segurança por videomonitoramento entre outras benfeitorias.

O mais importante para um centro urbano são as pessoas morarem nele, para tal é importante um pujante e inovador programa de habitação de interesse social no centro de Maceió e ao mesmo tempo ampliar o investimento de novos hubs de inovação, comércio, serviços para atrair o mercado imobiliário para o local. É um misto de investimentos públicos e privados gerando renda e emprego para o centro. Neste sentido adquirir imóveis nessa área neste momento por parte do poder público parece ser uma boa política, pois pode iniciar a revitalização destas áreas centrais. Já os dos bairros afetados, estes precisam fazer parte do plano diretor da cidade que chega em agosto na câmara municipal e precisa ser amplamente discutido o que será definido para essa imensa área urbana. Afinal estamos falando de um instrumento de planejamento para os próximos 10 anos. Não discutir de forma séria com os nossos vereadores essas áreas abandonadas da cidade, bem como as impactadas pela Braskem no plano diretor é como uma ferida urbana que só tenderá a crescer e virar um problema gigantesco no futuro.

Precisamos colocar toda essa problemática urbana na revisão do plano diretor.

É arquiteto urbanista, professor da Ufal.

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1 Comentário

  • Excelente texto! Parabéns!

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